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Regresso ao Passado: MENDES BROTHERS, Música, identidade e arte nos seus ritmos

Por: António Andrade

Notas do autor

O propósito desta análise, independentemente dela estar ou não relacionada aqui e agora com os irmãos Mendes, Otílio, Ramiro e João, nascidos na localidade de Palonkon, na ilha do Fogo em Cabo Verde – o primeiro não se sabe bem da data, mas o segundo em 1961 e o terceiro em 1964 – autointitulados por MENDES BROTHERS, adiante MB, nome do agrupamento musical criado pelo trio nos Estados Unidos após ter ali emigrado, é o reconhecimento da actuação daqueles que não somente no domínio da arte da Música como é o caso, e doravante, também das outras artes e da cultura diversa, do desporto, da moda, da pintura e outras vertentes dos tempos que o vento levou, i.e., do passado distante, tiveram um desempenho muito a cima da média, para não dizer espectacular e extraordinário.

Mas, sempre com objectivo de pontualmente serem recordados.

De tal forma, que em relação aos MB, além do seu feito engrandecer a si mesmos, mas tambem suas instituições, designadamente o seu grupo no geral, o povo da sua ilha e do seu próprio país e povos de países irmãos.

Por causa disso, peça-se aos leitores na hora que passa, a meditação consentânea com o tema em título. Presume-se, que todos querem neste momento apreciar a beleza que a melodia proporciona aos ouvidos e à mente de cada um, diminuindo-nos o stresse diário, olvidando-se num propósito altruístico, dos casos destes tempos actuais que correm à nossa volta, presenteando-nos o infortúnio – para lerem com olhos de ver – esta linda epopeia da história musical dos irmãos e seus companheiros, considerados pela crítica específica abrangente, como um dos grupos musicais cabo-verdianos mais prolíficos da diáspora.

Música como arte

A arte musical é uma técnica semelhante às das demais artes, entendida como a actividade humana ligada às manifestações culturais de ordem comunicativa utilizada com a voz ou com o som dos instrumentos apropriados a esse fim. Quando isso acontece, tem-se Música cantada ou vocal, praticada com a primeira e instrumental com o segundo. 

Quer uma quer outro no significado da Música, é um som agradável ao ouvido, como teria observado neste segundo trecho do poema titulado Som do seu Missal o ilustre brasileiro João da Cruz e Sousa (Santa Catarina, 24 de Novembro de 1861 – Minas Gerais, 19 de Março de 1898), poeta de luminoso rastro e que foi um dos principais representantes da escola literária do simbolismo no Brasil. 

Mas, de todas as vibrações recolhidas, só me ficou, vivendo a música do som no ouvido deliciado, a canção da tua voz, que eu no ouvido guardo, para sempre conservo, como um diamante dentro de um relicário de ouro“.

No entanto, da junção aprimorada das duas modalidades (voz e som dos instrumentos), como nós diríamos, resulta na chamada Música integral, que é constituída por esses quatro elementos fundamentais: Melodia, Harmonia, Ritmo e Letra na Música vocal. 

Concebida por meio de grandes variedades de melodias, ritmos e de linguagens que surgiram ante saecula ou seja, há séculos no Planeta Terra e continuam a surgir, mas evoluíndo, estão a evoluir no panorama do universo sacro e profano, englobando a religião, a cultura, o afecto, a distração, o divertimento, a própria política e o lazer. 

Do nosso olhar e audição, depois da vida e do pão para a boca, ela é das melhores coisas que Deus nos ofertou – uma das dádivas da Providência – sendo que no essencial, como vem acontecendo, na maior parte da nossa efémera existência, é que seja destinada a fortalecer o espírito humano, ajudando-nos a combater o desânimo – e dessa forma – contribuir também para educar e congregar a humanidade, em consequência, impulsionar o avanço e o progresso das nações. 

Portanto, para o bem comum, o caminho ideal a percorrer, é que as produções de qualidade no domínio da Música, sejam preservadas e conservadas, tendo em vista, a sua utilização proveitosa na convivência, i.e., na cultura da paz, da tolerância, da compreensão e da felicidade entre os homens.

Servindo-se e apoiando-se ainda na promoção de acções humanitárias, favorecendo um ambiente positivo para tornar um mundo cada vez melhor. Mais alegre e mais divertido. Pelo menos essas foram das finalidades mais importantes da Música de todos os tempos e dos irmãos em apreço.

Origem e organização da banda 

Foi um grupo musical surgido a partir de 1978, no seio da comunidade cabo-verdiana residente na Cidade de Brockton nos Estados Unidos, citando o site CABO VERDE & a Música – Museu Virtual, produzido pela Doutora Gláucia Nogueira, fundadora e curadora da página.

Cidade de Brockton US

De início, composto por três irmãos mais um primo, como foi dito, todos naturais da ilha acima referida, localizada na região sul das ilhas de Cabo Verde na Costa Ocidental de África. Eles emigraram para as terras do Tio Sam, e uma voz feminina nascida em Dacar/Senegal, Maria de Barros, descendente de cabo-verdianos, tendo vivência em Nouackchott/Mauritânia, que também emigrou ainda adolescente com a família para aquele país norte-americano e outros elementos de países estrangeiros. 

Mapa da ilha no panorama das ilhas de Cabo Verde

Grupo MB

Para falar dele, é antes de tudo uma actividade para expressar ou chamar os ritmos, letras e melodias, pela forma como criava, orquestrava ou harmonizava cada tema.

Impondo-nos alguma responsabilidade e rigor na sua abordagem, em particular do que fez para a Música da Nação Cabo-verdiana, sobretudo para a ilha do Vulcão e para a Nação Angolana, mas também Moçambique e Guiné, criando temas musicais que identificam a cultura e a vivência dos povos de cada um desses países ou sua ilha, sendo os dois primeiros (Cabo Verde e Angola) em maior número de composições feitas do que os outros, que iremos ver mais à frente.

LP UN NOVO METODO

Segundo sites específicos contidos na intenet, esse agrupamento musical MB, gravou o seu primeiro LP intitulado UN NOVO METODO em 1983, com a etiqueta Not On Label no qual – vide capa e contra capa – participaram Otílio Mendes com o baixo e seus dois irmãos; Ramiro Mendes viola solo (mais tarde voz, programador e leader).

