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São Vicente: Antigos futebolistas esperam e desesperam por pensão prometida

Três anos à espera pela regulamentação da lei das pensões do Estado leva antigos futebolistas que residem em São Vicente, e que fizeram parte dos primeiros “tubarões azuis”, a dizer que já não acreditam na possibilidade de receber a prometida pensão a que têm direito. Sem regulamentação, o referido diploma é “um nado morto”. Além disso, há outros aspectos a ter em conta nesta história e aritmética.

Tita, antigo ala, 68 anos, um dos possíveis contemplados pela referida lei, diz já não acreditar na pensão aos primeiros futebolistas que representaram Cabo Verde, depois da independência nacional, em 1975. Com voz marcada pela frustração, revela que ele e vários dos seus colegas entregaram os documentos solicitados, mas a espera de três anos transformou a esperança em descrença. Ainda assim, falando em seu nome pessoal e no dos seus colegas, Tita implora às autoridades pela regulamentação da “lei das pensões do Estado” aos futebolistas, de modo a socorrer quem precisa desse apoio.
Ao lado de Tita, Maiúca e Berona dizem estar a passar por problemas graves de sobrevivência e que a pensão poderia ser-lhes de grande valia. Por coincidência, ambos foram guarda-redes, chamados em vários momentos a defender as cores da selecção nacional, nomeadamente na Taça Amílcar Cabral, que na altura era disputada entre os países da Costa Ocidental Africana, num tempo em que se jogava por amor à camisola.

Maiúca, outrora ágil e difícil de bater entre as traves, luta hoje com problemas de locomoção. Cada passo é uma lembrança dolorosa dos dias de glória que parecem distantes. Sem emprego, esta antiga estrela do futebol mindelense e de Cabo Verde vive uma batalha diária pela dignidade. “Sinto que fomos esquecidos”, diz ele, com voz embargada. “Demos tudo pelo nosso país, e agora precisamos de ajuda ninguém olha por nós”.


Berona, conhecido também por suas defesas espectaculares, diz que, no seu caso, não é apenas o dinheiro que importa. “É o reconhecimento, o respeito e a dignidade que merecemos por tudo o que fizemos. Prometeram ajudar-nos e até hoje nada.”

Com menos dificuldades, a maior parte dos jogadores que exibiram a sua classe no antigo Estádio da Fontinha, hoje Adérito Sena, como Bassana, Calu Pitão, Puma, Baessa, Agostinho, Mane Djodje, Djobla, Finga e Tchulass, entre vários outros, que a nível de Cabo Verde alinharam pela seleção nacional, enfrentam problemas de saúde, nomeadamente nas pernas, devido a dificuldades e lesões contraídas nos tempos em que andaram a correr atrás da bola.
A lei nº115/IX/2021, publicada no Boletim Oficial de 02 de Fevereiro, ainda não trouxe o alívio e o alento esperados aos seus destinatários directos. O diploma foi aprovado pela Assembleia Nacional na sequência de outras iniciativas tendentes a apoiar cidadãos que ajudaram a elevar o nome do país em vários momentos da história, nomeadamente combatentes pela liberdade da pátria e antigos presos políticos, por exemplo.

Em finais de 2021, o antigo futebolista Zé di Nhana já havia alertado para a situação de muitos colegas, vivendo “em miséria, pobreza e à beira da morte”. Para eles, segundo esse antigo desportista, homenagens póstumas não têm valor.

“Enquanto antigos internacionais, na qualidade de primeiros embaixadores desportivos, demos tudo nos terrenos de jogo, no país e no estrangeiro. Honramos a nossa camisola, dignificamos a nossa bandeira, sem pedir nada em troca – por amor ao país”, advogou Zé di Nhana. “Agora é momento de o país salvar a vida dos colegas que vivem em situações muito difíceis.”

Lei por regulamentar

Um alto dirigente desportivo, que preferiu o anonimato, afirmou ao A NAÇÃO que a lei aprovada, em 2021, para supostamente ajudar antigos futebolistas, nunca foi regulamentada. “Uma lei não tem força se não for regulamentada; como está, trata-se de um nado morto”, afirma.

Independentemente disso, a questão ora levantada suscita uma outra dúvida: por que apenas o futebol? Por que não incluir outras modalidades desportivas? Este questionamento ecoa entre os atletas de diferentes modalidades e que, como alegam, também defenderam as cores de Cabo Verde e que estando também a passar por dificuldades se sentem igualmente abandonados e esquecidos.

Veteranos querem ser comparados a combatentes

Dados recolhidos pelo A NAÇÃO indicam que no inicio deste processo não havia um montante definitivo fixado para os primeiros futebolistas que representaram Cabo Verde, pese embora a intenção fosse indexar o valor ao que já recebem os combatentes da liberdade da Pátria, cerca de 75.000 escudos. Nisso, ao fazer as contas, no dizer de uma fonte, o governo percebeu que não se tratavam apenas dos primeiros internacionais, os de 1978. Daí ter-se passado a falar em pensão de velhice, entre 5.000 e 8.000 escudos, tendo para esse efeito orientado os visados a procurar os serviços de Inclusão e Promoção Social. “É claro que os jogadores não ficaram satisfeitos com essa solução, e o desânimo quase os fez desistir da luta”, conclui o interlocutor do A NAÇÃO.

João A. do Rosário

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