A Cabo Verde Airports, empresa privada que gere os aeroportos do país, garantiu ao A NAÇÃO que as questões de segurança são “prioritárias” e estarão sempre “salvaguardadas” pela empresa. Isto na sequência do comunicado em que a mesma informou que a partir de 22 de Janeiro, segunda-feira passada, ia cancelar alguns serviços de apoio às operações da TICV (Bestfly) e Air Senegal. Sabe o A NAÇÃO que as operações, pelo menos da TICV, estão a decorrer com uma certa normalidade.
A Cabo Verde Airports, entidade que desde Julho do ano passado gere os aeroportos e aeródromos do arquipélago, e que é detida pela Vinci Airports (70%) e pela subsidiária portuguesa, ANA Aeroportos de Portugal (30%), anunciou através de um comunicado que ia deixar de prestar apoio às operações da TICV (Bestfly) e à Air Senegal, a partir de segunda-feira-passada, 22.
A empresa, que detém um contrato de concessão de 40 anos para a gestão das infraestruturas aeroportuárias de Cabo Verde, argumentou que a decisão tinha como objectivo “travar o aumento insustentável das avultadas quantias em dívida”, que as duas empresas vêm somando em prejuízo da Cabo Verde Airports. Uma situação que garantiu a empresa pode “colocar em risco a sustentabilidade económica e financeira da empresa”.
Cabo Verde Airports remete-se ao silêncio
A notícia gerou, naturalmente, vários questionamentos no espaço público, incluindo as redes sociais, restando saber quais os serviços que não vão ser prestados por parte da empresa às referidas companhias e que implicações isso tem para os utentes. Especialmente, tendo em conta que os voos inter-ilhas dependem exclusivamente da TICV que detém o “monopólio” das operações, por assim dizer. É que embora o mercado seja aberto, na prática, é a única a operar, com todas as consequências que daí advém.
Contatada pelo A NAÇÃO, para esclarecimento de pontos que ficaram por clarificar, a empresa fechou-se em copas, remetendo, apenas o seguinte, através do Gabinete de Comunicação: “A Cabo Verde Airports nada mais tem a acrescentar ao comunicado emitido, por agora. Apenas assegurar que as questões de segurança são prioritárias e estarão sempre salvaguardadas”.
Pressionar os caloteiros
Contudo, ao que tudo indica, o comunicado pode ter sido uma estratégia para pressionar as companhias a pagarem as dívidas, até porque, pelo menos, os voos da TICV estão a operar com uma “certa normalidade”, segundo uma fonte do A NAÇÃO.
Isto, tendo em conta que decorrem negociações e conforme a Cabo Verde Airports “nem mesmo as contrapropostas enviadas pelas companhias aéreas foram respeitadas”.
A companhia considera “prioritário e imprescindível” que a TICV e a Air Senegal respeitem os planos acordados e paguem pelos serviços prestados, como forma também de a empresa poder cumprir com o acordo de concessão e poder fazer investimentos de modernização e outros nos aeroportos do país.
Sabe o A NAÇÃO que a dívida da Air Senegal é, ao que tudo indica, superior à da TICV, faltando igualmente saber qual é a situação da TACV, sendo de recordar que um aparelho da Icelandair chegou a ser impedido de voar por falta de pagamento à então ASA.
Serviços
Conforme apuramos, na prática, a Cabo Verde Airports tem a gestão aeroportuária geral dos aeroportos e aeródromos nacionais, como, por exemplo, o serviço/programa de mapeamento/tracking dos passageiros, desde que fazem checkin, até que entram no avião.
Ou seja, esse tracking controla, por assim dizer, os passos do passageiro e bagagem: checkin, seguimento de malas, passagem no controlo de detetor de metais e outros, controlo de fronteira, sala de embarque e embarque no avião.
De notar também que o serviço de checkin e encaminhamento da bagagem é feito pela CVHandling, embora os balcões físicos de checkin e os tapetes rolantes sejam propriedade da gestão aeroportuária, por assim dizer. Nessa equação convém não esquecer que o parqueamento das aeronaves também têm de ser pago, naturalmente, pelas companhias à Cabo Verde Airports.
TICV frequentemente com problemas
Recorde-se que a TICV (Bestfly) tem estado constantemente a ser alvo de críticas por parte de utentes nas redes sociais e até de agências de viagens cabo-verdianas, que incorrem em elevados prejuízos devido ao que parece ser alguma ineficiência da companhia na gestão dos voos, conforme já demos conta várias vezes no jornal e site A NAÇÃO.
Às queixas das agências de viagens e turismo nacionais, têm-se somado, com muita frequência, reclamações de passageiros e comerciantes nas redes sociais que vêm as suas vidas, compromissos e negócios adiados, devido aos atrasos e adiamentos e cancelamento de voos.
Igualmente, como já demos conta, à falta de uma comunicação e apoio eficiente aos clientes tem sido também uma crítica grande à TICV (Bestfly), detida, como se sabe, por capitais angolanos. Há clientes que já viram os seus voos antecipados e que os mesmos partiram antes do horário previsto, sem que fossem avisados, com todos os constrangimentos que isso acarreta. A isto acresce a constante falta de aparelhos e problemas com peças nas aeronaves que limitam e prejudicam as operações.
Neste quadro e contexto o comunicado da Cabo Verde Airports pode ser um primeiro sinal de como a empresa quer romper com o passado em que a ASA, outrora responsável pelos aeroportos, foi acumulando dividas de certas companhias aéreas que, a partir de certos momentos, chegaram a tornar-se “impagáveis”.
Problema antigo
Mário Paixão, antigo PCA da ASA, conta a propósito, na sua página do Facebook, que “Algumas companhias aéreas (com capital cabo-verdiano e africano) passaram muito tempo a evadir as suas obrigações contratuais quanto ao pagamento pelos serviços prestados pela ASA/aeroportos (hoje Cabo Verde AirPorts, privada)”. E que nisso nem sequer “repassavam as receitas cobradas em nome da ASA, o que originou muitos conflitos comerciais no passado, a maioria resolvida com intervencionismo do Governo”.
“Desse intervencionismo resultava situações complicadas com a administração fiscal que aplicava impostos sobre resultados fictícios (lucros) que só existiam no papel. A ASA só não se afundou porque tinha robustez suficiente para aguentar o lastro que o puxava para o fundo. Em 2014 conseguiu-se salvar os serviços aeroportuários com a compra da Cabo Verde Handling (CVH) pela ASA, face aos riscos iminentes do afundamento da TACV. A CVH continua na esfera pública, sujeita aos abusos do crédito malparado e do intervencionismo do Estado”.
Para Mário Paixão, “é triste que tenha de ser assim, é triste que os passageiros e utentes dos transportes aéreos venham a pagar pelas ineficiências no transporte aéreo doméstico. A TICV (Bestly CV) é mais uma pedra que puxa o sistema para o fundo e esperemos que o Governo e a Agência da Aviação Civil cumpram o seu papel e ajam com a transparência e o rigor que o caso merece”.
AAC, de novo, sem resposta
De notar, A NAÇÃO tentou mais uma vez ouvir o regulador, a AAC, sobre o assunto, sem sucesso.