João Mendes, acompanhado da Maria de Barros vocalistas, o primo deles Henrique Mendes e J. Roland Casseus bateristas, Nemours Duteau teclado, Frantz Rolles viola rítmo, Aime Perpignan percussão, Anthony Stewart Trompete, Christopher Johnson e Gary Dulan Saxophones. Dos sete últimos nomes constam-se que são estrangeiros.

Ritmos Bandera ao Tchoru e Talaia Baxu em discos gravados

Dois anos após a edição daquele disco, em meados de 1985, pelas circunstâncias da vida, faleceu o Otílio irmão mais velho deles.

Passado o infeliz e transtornado acontecimento, os dois irmãos Ramiro e João, para além das suas vozes – aliadas ao sorriso emblemático do primeiro e às coreografias alegres do segundo – tiveram de transformar-se no rosto dos MB, numa parceria inédita no seio dos nossos patrícios em grupos musicais na emigração, com suas criações e lideranças, assumindo ambos a direcção musical.

Nessa altura, a dupla aproveitou com a entrada de novos elementos nomeadamente o baixista Djim Job, a partir do álbum Palonkon de 1993, ou o teclista Philip Monteiro no álbum Bandera em 1995, e o baterista e percussionista Kalú Monteiro no Torri Di Control de 1996, conforme a citada página CABO VERDE & a música… e saída de outros, para criar diversos sons e desenvolver variadas expressões nos cantares das festas tradicionais da ilha onde nasceu, a nível artístico, quer nas letras, quer na rítmica. A partir dos ritmos Bandera ao Tchoru, passando pelo Kaninzadi (originário da dança canizade) e Talaia Baxu, ritmos tradicionalmente foguenses, editando-os em discos.

Sabe-se que a maioria deles (ritmos e suas expressões) nunca foram tocados ou gravados por qualquer grupo musical, apenas pela banda, salvo os de Talaia Baxu, e nem aconteceu, e.g., com a cadência do cântico da Bandera e suas linguagens e tão pouco com a dança canizade (Kaninzadi) ou com o choro (Tchoru). 

Tinham-se augurados votos de evolução e de boas novas a esses ritmos emergentes surgidos nas gravações de LP´s e CD´s do grupo, na atmosfera musical do arquipélago.

Influências musicais

Nas suas criações, os irmãos quando ainda residiam no país, foram influenciados por ritmos de artistas angolanos que entretinham-se, ouvindo esses sons trazidos em discos por emigrantes cabo-verdianos que fugiam das guerras em Angola.

Pela net, pode-se ver que a música daquele país, é uma das mais importantes manifestações culturais, e Luanda, a capital, é o berço de diversos estilos (na ilha ao largo da costa luandina, nasceu a rebita, um estilo que tem por base o acordeão e a harmónica) como o kuduro, o adoço (mistura de kuduro e house), merengue, kazukuta, kilapanda e Semba.

João à frente e Ramiro a seguir

Melodias de Angola e de Moçambique

Por causa daquelas influências acima referidas que tiveram em Cabo Verde, o grupo dando continuidade ao seu processo criativo, não ficaram por aqui ligados somente aos ritmos e às cadências musicais da ilha da Ana Procópio, de Pedro Cardoso e de Príncipe de Ximento. 

Na sua actividade cultural e musical sobretudo de Angola e de Moçambique, tocaram e desenvolveram seus rítmos em relação ao Semba e à Marrabenta.

Semba e Marrabenta, que são ritmos de origens angolano e moçambicano respectivamente. Mas para os de Moçambique, não se conhecem mais do que um ou outro num tom mais lento e não ligeiro. Ouçam-se efectivamente alguns exemplos nos CD´s Palonkon (1993), as faixas 2 “Angola Beleza Natural” e 4 “Angola Na Paz” – Bandera (1995), as faixas 2 “Angola Kuia“, 6 “Madalena” e 7 “Balumuka Palops!“. Do que se constata, na faixa 8 “Moçambique É Manique Nice” do Torri Di Control (1996).

João à esquerda e Ramiro à direita

Os sons em questão, nessas “incursões” referindo-se aos ritmos, ou melhor, às músicas que fazem referências àqueles países, depois de terem sido concebidas, os dois irmãos também cantaram-nas com igual sabor que empregam nas crioulas, como se tivessem vivido naqueles territórios lusófonos, mas que nunca chegou a acontecer. 

Entrementes, a etiqueta portuguesa Vidisco, organizou uma compilação das músicas deles editadas em CDs anteriores, denominada Para Angola Com Um Xi Coração em 1997, na qual incluiu na faixa 4 “Angola Lxi Yetu. Posteriormente na faixa 9, os MB gravaram “Guiné” mas no Satélite Zamby em 1999.

De modo que, apreciar através do áudio nos seus discos, no site Spotify, Aplle, ou por intermédio de imagens e sons no You Tube, ou então se os leitores tiveram de assistir ao vivo seus espectáculos, além dos ritmos acima referidos, mais as composições “Cabeça Monte“, “Paraizu Prizão“, “Yara bum“, “Tchoru“, “Zinha“, “Kutululuka“, “Kaninzadi” ou “Cabrito Manso“, só para citar essas, se sente e se percebe facilmente o seu histórico identitário, ou seja, à priori, quais seriam os sons e os géneros musicais trabalhados pela banda, fossem eles de Cabo Verde, Angola, Moçambique ou Guiné.

Produção do grupo

Após a edição do LP UN Novo Metodo (1983), já com a etiqueta MB Records propriedade dos dois irmãos – só para dar clareza e sequência a isto – tiveram de editar os CD´s Palonkon (1993); Bandera e Diplomadu 1995 e Torri Di Control (1996); Para Angola Com Um Xi Coração (1997) e Satélite Zamby (1999), todos já referidos.

Mais o Cabo Verde/Kabu Verdi 2005 e Porton De Regresso 1 2010, completam-se os 9 discos (incluindo uma compilação), produzidos entre LP´s e CD´s, da parte do exitoso grupo, constantes do site Discogs.

África – Cabo Verde e Angola

Expressões angolanas nos temas

Notam-se claramente que as expressões das linguas de Angola são bastas vezes utilizadas nos temas musicais dos MB, e muito bem inseridas e representadas nos trabalhos discográficos editados pela banda.

A Nação Angolana é configurada por um país situado na costa do Atlântico Sul da África Ocidental, entre a Namíbia e o Congo. Faz ainda fronteiras com a República Democrática do Congo e a Zâmbia, a oriente. 

