Os aduaneiros ameaçam entrar em greve esta semana, por sete dias, por entenderem que é hora de o Ministério das Finanças rever e recuar nos novos critérios de atribuição das remunerações assessórias, dos quais a categoria ficou prejudicada. Entre outras exigências, esses funcionários reivindicam o enquadramento profissional de 80 por cento (%) dos colaboradores da Direcção Geral das Alfândegas.
Os funcionários das Alfândegas estarão em greve de 10 a 17 deste mês, o que, a confirmar-se, poderá causar vários e graves prejuízos quer aos utentes desses serviços, quer aos cofres do Estado, que precisa dos aduaneiros “como de pão para a boca”.
De acordo com o pré-aviso de greve do Sindicato Nacional Democrático dos Trabalhadores da Administração Pública (SINDETAP), a greve decorre de várias reivindicações da classe dos aduaneiros, com destaque para a adopção do modelo de distribuição de remunerações assessórias existente, actualmente, na Direcção Geral das Alfândegas (DGA).
A classe também reivindica a resolução do enquadramento profissional de 80 por cento (%) dos funcionários da DGA, “que ficaram lesados com a aprovação dos Estatutos dos Técnicos de Receitas do Estado”. A regularização da situação dos contratados e o enquadramento profissional dos funcionários do quadro comum são outras exigências dos aduaneiros.
Mas, de acordo com um abaixo assinado dos aduaneiros a que A NAÇÃO teve acesso, essa classe teme que o estudo para a determinação dos novos critérios de atribuição das remunerações assessórias não venha a ser devidamente socializado e validado por todas as categorias afectas ao pessoal aduaneiro, “como aconteceu com o estatuto, cuja versão final foi aprovada sem a devida socialização com as partes interessadas”.
Nesse abaixo-assinado endereçado ao ministro das Finanças, Olavo Correia, os aduaneiros falam de “disfuncionalidades” detectadas nos estatutos, assim como as “discrepâncias, incongruências e injustiças”, em relação à lista de transição e na lista provisoria de regulamentação dos precários. Numa palavra, mostram-se receosos em relação ao silêncio da tutela sobre a nova forma de distribuição dos proventos auferidos pelo pessoal dos diversos quadros aduaneiros.
Essas “discrepâncias, incongruências e injustiças”, conforme o referido abaixo- -assinado, vêm causando “desconfortos e insatisfação” no seio da classe, sobretudo, pela “não socialização” do estatuto de técnico de receitas por parte dos responsáveis do Ministério das Finanças e, “mormente pela publicação da lista definitiva de transição, nos termos em que foi publicada”.
Realçam ainda que, em Janeiro passado, numa reunião com os aduaneiros da Praia, o ministro das Finanças lhes informou que, em finais de Março, a legislação referente à distribuição das remunerações assessórias dos funcionários seria aprovada, mas “tal ainda não aconteceu”.
Entretanto, face ao silêncio da tutela, dizem temer que a regulamentação de distribuição dos rendimentos assessórios venha a ser aprovada “sem a necessária, merecida e justa audiência dos representantes da nossa classe. É nosso entendimento que, a manter-se esse secretismo, todos, sem execpção, poderão sair prejudicados”.
Mal-estar
Segundo um comunicado dos funcionários das Alfândegas, o mal-estar entre os aduaneiros, a Direção Nacional de Receitas do Estado e o Ministério das Finanças teve início com a publicação do Estatuto de Técnico de receitas e da lista definitiva do pessoal do quadro privativo das Finanças-DNRE em Janeiro e Maio de 2021, respectivamente.
“O processo foi mal conduzido, houve total ausência de critérios objetivos, transparentes e bom senso. Várias foram as ilegalidades e irregularidades cometidas”, lê-se no comunicado.
O novo enquadramento, segundo a mesma fonte, colocou pessoas com mais de vinte anos de carreira em situação de início de carreira – Técnico de Receitas Nível I, o que corresponde a mais de 90% do total dos funcionários do quadro técnico aduaneiro, “deitando por terra todo o percurso e as conquistas conseguidas ao longo do tempo”.
Ou seja, afirma-se, “houve um claro retrocesso na carreira desses técnicos, sem nenhuma perspetiva de evolução e condenados a terminar a carreira na categoria de ingresso”.
Os reclamantes alegam, no entanto, que tratamento diferente tiveram os colegas da DGCI, onde a maioria ficou enquadrada na categoria Técnico de Receitas, Nível III. “De se destacar que, pessoas com cinco ou seis anos de serviço que foram automaticamente elevados a categoria te Técnico de receitas nível III, em detrimento de pessoal aduaneiro, com mais de 20 anos de serviço e com nível de formação académica igual ou superior”.
“Nas Alfândegas, as remunerações acessórias são percebidas de forma transparente, através do Tesouro Nacional, frutos dos trabalhos realizados fora de horas normais de serviço, nos portos e aeroportos, aos fins de semana, nos feriados, de madrugada, no alto mar, e muitas vezes, em condições pouco dignificantes”.
De acordo com o mesmo comunicado, a ideia da DNRE é juntar essas remunerações acessórias num único fundo e fazer a distribuição aos técnicos das duas Direções Gerais, consoante a categoria de cada funcionário, “não levando em consideração a especificidade do serviço de cada Direção”.
“O fundo seria praticamente alimentado pelas remunerações da DGA, e conforme a proposta de distribuição recebida da DNRE, estamos certos que os funcionários aduaneiros ficarão novamente em desvantagem, perdendo rendimentos e colocando-se em situações vulneráveis que poderiam pôr em risco o cumprimento dos compromissos financeiros já assumidos”.
Os aduaneiros exigem mais respeito pelo seu trabalho, por considerarem que a Alfândega desempenha missões de “extrema importância”. “É responsável por fornecer ao Estado mais de 50% das receitas fiscais do país; desempenha um papel fundamental nas fronteiras, impedindo a entrada de mercadorias ilícitas, nomeadamente armas, munições, drogas, medicamentos não autorizados, a entrada de mercadorias que podem por em risco o nosso meio ambiente, e a saúde pública, para além da sua missão económica”.
Cerca de 60 mil contos mensais como suplemento remuneratório
No fundo, o que parece estar em causa é a distribuição dos suplementos remuneratórios que abrangem as ajudas de custo, participação nos emolumentos, subsídios de deslocações, coimas, multas, custas e os demais legalmente previstos.
O estudo do impacto da implementação dos suplementos remuneratórios na DNRE, a que A NAÇÃO teve acesso, diz que o objetivo é proceder à igualização na distribuição dos suplementos remuneratórios referidos entre os funcionários e agentes das estruturas administrativas que integram a DNRE.
De acordo com o referido estudo, o custo total, mensal, em relação aos suplementos remuneratórios para os quadros da DNRE, rondarão os 60 mil contos.
Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 827, de 06 de Julho de 2023