Por: Admir Almeida
O debate sobre a regionalização, é um debate permanente na sociedade cabo-verdiana. Desta vez foi o Senhor Presidente da República, na sua última visita à ilha de Santo Antão, quem trouxe de novo o tema para o centro do debate. O tema divide opiniões. Se para alguns ela representa a chave para o desenvolvimento equilibrado e a autonomia local, para outros, nada mais é, que aumentar a burocracia e criar cargos e jobs for the boys.
A regionalização surge como uma proposta tentadora, mas que exige uma análise cuidada, principalmente no que concerne os objetivos que se pretende alcançar. as diversas opções, bem como os seus prós e contras.
“É afirmação constante e generalizada que existe uma estreita conexão entre os conceitos de Descentralização e de democracia, também em relação ao fato de que a luta pela Descentralização consistiu, principalmente, na luta pelas autonomias locais a fim de perseguir, além da Descentralização, objetivos de democratização.” (Bobbio, 1998, p332)
Um dos principais argumentos a favor da regionalização é a possibilidade de dar voz e poder às comunidades locais, deve-se isso, substancialmente, a uma interpretação “romântica” e a uma tendência idealizadora do conceito de Descentralização.
Cabo Verde é um país, naturalmente, dividido em regiões, assim como todos os arquipélagos, uma vez que o mar impõe barreiras naturais. Aceitando a nossa realidade geográfica e a própria dinâmica do povoamento das ilhas, que se deram em diferentes formas ao longo de quase quatro séculos, faz de nos um país estruturalmente regional, restando apenas no máximo discutir o modelo de regionalização e o seu grau.
Num Estado, o problema da centralização e da descentralização está sempre presente e, ao avaliar os instrumentos jurídicos através dos quais, respetivamente, eles podem ser valorizados, podemos dizer se esse estado é, mais ou menos, centralizado. Desta forma, nunca se poderá encontrar em funcionamento nenhum estado que seja 100% centralizado, nem nenhum caso onde a descentralização seja total, uma vez que esta seria o fim do próprio estado e, neste sentido, devemos considerar que centralização e descentralização representam dois princípios e não um fim em si próprio.
Das 9 ilhas habitadas, a ilha de Santiago concentra mais de metade da população. Existem nas outras ilhas sentimentos de alguma negligência. A regionalização permitiria que cada ilha priorizasse suas necessidades, como infraestrutura de transporte, acesso à saúde ou preservação ambiental, sem depender exclusivamente de um governo central distante e, muitas vezes, desconectado das realidades locais. Engana-se aquele que pensa que os problemas que afetam o desenvolvimento do país e das ilhas, serão resolvidos deslocando os centros de tomadas de decisões, se os problemas econômicos e sociais que afetam o país, se mantiverem.
A descentralização política não faz qualquer sentido. Nada mais seria que, criar títulos, novos cargos e encargos públicos, pelo que a descentralização deve ser essencialmente administrativa, usando as estruturas de poder já existentes com enfoque na delegação de competências.
A descentralização política expressa uma ideia de direito autônomo, e não creio que seja o nosso caso, pois, não existe este sentimento no nosso país, onde o orgulho de ser cabo-verdiano é sentido e vivido de igual forma, em todas as ilhas, pelo que na descentralização administrativa, que se torna a alternativa mais viável e com menos custos, tanto político como financeiros a transferência poderes administrativos para as autarquias.
A desconcentração administrativa, por exemplo, permite que o governo central mantenha o controle político, mas delegue funções operacionais a escritórios regionais. Isso pode garantir uma gestão mais próxima da população sem fragmentar o poder. Outra opção é a cooperação intermunicipal ou inter-regional, onde localidades vizinhas compartilham recursos e infraestruturas.
Cabo Verde tem 9 ilhas habitadas e 22 municípios. Destes 22 municípios, 15 estão em 3 ilhas (Santiago, 9, Fogo e Santo Antão, 3 cada), se a estas se juntar a ilha de São Nicolau, que tem 2 conselhos, as demais 5 ilhas são ilhas com apenas um único conselho, o que tornaria o modelo cada ilha, uma região simplesmente a duplicação ou sobreposição de estruturas políticas.
Em um arquipélago, as ilhas poderiam formar consórcios, associando-se de acordo com as suas necessidades e características, reduzindo custos, aumentando a eficiência e contribuindo para o desenvolvimento local, e consequentemente nacional, mas seria necessário a criação de novas estruturas, e sim, dar um novo enquadramento às autarquias, delegando mais e competentes recursos e responsabilidades.
Por fim, a regionalização não é uma solução única para todos os problemas do país, é uma ferramenta útil que pode ajudar, mas não pode ser vista como uma tábua mágica de salvação, sobe um alto risco de não corresponder às expectativas, e contribuir para uma ainda maior degradação e desencanto com a política que já se verifica no país, como mostram todas as últimas sondagens de opiniões.
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