As línguas angolanas contém variados dialectos que aqui mesmo se tenta ensair:

Conforme páginas online, pegando num e noutro vocábulo por exemplo – Bué, que significa muito; Bué de coisas, muitas coisas; Kuia ou Kuiar, gostar, curtir, apreciar ou Você me kuia bué, que também pode significar Você me dá muito prazer, me completa. Você me kuia? que é idêntico, Você me ouve? etc. E vários outros termos no acima citado CD Cabo Verde / Kabu Verdi (2005) faixas 9 “Luanda” e 11 “Angolamania” etc.

A este propósito, segundo os media digitais, o idioma étnico com mais falantes em Angola é o umbundo que se fala na região centro-sul e em muitos meios urbanos, sendo a língua materna de cerca de um terço dos angolanos.

O quimbundo é o segundo idioma étnico mais falado — por cerca da quarta parte da população. Fala-se na zona centro-norte, no eixo Luanda-Malanje e no Cuanza Sul. É uma língua com grande relevância, por ser a da capital e do antigo Reino do Dongo.

Há também o quicongo falado no norte. Mas vamos agora ao umbundo.

No caso do umbundo, língua banta como as demais da região, dispõe de algumas expressões a seguir:

Exs.: Alonjali Walali? Que pode traduzir-se em Pai e Mãe como estão?

O papa é Olwali e mundo é Ofeka, sendo que o país é Olupale e a cidade chama-se Imbo: aldeia Kimbo. Partir diz-se Okuteya, o rico é Owasi e o pobre Ohukwi.

Já no quimbundo alguns dos vocábulos como Muxima é coração; Muxima uami – O meu coração. 

Diala é homem, Muhatu é mulher; Muhatu angolana Kukala kiauaba, compreende-se por Mulher angolana é linda. Mona é filho, Dikota o mais velho, Diaku mão, Dikamba amigo e Mutue cabeça. O Dicionário Ngola Yetu é o Dicionário Nossa Angola etc.

Balumuka é uma expressão também em quimbundo que significa levanta! Balumucar é levantar (-se) (ou acordar/despertar), segundo o dicionário Infopédia.

Kutululuca, nome da sétima faixa do Torri de Control (1996), e.g., é justamente Sossego ou Humildade em quimbundo.

João primeiro à direita e Ramiro atrás à esquerda

Inovação do som instrumental

A grande novidade das suas performances, é que frequentemente das letras combinadas com melodias e as vozes dos irmãos, salienta-se o som instrumental de viola baixo (o baixo do citado e exímio executante, compositor e cantor Djim Job), sendo um dos elementos na ligação entre outros instrumentos harmónicos e melódicos (guitarra, violão, teclado/piano, saxofone) com os instrumentos percussivos (bateria do acima referido e talentoso compositor e percussionista Kalú Monteiro), e os pianistas ou teclistas Dany Carvalho (músico, compositor aprimorado e cantor) e Ney Miranda (músico, produtor e promotor musical), estes dois últimos do que consta, participaram no disco Gira Sol do Bana – que iremos ver mais para o fim – todos cabo-verdianos.

Mais os sopros de elementos estrangeiros (Tim Mayer, Keiichi Hashimoto e Lenny Peterson), simultaneamente originando juntos harmonias rítmicas bastante perceptiveis e progressivas na forma ligeira, suave ou semi-ligeira agradáveis de serem escutadas, analisadas ou dançadas.

No entanto, afora os ritmos tradicionais cabo-verdianos já explorados pelo grupo, mais o Semba com a evocação à paz em Angola ou Marrabenta já referidos, subjaz a transversalidade nas suas inovações que encontrou terreno ainda fértil nas Coladeiras ou outros ritmos similares, retratando o amor, a saudade infinita, problemas injustificáveis nas disputas e no surgimento de novas religiões.

Sempre na esperança em alcançar o bem estar aos mais desfavorecidos que estão na rua sem teto, no meio da chuva, calor e frio; a desvalidos da sorte, a flagelados da desgraça espiritual etc. 

O grupo apelou com a voz do Ramiro no final do trecho a Deus Nosso Senhor e Todo Poderoso para que torne o mundo um lugar de paz agradável de viver.

Ouçam-se “Nani” na faixa 4 do CD Torri Di Control (1996), “Si…?” – em 3 do Bandera (1995) e outros temas idênticos nessa outra linha melódica e rítmica dos MB.

Djim Job – Viola baixo e arranjos –

Kalú Monteiro – Bateria, percussão e arranjos –

Dany Carvalho – Piano – 

Ney Miranda – Teclados –

Tim Mayer – Saxofone, Flauta e Clarinete –

Keiichi Hachimoto – Tompete & Bugle

Lenny Peterson – Trombone –

Não há foto disponível

De todos esses ritmos, muitos estudiosos, especialistas e jornalistas em revistas, sites e jornais, se debruçaram, cada qual com o seu campo de análise crítica, e que nos fez considerar o grupo a grande surpresa na área musical, tendo cumprido, supõe-se integralmente os seus objectivos, tornando-se respeitado, admirado e encantador como banda musical, efectivamente na promoção à Música dos festejos, das vivências e das alegrias das populações sobretudo foguenses, cabo-verdianas e angolanas.

E para corolário da extraordinária promoção que fizeram, os MB – não deixaram seus créditos em mãos alheias – em homenagem à região africana, exaltaram à união imagine-se – numa só nação dos cinco países africanos de expressão oficial portuguesa, numa composição antecedida de um bordão do Ramiro seguido do João, inserida na faixa 2 “Nação Palop” do já supracitado Torri de Control (1996).

Premiações e crítica positiva

Ganharam notoriedade internacional e nacional com prémios e reconhecimentos e sua imagem pública exposta é muito positiva, com o senso que dispuseram nos discos produzidos e como humanitários. 

No site Topo – Linha 2, Avelino Teixeira da Radio Azores Canada, descreveu que os MB foram reconhecidos em 1996 com a “Boston Music Awards” for an outstanding “Music Worl Act” e em 2006, recipientes do mais alto galardão civil entregue pelo então Governo de Cabo Verde: “Medalha da Ordem do Vulcão”, em reconhecimento ao seu contributo para com a cultura autóctone.

