Por: Antónia Môsso*
O macho man é um homem com H maiúsculo. É viril, forte (fisicamente e de temperamento), muito corajoso, mulherengo e machista. Não contem com ele como cuidador nem para partilhar tarefas domésticas. Orgulha-se de ser inábil na cozinha e de nem sequer saber fritar um ovo.
O macho man possui um visível défice de competências sociais. Não pode ser criticado. Uma vez contrariado, argumenta-se recorrendo não à via do diálogo, mas à da violência física, verbal e psicológica. Sabe ser bruto. Orgulha-se disso. Domina, oprime e asfixia a mulher menorizando-a. Acredita que a desigual distribuição de privilégios favorecendo os homens em detrimento das mulheres, é mais do que justa, justificada e natural.
Enclausurado na caixa escura da ignorância, o macho man concebe o mundo de forma polarizado. Homem (em primeiro lugar) de um lado e a mulher (atrás) do outro. Por ser muito macho, o macho man, atrapalha-se com a emergência das novas identidades de género (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, intersexuais), e soluciona a questão recorrendo a comportamentos homofóbicos. Porque tudo o que não lhe é compreendido é alvo da sua agressividade e chacota.
Quem procura um macho man, dificilmente o encontrará numa reunião escolar ou numa consulta médica dos filhos. Até porque o macho man legítimo, vai espalhando filhos na terra com diversificadas mulheres, e só os muito afortunados é que são por ele perfilhados.
Quem procura um macho man, encontrá-lo-á nos espaços de diversão diurna e noturna. Ali o encontrará bem disposto e certamente com um copo na mão a tragar qualquer bebida que terá de ser obrigatoriamente alcoólica. Se o encontrar numa roda de amigos de igual macheza, é previsível estar a falar de futebol ou a gabar-se das suas conquistas ou performances sexuais que garantidamente superará a música “Mulheres” de Martinho da Vila. Lembre-se que o tamanho do seu falo e o seu desempenho sexual definem o seu estatuto social de homem.
O macho man, mais cedo do que tarde causará elevados estragos por onde passar e muitos deles terão problemas com a justiça. É um ser destrutivo, dominador, complexado, preconceituoso, sexualmente descontrolado e com um défice sério de inteligência emocional.
Refém dos estereótipos de género e de uma ideologia tradicional de masculinidade, o macho man, precisará sempre de provar a sua masculinidade para obter a tão necessária validação de terceiros. Com isso dá-se a uma espécie de “amputação” da sua condição humana visto reprimir as emoções/sentimentos/ comportamentos, próprios de todos os seres humanos (medo, fragilidade, amor, sofrimento, tristeza e choro). O mais provável é que apresente mais tarde sérios problemas de saúde mental e necessite de ajuda especializada. Não a procurará porque o preconceito também se estende a pedir ajuda principalmente a psicólogos ou psiquiatras.
A “sorte” é que o macho man é resultado de uma construção social. O que quer dizer que ele não nasce assim. É educado, socializado, “moldado” desde criança para se tornar assim. São as sociedades que definem as identidades de género. Criando um corpo de regras, papéis, comportamentos e expetativas sociais para cada um. Daí que o “ser-se homem” ou “ser-se mulher” varia consoante a época, latitude e cultura onde se estiver inserido. Mal nascemos e identificado o nosso sexo, inicia-se o processo de aprendizagem do género. Tudo é feito de forma tão natural e gradual, que nem tomamos consciência disso. O nome. As roupas e hábitos de consumo. O tratamento. As regras e proibições. Os livros de histórias infantis. Desenhos animados. Os brinquedos e as brincadeiras, são formas de nos “formatar” no sentido de correspondermos ao que a sociedade espera do homem e da mulher e sermos assim socialmente aceites.
O recurso a uma educação em casa diferenciada entre meninos e meninas, deriva da falsa crença que os meninos se forem educados iguais às meninas, em fase adulta afetará a sua orientação sexual ou poderá assumir “posturas associadas ao universo feminino” (gestos, forma de vestir, preferências, hábitos). No entanto, até ao momento, é inexistente a produção de estudos científicos a provar esta correlação.
Uma educação não sexista contribui para a formação de melhores seres humanos, mais empáticos, solidários, justos, democráticos e conscientes de si e do seu papel no mundo.
A construção social do macho man advém da herança do patriarcado, que é uma ideologia em que o homem detém mais poder do que a mulher e em que a masculinidade tem supremacia sobre tudo o resto. É preciso ter cuidado, porque embora as suas premissas defendidas colidam com os valores de sociedades democráticas como a liberdade, justiça, igualdade, respeito, pluralidade, pode notar-se a sua permeabilidade no sistema social em que vivemos infiltrando-se no sistema político, judicial, económico, na cultura, ordenamento do território, e na forma como os cidadãos se encontram organizados.
A boa notícia é que se a identidade de género e a ideologia patriarcal é construída socialmente, quer dizer que ela não está imune às dinâmicas e transformações sociais.
A identidade de género é constantemente criada e recriada nos milhares de ações e interações sociais quotidianas. E todos nós contribuímos todos os dias para isso quando aceitamos ou não admitimos determinadas práticas. Logo, está nas nossas mãos selecionar o que queremos manter e o que podemos ou não tolerar, definindo e redefinindo, as vezes que forem necessárias, o que é ser homem e o que é ser mulher e as expetativas sociais que recaem sobre ambos.
Temos feito o nosso caminho quando criminalizamos a violência baseada no género; criamos a lei da paridade, ou discutimos a licença de paternidade. Mas, como todo o processo ainda há muito por fazer e precisaremos com toda a certeza de todos (binários e não binários) na construção de um país mais saudável, bonito, acolhedor e respeitador de todos os seres – humanos e não humanos.
E o macho man? O que fazer com ele? Olhe que não são poucos, estão em todo o lado e não é fácil mudar mentalidades de uma hora para a outra.
O que fazer com o macho man? O macho man não serve para nada.
Por isso, não faça. Desfaça.
Mindelo, 10/11/2024
*Socióloga e Mestre em Cidadania Ambiental