Apesar de algum estigma ainda enfrentado pelas mulheres no boxe, a pugilista cabo-verdiana, Nancy Moreira, que se sagrou Campeã Africana de Boxe 2023, garante que esta modalidade foi a sua “melhor escolha”. Aos 34 anos de idade, esta mãe, dona de casa e atleta profissional, não tem dúvidas que encontrou no boxe a reafirmação da sua força enquanto mulher.
O passado sábado, 5 de Agosto foi memorável para Nancy Moreira. Depois de muitas lutas e sacrifícios, sagrou-se, Campeã Africana de Boxe, na categoria 63-64 kg, nos Camarões.
A atleta, bolseira olímpica para os Jogos Olímpicos de Paris 2024, derrotou a marroquina Oumayma Ahbib na grande final do campeonato, nos Camarões, apesar de ter contado com poucos apoios. Fechou o seu próprio restaurante e contraiu um empréstimo para representar Cabo Verde na competição africana. E não se arrepende.
O início
Tudo começou aos 23 anos, altura em que deu os primeiros passos no boxe, após deixar o futebol de 11. Motivada por um cunhado, lançou-se na modalidade, apesar de todas as dificuldades iniciais. “O primeiro treino foi tão difícil que só voltei depois de um mês”, recorda.
Com o regresso não teve dúvidas, o boxe foi definitivamente a sua “melhor escolha”. “Além de já ter o bicho da competição, perdi muito peso e isso foi, sem dúvidas, o que me cativou na modalidade”, explica Nancy Moreira ao A NAÇÃO.
Desde então, e há onze anos, o boxe faz parte do dia-a-dia desta cabo-verdiana a residir no Norte de Portugal, seja no controlo do stress, na manutenção da vida saudável, seja, acima de tudo, como uma atleta de alta competição que conquista, cada vez mais, o seu lugar no boxe feminino no mundo.
Atleta, mãe e dona de casa
No entanto, garante que ainda sente o estigma de ser uma mulher no boxe, mas acredita que se está num processo de mudança de mentalidades, pois, como defende, o desporto não tem “género”, apesar do preconceito salarial. “No meu caso tento provar que uma mulher pode ser atleta de sucesso e ainda assim ser boa mãe e dona de casa. Mas, claro, existe bastante preconceito salarial, mas penso que estamos num bom caminho”, avança a atleta.
Mãe de um menino de cinco anos e tia/mãe de outro de seis, que adoptou aos cinco meses, Nancy tem uma rotina preenchida com dois treinos diários, de segunda a sábado. Tem conciliado a vida de pugilista, com a de mãe, dona de casa e companheira. Uma tarefa que diz difícil, mas não impossível.
“Sou mãe, dona de casa, empresária e atleta de alta competição. Tudo é uma questão de gestão de tempo, dedicação e muito amor. Nós mulheres somos multifacetadas. Conseguimos tudo”, acredita.
“Sinto-me bem com meu corpo e meus músculos”
O boxe reafirmou a força de Nancy enquanto mulher e permitiu que melhorasse a autoestima e a autoconfiança, tanto assim é, que se diz mais vaidosa, hoje, do que antes de começar a praticar a modalidade. “Hoje sinto-me bem com meu corpo e com meus músculos, que nada me tornam com um aspeto masculino, pelo contrário. Aconselho vivamente a todas as mulheres”, sugere.
Para Nancy, os desafios da mulher no boxe são, sobretudo, a falta de apoios. No seu caso, apesar de ter recebido uma bolsa olímpica, ainda tem dificuldades em encontrar “sponsors” para todas as competições e estágios, como foi o caso do Campeonato Africano de Boxe.
A campeã não para
Depois de conquistar o primeiro lugar em África, o foco é nos jogos olímpicos de Paris 2024. Um objetivo que faz com que Nancy lute, diariamente.
Nancy Moreira já conquistou outros títulos como campeã de África zona 2 e Bronze na África Games 2019.
A atleta é natural de Tira Chapéu, Praia, em Santiago, vive em Portugal desde os oito anos de idade e inspira-se no marido e atleta profissional, o português Jorge Silva.
Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 832, de 10 de Agosto de 2023