João à frente e Ramiro ao lado

Ainda Teixeira no seu artigo O famoso Duo Mendes Brothers estiveram em Toronto, expõe que no dia 15 de Junho de 2010, foi convidado no Lula Lounge em Toronto, para assistir a uma apresentação do duo, ressaltando que “Adorei conversar com este dois homens que, vim depois a saber, andam pelo mundo semeando a paz, a compreensão e o amor entre os homens através da sua poesia e imcomparável música que eles próprios criam e compõem“.

Continuou informando que, os trabalhos discográficos Porton de Regresso 1 (e provavelmente Porton de Regresso 2), destinavam-se a assinalar os 550 anos da existência de Cabo Verde e prestar tributo à Cidade Velha da Ribeira Grande de Santiago, de onde originou Cabo Verde, cidade declarada Património Mundial da Humanidade no dia 26 de Junho de 2009, numa decisão da UNESCO.

Descrevendo-os ainda: “Como humanitários eles têm incansavelmente percorrido e actuado durante mais de vinte anos nas mais remotas regiões de África incluíndo Angola, Moçambique, Guiné Bissau e Cabo Verde, promovendo paz e reconciliação através da sua música. No seu próprio estúdio já foram produzidos mais de 40 álbums. 

Finalizando que, “Parte das receitas provenientes da venda dos álbuns – já referenciados – serão doados à organização sem fundos lucrativos dos Mendes Brothers intitulada MUSIC AND LIFE FOUNDATION. Fundação Música e Vida. 

Convidam-se a ouvirem nos sites You Tube ou Spotify, além de outras, as lindas faixas 1, 2 e 3 “Porton De Regresso“, “Mãe Querida Cabo Verde” e “Cabo Verde Nos Paraiso” insertas no CD Porton De Regresso 1 (2010) que vimos acima.

Outras abordagens e notícias

Lívio Lopes no site supra referido CABO VERDE & a música, de 24 Fev. 22, publicou o artigo científico intitulado TALAI BAXU que vale a pena ser lido e relido dada à sua pertinência inédita. 

Num momento da sua abordagem – referindo-se ao grupo – disse ou melhor escreveu isto: “Nesta linha rítmica lenta nasceu este género musical, “primo-irmão” da koladeira (não trabessado) cujos desenvolvimentos com os Mendes Brothers (Ramiro e João) reconduziram talaia baxu à sua originalidade, particularmente nas suas composições “Otílio/Otília”, “Cor di Rosa” ou “Passadinha” cujos trechos, a seguir retomaram o rítmo mais lento que a koladera e uma lírica mais moderna, telúria e nativista…”

Idem João e Ramiro

Jorge Garcia (JG) num trabalho jornalístico e cultural de mérito, que promoveu e explicou quem eram os MB, com o título De Palonkon para o Mundo, publicado na edição impressa do semanário A Semana de 13 de Maio de 1997, aquando de uma digressão do grupo a Cabo Verde, informou que os irmãos Ramiro Mendes e João Mendes que emigraram aos Estados Unidos, além de criarem o grupo, poucos anos após a chegada “…lançam o primeiro LP…  Mas a vontade de Ramiro em ser um músico melhor preparado não esmoreceu“. 

Referiu que “Em 1986, quando o irmão mais novo João se formou em administração comercial e passou a trabalhar, Ramiro tornou-se no primeiro cabo-verdiano a frequentar e a concluir, em 1993, o curso de arranjo musical com especialidade em banda sonora de filmes e arranjo comercial, no Berklee Collegy of Music, uma espécie de Meca dos músicos norte-americanos“.

Entretanto – continuou – além dos temas genuinamente foguenses, enriquecido com o som dos instrumentos tocados por músicos cabo-verdianos e originários de outros países, muitas das músicas falam do povo angolano – como já dissemos – mas também de nomes das mulheres, e.g., os de Helena, Madalena, Bia, Lija, Zinha, Nany etc.

A banda era formada “por 5 cabo-verdianos, um israelita, um japonês, um colombiano, um brasileiro e um norte-americano, … esta verdadeira babel sónica” e “que produzia um som que ninguém resiste“, concluía desta forma JG.

O site MOSANBLOG, de Moçambique, falou dos irmãos e do seu grupo dizendo que “têm sua carreira marcada pela inovação da música de Cabo Verde. Foram pioneiros na revolução musical de caboverdiana chamada Bandera (estilo musical com raízes na ilha do Fogo) e Talaia Baxu“. 

Adiantou ainda: “Com mais de 150 canções gravadas, os Mendes Brothers estão entre os protagonistas das produções e arranjos modernos da música de Cabo Verde“.

Na página CULTURA, do Jornal Expresso das ilhas online, de CHISSANA MAGALHAES (CM), de 22 Março de 2017, informou que, “Os irmãos e músicos João e Ramiro Mendes, residentes há várias décadas nos Estados Unidos da América, acabam de lançar nesse país o seu primeiro livro. Um apelo à consciencialização global e à transformação espiritual. A obra chega acompanhada de uma nova música criada pela dupla“.

Constou que em 2008 estiveram pela última vez em Cabo Verde, tendo actuado num grande espectáculo no auditório da Assembleia Nacional e no Festival da Gamboa.

O livro intitulado – “Som: O Tecido da Alma, Consciência, Realidade e o Cosmos” – foi editado pela Quantum World Enterprises LLC , assim concluía CM.

Bandeira do povo

De acordo com o site NÓS GENTI, CABO VERDE, de 01 de Out. 12, este referia que Bandera, cantada pelas coladeiras acompanhadas dos tamboleiros nas festas de bandeira da Ilha do Fogo, é produto da fusão de celebrações portuguesas com ritos dos escravos oriundos da Costa de África e que ela, é hoje uma festividade profano-religiosa muito apreciada em todo o território nacional.

