Uma falha do Tribunal da Comarca da Praia resultou na libertação dos arguidos em prisão preventiva no processo “Rapa Tudo”, em que 16 pessoas são acusadas de roubos agravados, posse ilegal de armas de fogo, tráfico de drogas e tentativa de homicídio. A causa da libertação foi a falta de notificação dos arguidos para o julgamento. Segundo uma fonte judicial, o motivo foi considerado “fútil”: “O oficial alegou que não cumpriu a tarefa porque o passe de autocarro estava sem selo”.
Após a realização da Audiência Contraditória Preliminar (ACP) em Julho passado, o tribunal marcou para 21 de Outubro, segunda-feira, o início do julgamento do caso “Rapa Tudo”. No entanto, na terça- -feira, os advogados de defesa solicitaram a libertação imediata dos três arguidos que se encontravam em prisão preventiva, bem como o agendamento de uma nova data para o julgamento.
Segundo uma fonte judicial, o pedido foi feito com base no facto de “a maior parte dos arguidos não ter sido notificada do despacho de pronúncia”.
Diante dessa situação e da justificação considerada “fútil” apresentada pelo oficial de diligências – que afirmou não ter feito as notificações porque o passe de autocarro estava sem selo –, o juiz foi obrigado a dar razão à defesa.
De acordo com a lei, os advogados estavam correctos ao exigir a libertação dos arguidos, uma decisão que provocou indignação nos representantes do Ministério Público.
Esta não foi a primeira vez que falhas no processo resultaram na libertação dos acusados; em Abril, o tribunal já havia mandado soltar os arguidos devido ao excesso do prazo de prisão preventiva, o que tornou suas detenções ilegais. Esse histórico de erros aumenta o receio de fuga dos envolvidos.
Desta vez, os arguidos foram colocados sob a medida de apresentação periódica ao juiz a cada 15 dias e proibidos de deixar o país enquanto aguardam uma nova Audiência Contraditória Preliminar, marcada para os dias 5 e 6 de Dezembro. Segundo uma fonte judicial, existe preocupação quanto a possíveis “ajustes de contas” entre os próprios arguidos, uma vez que tem havido alguma desavença no seio do grupo.
A ACP, ou Audiência Contraditória Preliminar, é uma fase importante do processo judicial em que as partes envolvidas – o Ministério Público e os arguidos – podem apresentar suas alegações iniciais, testemunhas e provas. Cabe ao tribunal, nessa etapa, decidir se o caso segue para julgamento ou se será arquivado.
O caso
A operação “rapa tudo”, realizada em Junho de 2022, resultou na detenção de 14 pessoas, num primeiro momento, e outro dois na sequência, acusadas de roubos agravados, detenção de armas de fogo, tráfico de drogas e tentativa de homicídio, crimes supostamente ocorridos na cidade da Praia, Assomada e Tarrafal, na ilha de Santiago.
A operação envolveu buscas e apreensões em várias localidades de Praia, incluindo Tira- -Chapéu, Palmarejo, Alto da Glória, Safende, Achada Eugénio Lima, Várzea, Achada Santo António, Ribeirão Chiqueiro e São Pedro. Foram apreendidos electrodomésticos, roupas, sapatos, balanças de precisão, documentos de identificação, telemóveis, joias, relógios e seis viaturas.
Arguido morto
Um dos arguidos envolvidos é Nene, o jovem morto a tiro numa rua da Achada de Santo António, Praia, em meados de Junho último. Este era ainda o suposto orquestrador do caso de roubo e sequestro na ilha do Maio, ocorrido na sequência do surgimento de pacotes de cocaína na zona norte daquela ilha.
Segundo informações avançadas por testemunhos, o crime ocorreu pouco depois da meia-noite, numa rua pedonal. O suposto autor ou autores do crime terão furado os pneus do carro da vítima, que residia noutro bairro (Tira-Chapéu). Após este sair de um bar nas imediações, foi abatido com vários tiros (sete, conforme alguns relatos), enquanto tentava perceber o que se passava com o carro, acabando por morrer no local. Até hoje não há novidades sobre os desdobramentos da investigação à este assunto.
Geremias S. Furtado
Publicado na edição 895 do Jornal A Nação de 24 de outubro de 2024