Sete meses após o Governo ter determinado a introdução de melhorias no processo de leilões dos depósitos a prazo do INPS, e, consequentemente, a anulação do segundo leilão realizado e a submissão do depósito a prazo do primeiro leilão a um novo leilão nos moldes propostos, a administração do instituto que gere os fundos da segurança social toma finalmente uma decisão. O que está a ser alvo de várias interpretações.
A primeira questão tem a ver com o facto de, no dia 06 de Novembro, 13 dias antes da maturação do depósito a prazo do segundo leilão, o INPS ter emitido um comunicado onde afirma que decidiu acatar a recomendação do Governo de 23 de Abril de 2024, e, “por conseguinte, promover a anulação do segundo leilão, atribuindo ao banco vencedor o prazo de 10 dias para a regularização da situação, como se o acto não tivesse sido praticado”.
Com isso, pode-se depreender que o iiB, o banco que venceu o leilão, não irá pagar juros do dinheiro que mobilizou durante cerca de um ano, ou seja, desde 19 de Dezembro de 2023, quando foi realizado o segundo leilão dos depósitos a prazo do INPS. Na prática, com esta decisão, a devolução de um milhão de contos a escassos dias de completar um ano do segundo leilão é como se nada tivesse acontecido.
Coincidentemente, esta decisão foi tomada quase uma semana depois das eleições autárquicas, talvez por constar da lista de casos que mais degradaram a imagem do Governo, porquanto, segundo um economista, “não se vislumbra qualquer razão para uma tomada de decisão tão tardia, tendo em conta que o despacho conjunto do ministro do Estado, da Família, Inclusão e Desenvolvimento Social, Fernando Elísio Freire, e do ministro das Finanças e do Fomento Empresarial e Ministro da Economia Digital, Olavo Correia é de Abril deste ano”.
Por outro lado, a recomendação do Governo no sentido de se submeter o depósito a prazo do primeiro leilão a um novo leilão não foi acatada pela administração do INPS. Ou seja, o primeiro leilão teria que ser repetido depois da aprovação de novas regras, com o envolvimento do Banco de Cabo Verde (BCV), logo na primeira renovação anual, mas o comunicado do INPS é omisso sobre este aspecto.
INPS explica decisão de suspender segundo leilão
Num novo comunicado, emitido na terça-feira, 10, o INPS explica que o montante previsto para o leilão seria repartido entre o primeiro e o segundo vencedores na proporção de 60% e 40%, respectivamente. Contudo, apenas dois bancos participaram, sendo que a proposta do segundo participante não atingiu os requisitos mínimos de rentabilidade. Assim, foi adjudicado apenas 60% do valor total ao banco vencedor, ficando o restante sem adjudicação.
O INPS informou ainda que as quantias transferidas pelos bancos convidados para a constituição do montante global do leilão, no total de 317.569.324 escudos, serão devolvidas de forma proporcional.
“O INPS reafirma o seu compromisso com a eficácia e a sustentabilidade das medidas adoptadas, continuando a trabalhar num quadro regulamentar mais coeso e na revisão e aprimoramento do procedimento de leilões, em alinhamento com as recomendações atuariais e as melhores práticas”, garantiu.
A instituição garante, outrossim, que o processo de leilões será retomado em breve, após a conclusão das concertações com as entidades competentes, reiterando a sua confiança nos benefícios de médio e longo prazo das medidas em curso.
Jogo de cartas marcadas
Em Dezembro do ano passado, o INPS lançou um convite para a apresentação de propostas – leilão de depósitos a prazo, num montante total de 500 mil contos. A administração dessa instituição de segurança social disse, na altura, que esse leilão foi concluído com sucesso, sublinhando que “este marco representa um passo significativo na implementação de práticas internacionais de excelência na gestão de activos, estabelecendo um precedente para futuras iniciativas financeiras”.
Exceptuando a Caixa Económica de Cabo Verde (CECV), que detém a maioria dos depósitos do INPS (mais de 18 milhões de contos), todos os outros bancos participaram no primeiro leilão de 08 de Dezembro de 2023. Os seis bancos que participaram no leilão apresentaram as seguintes propostas para a remuneração, à prazo, de 500.000.000 CVE leiloados pelo INPS: 0,5; 2,75%; 3,15%; 3,50% e 3,55%. Contudo o vencedor foi o banco que ficou no terceiro lugar, o que levou os demais participantes do leilão a considerar que se estava perante um “jogo de cartas marcadas”.
Perante tal denúncia, o BCV, na qualidade de promotor da estabilidade do sistema financeiro, recomendou aos bancos que se abstivessem de participar em futuros leilões promovidos pelo INPS, até que fossem equacionadas medidas prudenciais direcionadas para a mitigação de grandes concentrações de exposição.
O BCN, o BAI, o Interatlântico e o Ecobank alegaram, na altura, que o INPS é um depositante sistémico para vários bancos e que, por isso, “não é prudente promover a mobilização de recursos desta instituição no final do ano, pois facilmente, e em função dos montantes, se pode provocar choques de liquidez e dificuldades de reação pelo curto espaço de tempo face ao fecho do ano”.
Os quatros bancos consideraram, por outro lado, que os critérios de alocação dos fundos do INPS “devem ser transparentes e ser comunicados com muita antecedência, garantindo previsibilidade às instituições na movimentação de fundos. Não nos parece apropriado que se efetuem movimentos destes nas últimas semanas do ano e sem permitir que as instituições acomodem os efeitos destas movimentações”.
Publicado na Edição 902 do Jornal A Nação, de 12 de dezembro de 2024