Festas da Bandera em São Filipe

Há já algum tempo, no programa ACONTECE através do canal RTP 2, em Lisboa, produzido por José Eduardo Agualusa, Ramiro Mendes perguntado, explicou o que é Bandera, i. e., a origem do rítmo, dizendo “Bandera é um estilo de música africano mas que nasceu assim: quando os portugueses tiveram grandes problemas com a Rainha Ginga no Reino do Congo, Rainha mandou-lhes informações no tambor de um lado para outro…

Eles foram para Cabo Verde e proibiram logo tudo que era percussão, então deram-nos o tambor português, o tambor de guerra, para tocar este tambor só em dias de Santos populares em festas de Santo António, São João, São Filipe, São Pedro etc. … Mas primeiro aprender a tocar o tambor africano. Nós dissemos tudo bem, nós vamos tocar este tambor mas primeiro o africano…”

No rítmo Banderainserido na faixa 1 do álbum homónimo e no site You Tube, ouçam-se vozes dos dois irmãos cantando “Ai Braz di Mementu, olé oh, oh! Rapican pó na tambor, olé oh, oh! N´ta finca pé n´ta cola, olé oh, oh! Pa nu brinca só sabe olé oh, oh! Ai Djemi N´Tony olé oh, oh!, Rufan pó na ajacto olé oh, oh!, Ajacto rodia criola olé oh, oh! Pa subi ba Monte Barro olé oh, oh!“…

Idem na faixa 4 “Simiera” do CD Cabo Verde / Kabu Verdi (2005) e igualmente inserto no You Tube, “Oi odju di uba oh, lé lé lé, di tchom di Montrond. Oi oh maçã loro… di tchom di Mustero. Oi oh fofoga… detadu na orbádju. Oi pombinha branca… na céu di azágua.

Ai simiera rico… djan cumpraba Djarfogu. Ai simi é pensianista… pam tuma Bandera.

Oi oh Passadinha… de pena azul. Cabu dam palavra… pan fica paxonadu…“.

Ouçam-se igualmente João Mendes em “Sodade Nós Terra” faixa 11 do Bandera (1995), “… Djan tem sodadi nha guentis eh oh, iáh! Tchuba sarradu na tchom eh oh, iáh! Roncul tcheia na rubera eh oh, iáh! Tuma banhu na djaroz eh oh, iáh!

Dja tem sodadi! Balonbolo nobu! Fofoga riba albéria! Balancia doci la ma riba!… 

Nhos leban dili! Ses terra e sabi e ca pa mi! Li du ca tem ninhum amigu! Li du ca tem ninhum vizinhu! Nha guenti nhos leban dili! Se pan fica li ta patipati! Man cre bai nha terra…“.

Idem, “Cabeça Monte” faixa 6 mas do Satélite Zamby (1999) com Ramiro Mendes “… Cá Mané di nha Techa Olé iá, Ai Tchitcha nha Maria Olé iá, E na Cruz di Deus, Ai dia di Janero, E na pôr di sol, di Nossa Senhora di Fátima…, Ai Cabeça Monte pa 12 di Fevereiro…

Ai roncul tamboru Olé iá, Co mastru fincadu Olé iá, Água cocu nobu Olé iá, Só na Cabeça Monte Olé iá, Festa di Nho San Pedro, Na cá Joana Tchitcha, Coladera fogadu…“.

Mais ainda o “Diplomadu, Parti I” do CD Diplomadu (1995).

O Choro na música cabo-verdiana

O ritmo “Tchoru” do que se sabe pelas redes sociais é que no Brasil o choro é um dos mais originais estilos de música, principalmente instrumental, cuja origem remonta o século XIX, que se atribui ter nascido no Rio de Janeiro e ganhou forte expressão nacional, tornando-se um símbolo da cultura brasileira.

Agora em Cabo Verde pouco se sabe desse estilo musical, assim chamado por tom e jeito lamentoso, embora seja caracterizado por uma musicalidade inquieta e eufórica. 

O certo é que foi resgatado pelos MB com os seus rítmos contidos nas faixas 5 “Djarfogu” no CD Bandera (1995) e 1 “A Sul do Sará” do Satélite Zamby (1999). Ouçam-se igualmente as faixas 5 “Tchoru” e 9 “Ondas De Sangui” do Torri di Control (1996) e 3 “Diplomadu, Part III” do CD Diplomadu (1995).

No tocante a outros estilos similares, os MB terão tocado e gravado rítmos do Rabolo lento e ligeiro nas faixas 6 “Sinhor Divogadu” e 7 “Kamin Di Musteru“, que se podem-se ouvir no Diplomadu (1995), sendo que os rítmos (Rabolo) é uma variante da mazurca original, tendo as letras de todo o disco da autoria de Alberto Alves (Neves) e músicas de Ramiro Mendes.

Canizade

O “Kaninzadi” (na expressão foguense) ou Canizade é uma manifestação folclórica da ilha do Fogo tornada rítmo pelos MB. Do site referido NÓS GENTI, a origem da expressão é assim conhecida: formado o Canizade por pessoas simples que se mascaram e saem à noite, normalmente na véspera de festas dedicadas a Santos. 

Uns dizem que se trata de seguidores de Santos, outros descrevem-lhes como guardiões de espólios e outros há que designam-lhes de “fanáticos” – explica o site em questão – .

Concurso de Canizade nos Mosteiros

Citando a página, na noite de Canizade – três dias antes do dia do Santo – os canizades percorrem todas as casas onde residem as “praias”. Certo para avisarem que o ritual da Bandera e sua marcha passam por essa praia, que tradionalmente é a de Boqueirão, na Cidade de São Filipe.

Nos Mosteriros a edilidade local para preservar essa tradição genuinamente foguense, lançou a 1ª edição do Concurso de Canizade, mas de pessoas mascaradas com indumentária e desfiles, realizada a 13 de Agosto de 2022, no quadro das Festas do Município, ganha pelo grupo de Mosteiros Trás. O concurso já vai na sua 3ª Edição.

Retomando em continuação do Canizade, esse ritmo criado pelos irmãos Mendes, tem a cadência semelhante aos rítmos do Colá São João (Kolá San Jon) muito em voga nas ilhas de Barlavento. 

Como se sabe, Cabo Verde é geograficamente dividido em duas regiões, de Sotavento (onde a ilha do Fogo está inserido) e de Barlavento. Ouçam-se as faixas 9 “Kaninzade” do CD Bandera (1995) e 4 “Tempu Gongon/Mundu’l Nho Djon” (Bandera/Kaninzadi), editado no Diplomadu (1995), ambos discos já supra mencionados.

“Talaia Baxu

O ritmo da Atalaia nos Mosteiros, por sua vez, o site acima referido, refere que é o género musical e de dança também da ilha do Fogo mais conhecido no país e fora dele.

Surgido nos Mosteiros, sendo seu nome uma referência à localidade de Atalaia (Talaia em crioulo) que terá evoluído de outros ritmos que se tocavam e dançavam-se antigamente nos bailes que se realizavam em povoados.

