Boy Game, nome artístico de Manuel Gomes Ortet, jovem que se vem destacando no cenário musical cabo-verdiano, não apenas pela habilidade lírica, mas pelo percurso de superação e transformação. O rapper, cujo nome ecoa nas ruas de Vila Nova, emergiu de um passado tumultuado para se tornar uma inspiração para muitos, conquistando não só palcos nacionais, mas também internacionais.
Aos 32 anos, Boy Game (Manuel Gomes Ortet, seu nome de baptismo, e antes também, The Game), revela os trajectos de sua evolução artística. No princípio, o seu nome artístico reflectia a influência do rapper americano homónimo. Contudo, após uma passagem na prisão e uma profunda reflexão sobre sua música, optou por renascer como Boy Game, buscando uma identidade própria e uma mensagem mais ampla. A música tornou-se não apenas uma expressão artística para Boy Game, mas uma terapia durante seu tempo na prisão.
“A música nos fortalece e salva vidas”, afirma ele. As letras, muitas escritas durante seu período na cadeia, são um reflexo visceral de sua experiência e uma poderosa ferramenta de transformação pessoal.
Parcerias Estratégicas: Nunaus Coreia, Azaias e Hélio Batalha
O apoio de figuras-chave como Nunaus Correia e Azaias foi crucial em seu caminho inicial. A primeira vez no estúdio, sob a orientação de Nunaus, marcou o início de uma jornada musical. Além disso, a amizade sólida com Hélio Batalha, que o visitou na prisão e posteriormente colaborou em projectos, contribuiu significativamente para sua confiança e reconhecimento.
“Conheci o Hélio numa atividade interna na cadeia que fazia parte do programa ULD Unidade Livre de Droga, nessa actividade ele cantou e nós também. Quando ouviu que eu já tinha saído da prisão ele me chamou e eu fui ter dele e me mostrou o reconhecimento que ganhou como o melhor hip hop no CVMA e ele disse para eu levar para a cadeia que o rap sempre esteve vivo” (????). Tudo isto me motivou muito, imagine, um rapper que está no seu auge e ganhando prémios e eu que canto e não sou muito conhecido a receber isto e me deu uma visibilidade por isso é algo que sempre guardo comigo”, afirma Boy Game.
Boy Game desafia rótulos ao incorporar elementos afro em sua música, uma decisão inicialmente controversa, mas que se revelou estratégica. “Não vou me limitar”, afirma ele, destacando que o rap é a mensagem, independentemente do ritmo escolhido. A sua composição “Nu ka kre pa manchi” é um exemplo da fusão bem-sucedida entre rap e afro.
Das Prisões aos Palcos: Uma Vitória Colectiva
O rapper, juntamente com colegas como Dibaz e PCC, todos ex-reclusos, comemoram o sucesso conquistado. “Somos vencedores”, declara Boy Game, refletindo sobre a trajetória que os levou de um lugar de desvalorização para os palcos nacionais e internacionais.
Ao olhar para o futuro, Boy Game deixa uma mensagem para a nova geração de artistas. “Tem que ter amor e foco pelo que faz”, aconselha. Destaca a importância de perseverar e evitar desvios, especialmente quando as tentações do caminho fácil podem parecer irresistíveis.
Fora dos palcos, Boy Game se revela como uma pessoa que ama rir, desfrutar da vida e se dedicar à produção musical. Sua incursão na produção começou como um hobby, mas cresceu à medida que ele encontrou seu caminho no intrincado mundo da criação musical.
Incentivo aos Novos Talentos: Uma Missão Pessoal
Boy Game não apenas brilha nos holofotes, mas também é um incentivador de novos talentos. A sua disposição em ajudar artistas locais emergentes, como Lay Garcia e Lose Júnior, demonstra seu compromisso em proporcionar visibilidade àqueles que merecem ser ouvidos.
Num país onde as histórias de superação, muitas vezes, se desenrolam em silêncio, Boy Game destaca-se como uma narrativa vibrante de transformação, resiliência e celebração. O seu percurso marcado pela “luz e escuridão”, como refere, continua a ressoar através da música, ecoando as batidas de um coração que superou as adversidades.
Sara Andrade
Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 843, de 26 de Outubro de 2023