Por: Péricles O. Tavares
Cabo Verde, um pequeno Estado arquipelágico no meio do Atlântico, zona privilegiada de confluência estratégica, detentor de imenso mar, com espaço aéreo considerável, cobiça das potências mundiais, de reduzida população, condição “sine qua non” para a prosperidade de um povo, atesta um governo, sendo sábio de carisma aristocrata.
Cada povo tem a sua identidade, a sua postura cultural, com o nível de civilização em que apresenta, daí, a escolha do seu governo em liberdade e consciência. Contudo, pesa saber quem elege quem, quem sai a ganhar depois da contagem dos votos e oficialização e divulgação dos resultados. Eleitos os partidaristas, estes insinuam a partilha do poder numa confusão de idiotices e vandalismos constitucionais perversa, com ninguém e contra ninguém, nada a ver de sagrado com o republicanismo liberal, com quatro poderes designados, mas apenas dois distintos votados: legislativo e presidencial, demais executivo e, por último, o judiciário.
O Poder do Povo é indivisível, todo poder centraliza-se, e se descentraliza a favor de quem confere poder e retira poder. A democracia de fachada, o poder soberano que emana do povo, a sua caducidade final à boca de urna por doação ou por transferência durante um período pré-estabelecido de irresponsabilidade continuada. A democracia se revê nas três vertentes previstas como exigência de espírito da revolução francesa contra o absolutismo monárquico, com o Slogan: “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, o que conduziu à libertação e, consequentemente, à independência dos povos oprimidos nas diversas longitudes geográficas do globo. Uma democracia sem meritocracia, com uma postura de servilismo, ditadura e totalitarismo atualizado. É imperioso partir para outra dimensão racional, um salutar de vivências que permitam a inclusão de todos no processo de desenvolvimento, com a multiplicação de víveres e de bens para melhor partilha que satisfaçam as vontades das classes, do povo e das elites, tendo em conta os possíveis recursos a arrecadar da litosfera e hidrosfera, para potencializar a economia (verde e azul), e renegar o simplicíssimo que tanto perturba como persegue os sucessivos governantes cabo-verdianos, desde a assunção da independência do território, até três quartos do passado século a um quarto do presente tempo percorridos.
A democracia, um instrumento de esperança, harmonia e paz nacional, exige do ator político características especializadas, de ouvir com humildade e gratidão e decidir com elevado grau de justiça. O que se regista na governação destas inóspitas ilhas, é uma plêiade de cleptocratas no desempenho da cleptocracia, com o poder dos ricos sobre os pobres, a instalação da corrupção, o nepotismo, o amiguismo, e por aí adiante, sem deixar de lado as privatizações com terceiros desenfreadas com perdas irreparáveis, em nada abonatórias para o crescimento económico, o PIB. Empréstimos são dívidas à espera de liquidação, a curto e longo prazo, para satisfazer o défice, que afronta a complacência nacional.
A administração pública tem à cabeça um governo de iniciativa condicionada, de fraca coordenação tecnocrata, onde nada funciona satisfatoriamente na república. Por exemplo, os transportes aéreos e marítimos não garantem a circulação de pessoas e bens entre ilhas, um veículo propulsor no alavancar da economia, onde o povo padece, mas o governo não compadece. O sistema governativo, com o mito da divisão do poder, não serve para um Cabo Verde do presente e futuro.
A prática da democracia de brando costume está chegando ao fim da “picada” (tolerância), o povo vai dar um “Basta!” tremendo antes que todos os anciães partam rumo à eternidade e os jovens desventurados partam para emigração, ou “terra longe”, e Cabo Verde volta ao antigamente, à História.
Para que o negativismo abandone e se afaste do espírito resiliente do homem crioulo, há que mudar de paradigma, prescrever normas que alberga a todos, a começar pela Constituição da República, um gatafunho jurídico que mantém o povo marcado pelas sequelas do colonialismo de outrora; livrar o já sofrido homem ilhéu do cabresto partidário; elaborar um código eleitoral que anima a todos os cidadãos à concorrência a um cargo eletivo legislativo, inscritos em partidos ou independentes nas listas abertas (nominais).
O Povo constitui o órgão de soberania maior, único, representado pelo Presidente da República, símbolo nacional vivo, responsável, uma personalidade que responde pelo Estado e a Nação global, no plano interno, mas também no plano externo, na universalidade dos Estados reconhecidos à luz do direito internacional. É legítimo que, o chefe de estado em cumprimento do dever de magistrado, censure publicamente os erros da governação, as insuficiências de percurso mesmo que os reparos por alguns, sejam considerados inconstitucionais.