De acordo com o supracitado site, Minó di Mamá embora natural de São Lourenço do concelho de São Filipe, “é um dos nomes mais sonantes deste género musical e dançante“, onde “se inclui os MB numa versão mais “tecno“, tal como Minó o aperfeiçoaram e desenvolvendo-o, até atingir o status que hoje o conhecemos.

Para o já referido Jornal Expresso das ilhas online de 30 de Abril de 2022, destaca-se a figura de Braz de Andrade, o músico e intérprete que deu a conhecer Talaia Baxu (música) na Cidade de São Filipe e “desembarcou” com ela na Praia.

No entretanto, uma prenda à ilha do Fogo, noticiava no dia anterior o jornal A Nação, que o Parlamento tinha aprovado por unanimidade na sessão plenária o projecto que decreta 1 de Fevereiro como Dia Nacional da Talaia Baixo. 

Ouça-se a faixa 2 “Diplomadu, Parti II“, do CD Diplomadu (1995) de entre os vários rítmos relacionados com o tema e o grupo MB, aqui analisados.

Recentemente no Dia de Talai Baxu, realizou-se ainda na Cidade de Igreja pela Câmara mosteirense, um evento de intercâmbio de várias gerações de artistas de entre outras actividades, sob o lema FORUM MUNICIPAL talaia baxu PATRIMÓNIO CULTURAL IMATERIAL, visto no noticiário da TCV.

Intrepretações por Cesária Évora

Não é menos importante, referir que o leader, neste caso Ramiro Mendes, paralelamente aos afazeres dos MB, na companhia de nomes sonantes no domínio da música – abaixo indicados – está bem posicionado entre aqueles que tiveram uma fulgurante participação como compositores nos discos da nossa Diva… – Cesária Évora (Mindelo, 27 de Agosto de 1941 – 17 de Dezembro de 2011) – editados pela Lusafrica, empresa do seu manager Djô da Silva que, como se sabe, catapultou a Diva dos Pés Descalços – como ela é titulada – para a ribalta do show business internacional.

Os álbuns das músicas que foram gravadas por aquela artista e cantora de nível excepcional, como é mundialmente reconhecida, um deles em 2004, venceu o Grammy de Melhor Álbum de World Music Contemporâneo com o “Voz D’Amor“. A partir de então, o nosso país passou a ser um dos mais conhecidos no Planeta a nível do desempenho dos seus artistas na indústria fonográfica e no mundo dos espectáculos.

Dando-nos dimensão, reforçando-nos o sentimento do nosso amor e grande afeição por Cabo Verde, sublimado por alguém que chamou esse tal sentimento profundo, certo e com propriedade: a nossa cabo-verdianidade!

Compositores cantados pela Diva (isolados ou em parcerias)

Nomes como os de B. Leza, Manuel d´Novas, Luís Morais, Teófilo Chantre, Gregório Gonçalves, Amândio Cabral, Jorge Monteiro, Abílio Duarte, Dany Carvalho, Frank Cavaquim, Morgadinho, Malaquias Costa, Tututa, Mendes Carvalho, Rufino almeida, Armando de Pina, Ney Fernandes, Luis Rendall, Jon Luz, Pedro Rodrigues e Lela de Maninha.

Mais ainda os de Adelino Moreira, Júlio Feijóo, Consuelo Velasquez, Pedro Guerra/Luis Pastor, António Gomes “Tonecas” Marta/Daniel “Nhelas” Spencer, Vitorino Chantre/Teófilo, Nika Sicile/Teófilo, Tito Paris, Djô D´Loy, Gerard Mendes/Teófilo, José Agostinho/Amilcar Cabral, Pedro Guerra/Jorge Amado, Dorival Caymmi/Teófilo, Farias Junior, Antero Simas, Valdir Azevedo, Ney Fernandes, Adalberto “Betú” Silva, Mário Lúcio, Dany Mariano/Manuel d´Novas, Toy Vieira, Ildo Lobo, Constantino Cardoso, Nando da Cruz e outros.

Dizíamos, que nesse métier da Diva, do qual Ramiro foi responsável pela produção arrangements de quatro faixas do CD/LP, álbum Distino Di Belita, editado em França e Portugal em 1990, sob o selo da mesma empresa, além de contribuir em parceria com o também compositor seu compatriota Alberto Alves no Talaia Baixu na faixa 8, que deu o nome ao disco, ainda participou com a marcha “Emigranti” na faixa 3.

Em MAR AZUL LP de 1991, produzido no país dos Alpes pela mesma editora, da Cise acompanhada do agrupamento musical Mindel Band, composto pelo icónico Luís Morais, Bau, Voginha e Tey, mais os músicos adicionais, nomeadamente o maestro Paulino Vieira, o seu irmão Toy e Morgadinho, Mendes contribuiu no disco com a morna “Separação” na última faixa e ainda participação em viola de 12 cordas.

No CD MISS PERFUMADO de 1992, sempre sob a égide da Lusafrica, com a faixa 6 “Angola“, música composta por Ramiro, Cesária levou esta composição para o Mundo, em consequência a internacionalizou para os angolanos ao exorcizar em tom harmonioso e voz aprazível como é do seu timbre, na magistral interpretação da sua vida artística, as festividades do povo e as emoções do autor, do que este viu, viveu ou presenciou nas festas profanas: “Ess vida sabe qu’nhôs ta vivê/Parodia dia e note manché/Sem maca ma cu sabura…“.

Curiosamente, esse disco terá sido reeditado em 26 etiquetas da Lusáfrica e selos diferentes, apenas superado com o Cesaria de 1995 (30 versões) o São Vicente Di Longe de 2001 (29 …) e o Café Atlantico de 1999 (28 …), da total discografia da Diva. Vide o Discogs.

Após várias digressões que na ocasião o grupo MB fizera à Angola, através de shows, deslocações e aventuras com que viveu e assistiu, ou seja, da realidade vivida intensamente naquele país e naquela ocasião.

Originou o verso poético e ritmado na inspiração do compositor, através do quotidiano observado, i.e., que exergou excepcionalmente bem, “Ess convivência dess nhôs vivência, Paciência dum consequência, Resistência dum estravagância…“.

