Uma investigação do consórcio de jornalistas Lighthouse Reports mostra que os fundos europeus estão a servir em países como Marrocos, Tunísia ou Mauritânia para financiar o transporte de migrantes negros para zonas remotas onde são depois abandonados.
A informação, difundida esta quarta-feira, pelo RFI, cita a jornalista do El Pais, María Martín, segundo a qual as autoridades europeias sabem destes abusos de direitos humanos que visam dissuadir a imigração.
Desde 2015, pelo menos 400 milhões de euros foram doados pela União Europeia à Tunísia, Marrocos e Mauritânia para a gestão dos fluxos migratórios nestes países vindos um pouco de toda a África, mas uma investigação de jornalistas do “Washington Post”, “Enass”, “Der Spiegel”, “El Pais”, “IrpiMedia”, “ARD”, “Inkyfada” e “Le Monde”, mostra que estes fundos serviram para enviar dezenas de pessoas para o deserto ou zonas fronteiriças onde eram abandonadas pelas autoridades.
“O que vemos com esta investigação é que estamos a falar de um sistema. Não são casos isolados, são mais de 50 testemunhas (…). Eles são presos nos centros de detenção, que às vezes são oficiais, às vezes são informais e depois disso, eles são transportados contra à sua vontade para lugares nos quais eles ficam numa situação ainda mais vulnerável. Efectivamente, eles não são deportados para o seu país de origem, que poderia ser uma figura mais ou menos fácil de colocar dentro da lei. Eles são, por exemplo, na Tunísia, transportados para o deserto na fronteira com a Líbia”, explicou María Martín, em entrevista à RFI.
Com conhecimento das autoridades
Estas detenções e transportes são, segundo a mesma fonte, do conhecimento das autoridades europeias, com a polícia espanhola a marcar presença na Mauritânia e a visitar estes centros de detenção.
“É muito evidente na Mauritânia, já que há dois tipos de polícias espanhóis diferentes a trabalhar muito perto das autoridades locais. Eles trabalham tanto no mar, interceptando as embarcações que são usadas para imigrar, mas também no terreno. O que a investigação mostra e que nós não só contamos o que ouvimos, mas ficámos de plantão na frente dos centros de detenção, e vimos como os polícias espanhóis entravam nesses centros onde havia crianças pequenas, onde não havia comida suficiente e onde as pessoas dormem no chão”, indicou a jornalista.
Os imigrantes, alguns mesmo com os papéis em dia, podem ficar em prisão indefinida, sendo depois forçados a entrar em autocarros e são deixados na fronteira com o Mali, numa região afectada pelo terrorismo.
Esta investigação mostra que alguns dos veículos utilizados neste tipo de transporte nos três países foram também financiados pelo União Europeia.
UE diz desconhecer
Do seu lado, e quando confrontados com esta investigação, a União Europeia diz desconhecer estes abusos, garantindo que os fundos dados aos países do Norte de África estão condicionados ao respeito pelos direitos humanos.
“Há mecanismos que se podem implementar para verificar esse cumprimento, mas a resposta tem sido a mesma, que a prioridade é o respeito aos direitos humanos. Não há qualquer autocrítica ou proposta construtiva para que isto não continue a acontecer”, concluiu.
C/ RFI
Imagem: RFI