Cidadão cabo-verdiano, residente nos Estados Unidos da América (EUA), Hamilton Rodrigues diz-se burlado pelas autarquias de São Filipe e dos Mosteiros, que lhe venderam vários lotes de terreno que não lhes pertencia. O mesmo tem tentado, há vinte anos, fazer o registo dessas parcelas na conservatória, mas sem sucesso. Os autarcas Nuias Silva e Fábio Vieira respondem.
Hamilton Rodrigues afirma-se agastado e considera “preocupante” e um “problema sério” com a “governação de terrenos” na ilha do Fogo. Como alegou ao A NAÇÃO, as Câmaras Municipais de São Filipe e Mosteiros venderam-lhe terrenos cuja posse legal não detinham.
“Sabendo dessa situação, não deveriam vender-me vários lotes sabendo, de antemão, que eu não poderia registá-los no meu nome junto da conservatória” e, consequentemente, “os investimentos que eu tinha previsto para esses terrenos estão empatados há 20 anos”.
Este emigrante radicado nos EUA diz ainda que no momento da compra dos terrenos não foi informado que os mesmos estavam em processo de litígio entre as respectivas autarquias e privados que reivindicam a titularidade dos mesmos.
“As minhas tentativas de abordar a questão diplomaticamente ao longo de duas décadas não tiveram sucesso e sinto-me agora na obrigação de falar abertamente sobre essa alegada fraude ou corrupção”, porque “sinto-me enganado ao longo de duas décadas”.
Hamilton Rodrigues diz ainda que ao denunciar esta situação, está a defender os seus direitos à propriedade, pois, como alega, são bens que comprou “legitimamente” com o dinheiro proveniente do “seu árduo trabalho nos EUA”.
“Estou a tomar uma posição contra a injustiça e a expor as práticas desleais que me privaram e potencialmente a outros da sua propriedade legítima. É importante procurar assistência jurídica e defender a transparência e a responsabilização nos processos de propriedade de terras em Cabo Verde para evitar que tais injustiças ocorram no futuro”, salientou.
Fábio Vieira diz que terrenos de Hamilton Rodrigues foram ocupados “indevidamente”
Confrontado sobre esta situação, o edil dos Mosteiros, Fábio Vieira, disse ao A NAÇÃO que está a par da reclamação de Hamilton Rodrigues e que a sua edilidade está a envidar todos os esforços para sanar essa situação que, segundo reconhece, tem criado constrangimentos ao comprador desses terrenos.
Segundo o autarca mosteirense, foi aprovada uma lei, há cerca de dois anos, que impõe que os terrenos têm de estar registados em nome do Município, antes de serem vendidos. “Neste momento estamos a fazer uma inventariação de todos os terrenos para que a Câmara possa registá-los no seu nome, para poder possibilitar o registo na conservatória”.
Mas, mesmo assim, Fábio Vieira, considera que as pessoas que compraram terrenos na Câmara dos Mosteiros, em querendo, podem fazer o registo dos seus lotes, mas reconhece, no entanto, que é um processo “custoso”, tendo em conta que é preciso fazer uma justificação notarial e publicá-la nos jornais para se poder fazer o registo 44 dias depois da publicação.
Esclarece, no entanto, que a prioridade é registar todos os terrenos em nome da Câmara dos Mosteiros para depois atribuir os títulos de propriedade às pessoas que compraram terrenos, há anos, e que não têm conseguido registá-los.
Uma outra contrariedade, segundo o edil dos Mosteiros, é que os lotes de terreno que Hamilton Rodrigues adquiriu há 20 anos foram ocupados por terceiros. A solução agora é encontrar terrenos numa zona que possa agradar este emigrante.
Pelo que nos foi possível apurar Hamilton Rodrigues adquiriu dois lotes de terreno nos Mosteiros, cujo contrato de compra e venda foi assinado, no dia 02 de Fevereiro de 2024, pelo então presidente da Câmara, Fernandinho Teixeira, pelo secretário municipal e por um representante de Hamilton Rodrigues. Contudo, A NAÇÃO sabe que, nesses lotes de lavas vulcânicas, em Queimada Guincho, houve uma ocupação “indevida” e o legítimo proprietário nem seque foi informado dessa situação. E agora, 20 anos depois da compra, a Câmara dos Mosteiros está à procura de uma solução para tentar satisfazer esse emigrante.
Nuías Silva diz que São Filipe praticamente não tem terrenos municipais
Em São Filipe, como foi referido, Hamilton Rodrigues comprou cinco lotes de terreno na zona de Xaguate e continua, também, sem conseguir fazer os seus registos na conservatória. O edil Nuías Silva reconheceu ao A NAÇÃO que o problema tem uma certa complexidade, porquanto a autarquia que preside “praticamente não tem terrenos”.
Mas em relação ao caso dos terrenos de Xaguate, onde Hamilton Rodrigues tem cinco lotes, o autarca diz que há um processo judicial que corre os seus trâmites há mais de vinte anos no Supremo Tribunal de Justiça, processo esse que opõe a Câmara e alguns privados, mas diz acreditar que “haverá uma solução muito em breve através de um processo de negociação entre as partes”.
Contudo, Nuias Silva apresenta a mesma proposta defendida pelo seu colega Fábio Vieira, no sentido de o “proprietário” Hamilton Rodrigues registar os seus terrenos através de uma justificação notarial.
Mas esta solução não agrada ao visado, que considera que os custos dessa operação devem ser suportados pelas duas Câmaras Municipais, tendo em conta que ele, pessoalmente, enquanto comprador, adquiriu os terrenos livres de ónus e encargos e que agora não faz sentido ser ele a pagar pelas falhas dos dois vendedores, as câmaras municipais de São Filipe e Mosteiros.