“Angola Angola”

O tempo era de paz, de festas e de felicidade, pelos vistos, provocou fortes emoções na hora da partida de todos aqueles que na deslocação ao continente africano, tiveram o privilégio de visitar o país das festanças, dos Palancas Negras (antílopes africanos) e das Mulatas de Angola (belas moças).

Portanto, o homem músico que viveu da mesma forma, tal como os outros, a Angolomania emocionante do povo, experimentou ele também como mortal, no meio do divertimento, da “sabura” e da apoteose, o dilema do querer ficar e ter que partir – quanto mais não fosse – refletido no nostálgico refrão “Angola Angola, Oi qu’povo sabe, Ami nhos ca ta matá-me, ‘M bem cu hora pa’me ba nha caminho…”

Numa compilação de músicas da artista no CD Sodade de 1994, na faixa 13, ouve-se novamente “Separação” do Ramiro.

No CD Cesaria produzido em 1995, já referido, o leader fez um backing vocals em parceria com Teófilo Chantre, além de contribuir com a composição “Consedjo“, sendo que os arranjos do disco entregues ao referido maestro Paulino.

Três anos mais tarde, no CD Cesária Évora – Nova Sintra (1998), aquele músico, arranjador e produtor, voltou a integrar nessas qualidades em 8 faixas, bem como compositor em “Emigranti” (3), já gravada em CD anterior.

No Cesaria Evora – Club Sodade outra compilação em 2003, voltou a constar por três vezes o seu tema “Angola“, mas em Remix (música modificada por outra pessoa ou pelo próprio produtor. Mas essa modificação, na maioria dos casos, é feita por um DJ, que coloca uma batida rápida e efeitos adicionais, criando uma versão geralmente dançante na música remixada).

Num DVD incluído no CD Mãe Carinhosa de 2013, da Diva, contendo um concerto realizado em 2010 no Coliseu dos Recreios em Lisboa, consta entre diversas imagens o video de “Angola“.

Exemplos de outros affairs

Muitos são artistas outros que nos seus LP´s e CD´s, tiveram a participação dos MB na qualidade de label ou do seu leader como produtor, director musical e em ambos casos, nomeadamente Sãozinha Fonseca – Andorinha di bolta (1986) e a mesma – Canta Eugénio Tavares (1993), o Bissau-guineense Tino Trimó – Kambalacho (1993), Tito Paris – Dança Ma Mi Criola (1994), o Talulu – Braga Maria (2002), o Tó Cruz, António TC Cruz (2003), Maria de Barros – Nha Mundo (2003) e Dança Ma Mi (2005), de entre vários outros.

Contudo, juntando também o seu carisma de compositor, optou-se por descrever suas prestações em apenas alguns discos de renomados artistas – porque são muitos e diversos – :

O saudoso Bana (Mindelo, 5 de Março de 1932 – Loures, Portugal 13 de Julho de 2013), outro “nome maior da nossa cultura musical quem te viu (ao vivo), quem te ouviu e quem te ouve no espólio físico que deixastes e nas plataformas digitais…”.

De acordo com o site Discogs, no disco Gira Sol de 1997, desse enorme artista e fiel intérprete de Mornas e Coladeiras e no fim da sua carreira musical Talaia Baxu, editado nos EUA e Canadá pela Mendes World Trade, Portugal pela Vidisco e ano seguinte em França pela Arco Iris, tendo Ramiro, além de director musical e produtor do amado cantor, contribuído ainda com a gravação daquele ritmo que intitulou o disco, com as mornas “Africa um dia” em parceria com Luís Lima e “Santa Ritinha” juntamente com Alberto Alves, mais ainda a coladeira “Inga” e o Cola Semba “Cabinda a Cunene“.

No Livro Infinito que o mesmo Bana gravou em 1999, mas sob a etiqueta Sons D´África com orquestração do Kim Alves, outro poli-instrumentista, compositor, produtor e músico, Mendes apareceu em três faixas 1, 6 e 7, com um novo Talaia Baxu Lua nha Doce Lua” e a morna “Sentimento” aliado com Luís Lima, mais o meio sambado “Ah! Cadiré“.

Da mesma forma no CD Canto De Amores de 2002, do grande artista, na ficha de músicos encabeçada por Jim Djob, Kalú Monteiro, Toy Vieira, Tim Mayer, Hachimoto etc, Ramiro reapareceu em composições com “Cor di Rosa” (2) “Ninho de Paz” (7) e “Angolana” (5) mas, esta última em parceria com Glanzer Ramos.

O CD PARANOIA de 1992, do Mirri Lobo, outro artista e cantor de voz excelente, heterogéneo em temas cabo-verdianos, trouxe na faixa 1 “Paranoia” com letras de Ramiro Mendes/Zunga PInheiro, música do primeiro, faixa  2  Angola e Angola” do Mendes e 4 “Cabo Verde Nha Pensamento” com letra de Alberto Alves (Neves) e cunho na música do Ramiro Mendes, este ainda ressurgiu outra vez, nas faixas 5 e 8 ” Brinca Bandera“e “Um Cabo Verde Midjor“, mais a produção do disco, sendo co-productor o Zunga Pinheiro.

O Show Man Djosinha, dois anos depois – uma lenda viva da música nacional e internacional – no seu CD SIMPATIA, com igual produção acima mencionada, gravou a coladeira “Distino de Belita II” na faixa 1 e o samba do mesmo nome do disco, na faixa 5, ambos produtos de parcerias Alberto/Ramiro.

Consta ainda no supracitado site, que o renomado artista, cantor e compositor, o inesquecível ILDO LOBO (Pedra de Lume, Sal, 25 de Novembro de 1953 – Cidade da Praia, 20 de Outubro de 2004), ter-se-á gravado duas composições daquele músico – uma em cada um dos seus mais conceituados discos – na faixa 3 “Oh Rosa Negra” (Ramiro em co-autoria com Luís Lima) do CD Nós Mornas de 1996, editado em França pela Lusafrica, mais o Talaia Baxu Jacinta“, mas na faixa 2 do CD INTELECTUAL, de 2001, sob o selo de idêntica editora.

No CD Agusto Cego – Bobossó (2000), Ramiro para além de produtor, surge em parcerias com o versátil artista, compositor e músico nas faixas 5 “Nha Castigo” e 10 ” “Note Sete“.

O CD Tito Paris – Acústico – Aula Magna de 2005, obteve João Mendes e Ramiro Mendes como Produtores Executivos do disco, tendo esse consagrado e Big artista, compositor, multi-instrumentista intepretando na faixa 8, a Coladeira “Otília, Otílio” da lavra do segundo produtor.

No Cabo Verde & a Música – aqui diversas vezes citado – mencionou-se que o Super artista Gil Semedo, um dos melhores e mais mediáticos desta geração, teve a produção de Ramiro Mendes no seu álbum Intitulado Nha Vitória (que o Discogs refere ter sido gravado em 2005 nos US).

Segundo esse site – o Ramiro, “Ainda como produtor, recebeu nomeações para o Grammy na categoria de álbuns de R&B editados nos EUA pelo seu trabalho com o cabo-verdiano Tó Cruz e a norte americana Elisa Jones“.

Acrescentando que “…já tinha criado a sua própria editora, Mendes Brothers Records, pela qual dezenas de artistas dos PALOP gravaram e editaram seus álbuns. Mais tarde, a empresa foi rebatizada como MB Global Media” – finalizou o site supra referido.

O CD Solange Cesarovna que foi produzido pelo grupo MB em 2008 nos EUA, mais tarde num projecto de Alberto Zeppieri, a artista regressaria com um outro denominado SPERANZA editado em 2011 – émulo do primeiro – com suas gravações numa simbiose perfeita, de várias músicas com letras “crioulas/italianas”, ora em “italianas/russas” – contendo 12 faixas – gravou além do “BANÂ BANDERA”, em mais uma parceria dos irmãos, três outros temas do Mendes, sendo um deles incluído sem dúvida – no rol das suas melhores produções de sempre. 

Num dia de inspiração Divina ou apoiado por deuses do Olimpo – da Música e da Sabedoria – que a mitologia helénica criou em honra a Apolo e Atena, dessa forma, Ramiro com pensamento e visão na sua ilha natal, compôsDJARFOGU É SABE!“, em ritmo Bandera, no seu crioulo genuíno – profundamente foguense.

Cesarovna gravou-a na faixa 10 do citado disco, porquanto, num tom sublime, com o seu talento raro, invulgar e belíssima voz, invocou e celebrizouse naquilo a que se pode chamar o orgulho originário de um povo na harmoniosa interpretação.

Mais ainda, preservada no CD à imagem real e o som eterno, marcantes da cultura popular de uma ilha que possui e mantém fortes celebrações – como se referiu – no seio do seu povo laborioso e espírito empenhado, em seus costumes e suas tradições. 

Para se confirmar o que foi atrás referido, veja-se ou ouça-se o que um artista produziu ou melhor compôs e a outra interpretou:

Oi Djarfogu é sabi/Oi oi Djarfogu é doci/Ama é rafugadu/Djarfogu é assuntu sagradu/Ó Djarfogu é sabi/Ampo pa disaforu/Kem ki ca pode kuel/Sai di kamim xal passa

Ó Djarfogu é riju/Ku sé petu di bronzi/Djarfogu ku tom ama som/Djarfogu alma di sitim/Ó Djarfogu manduku/Oi oi Djarfogu rafodju/Djarfogu karkutisam/Djarfogu é um só nes mundo

Djarfogu koragi/É bo Djarfogu di força/Mundu sta na bu pé/Nos tudo sta li pa bo

Ó Djarfogu maior/Subi di riba´l tudu/Bu da mon na bu petu/Fra me propi bo quê bo!

Ó Djarfogu di nos/Ampo bo bu ta frontanu/Oki bu sodadi pertanu/Inda bem kel ka ta mata

Compositor, multi-instrumentista e produtor 

Dono de um estilo diferente, fino, versátil, e cultuadas as suas composições, nomeadamente nas faixas “Emigranti“, “Separação“, “Distino Di Belita“, “Consedjo” e “Angola“, mais a última, já vistas, Ramiro ganhou reputação aqui no país e na diáspora como músico e criador – como se disse – juntamente com outras grandes referências nacionais e internacionais que tiveram como intérprete, imagine-se a nossa imortal Diva

De modo que, a conclusão a que se chegou é que o desempenho do nominado artista e músico e suas participações como compositor, produtor e não só, embora residindo lá fora, aliados à sua formação musical, contribuíram para ajudá-lo a conseguir o prestígio maior aqui no país, já visto.

No além fronteiras no seio da crítica especializada, mantendo tal prestígio ainda lá fora – superiormente no grupo dos melhores compositores da Música de Cabo Verde.

João Mendes

Por sua vez, o artista João, irmão do Ramiro, é um dos esteios do grupo MB com a voz, criando coreografias quando canta sempre dentro da linha e estilo melódico do grupo, participando ele também desde o início, com muitas e variadas composições, quer em parelha com o irmão, quer sozinho.

Exemplos de repertórios 

Os CD´s “Palonkon” (1993) e “Bandera” (1995), são apenas dois discos dos mais apreciados pelos foguenses dado ao cuidado técnico na sua gravação e outros com sua forte intervenção. Vejam-se apenas alguns exemplos:

Composições:

João Mendes; “Margaridamas no CD Um Novo Metodo, “Xandinha“, “Fidju Koitadu” e “Palonkon” no CD Palonkon (1993), “Bia” no CD Bandera (1995) etc.

João Mendes e Ramiro Mendes; “Helena”, “Vida“, “Lija” no CD Palonkon (1993), “Bandera“, “Djarfogu“, “Madalena“, “Kaninzade“, “TPA” e “Sodade nós Terra” no CD Bandera (1995) e outras.

Já no final deste exercício de opinião, ancorado no percurso incomum dos MB, uma banda mediática cabo-verdiana residindo no estrangeiro – local onde terá surgido – muito produtiva no campo musical e na forma como fez para desenvolver e preservar as memórias e a identidade dos povos.

Resultando no acervo musical e cultural aqui exposto, que irá servir – a nosso ver – como material de consulta e de conhecimento – como de inspiração – tanto das presentes, como das futuras gerações destas ilhas do Atlântico Médio e da sua diáspora.

Vão-se os nossos agradecimentos a todos os sites, revistas e jornais no apoio prestado – a que se socorreu – bem como os autores dos artigos neles publicados e utilizados nesta rememoração do passado das obras dos fazedores da cultura musical do nosso povo e de povos irmãos, cujos propósitos assentam-se na esperança de um porvir sempre melhor e não muito distante.

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