Todavia, Cabo Verde, estado não alinhado, lança ao desbarato no mercado internacional tudo o que à priori pareça ser rentável na praça internacional, em prejuízo e marginalização para com os empresários nacionais à espera de oportunidades. O povo de Cabo Verde não elege governo algum no atual sistema de governo, sendo um prolongamento do parlamento, que não admite o apontar de defeitos de percurso por outrem, ao calar as vozes dos cidadãos insatisfeitos, ao arrebatar oportunidades, ao silenciar sob ameaças de passar à condição de desocupado, e demais episódios, sendo factos consumados em calabouços, seja tudo, menos democrático e participativo.
O governo executa projetos, políticas públicas e administrativas territoriais e arrecada o fisco, ao exercer a diplomacia, isto tudo sob o olhar fiscalizador da soberania suprema. O sistema governativo cabo-verdiano, o semipresidencialismo de iniciativa parlamentar adotado do português, ainda por vincular por causa da miséria em que o povo vive, em toda a sua dimensão social. Pensar e expressar o idioma português de forma fluente é privilégio do cidadão crioulo. O Crioulo, enquanto língua nacional identitária e oficial tanto enobrece como glorifica o estado nação. Assim sendo, todas as outras línguas estrangeiras podem constituir património nacional de forma subalterna, com data vênia, como instrumento de estudo e de pesquisa científica, e de trabalho de igual peso.
Contudo, a democracia, um estado acrescido da alma, exige elaboração de projetos sustentáveis, metas a cumprir tanto pelos governantes como pelos contribuintes. O Estado de Direito Democrático em construção, já iniciado, com uma determinação inconclusiva, poderá desmoronar quando menos se deseja. A democracia, enquanto sistema de governo, exige normas atualizadas e ajustadas e que melhor sirvam os interesses do coletivo, evitando a libertinagem, com um povo carente de liderança, que desatina de forma imprevisível.
A sociedade organizada rege-se pelo direito do mesmo nas épocas mais remotas, no seu estado natural, a lei do mais forte. Pela imaginação os seres humanos evoluíram-se: das castas às tribos, estado-policial, até à Polis, esta última, com exibição de normas prescritas. O universo rege-se pelas normas, ou seja, tudo que existe está por baixo do direito.
A questão que se coloca é simples: qual será o melhor sistema de governo para Cabo Verde, enquanto estado e nação soberana? O presidencialismo? E porque não o semipresidencialismo, com a sua diferença e conveniência?
Um olhar atento virado para as práticas e resultados de três sistemas de governo executados, a executar à volta do mundo, como por exemplo também a aristocracia, a democracia de iniciativa parlamentar e o presidencialismo.
No primeiro sistema, a aristocracia tanto é eficiente como eficaz, sendo baseada na meritocracia, estando os melhores à frente dos bens públicos ou comuns.
No segundo sistema de governo, a democracia parlamentar, todos servem para o poder. Os mais fracos, ou os incapazes, uma vez achados em listas partidárias, são dignos funcionários ao serviço do partido eleito; os deputados, o chefe do governo e todo o colégio ministerial são indigitados, uma dádiva parlamentar oficializada à posteriori pelo mais alto magistrado nacional com poder de promulgar, de vetar e de apelar, num sistema oneroso, e tremendamente penalizante para os contribuintes.
Por último, o presidencialismo, onde o chefe de estado é eleito de forma secreta e universal, de forma nominal, onde desempenha as funções da administração do território; onde escolhe, nomeia e demite livremente os seus colaboradores; seleciona e dá posse aos magistrados judiciais; presta contas ao parlamento e aos tribunais; apresenta proposta orçamental, elaboração das leis ou as alterações oportunas das mesmas; está presente em concertação permanente com a nação, nas instâncias internacionais como Chefe de Estado e de governo determinado, dotado de poderes constitucionais e consensuais para declaração de guerra e paz em circunstâncias extremas, visando sempre os interesses nacionais. Um estado de responsabilidade visível, igualitário, de oportunidades que se submetem ao direito, que liberta os seus cidadãos dos elevados custos e sacrifícios com a manutenção. A Justiça impera num sistema de governo que combina com os anseios do povo de Cabo Verde para alcançar o apogeu da democracia plena.
Cabo Verde tem vida e sapiência para dar a volta à situação, com um sentido de retoma rumo ao desenvolvimento sustentável, a entrega total à causa em comunhão de ideias, de convicção espiritual, de mãos dadas com a diáspora patriota para construir um estado novo, com um moderno orgulho das gerações sucessoras. Cabo Verde não pode e não deve continuar de braços estendidos e mãos abertas à espera de alguma compaixão, sobejo de outras nações e humilhante a postura de um governo pedinte para garantir o jantar ao povo mendigo. Cabo Verde, árido e seco, pode tornar as suas ilhas em Oásis no meio do oceano. No tempo todo, com o atraso registrado, se constata o desperdício de energia com lamúrias de culpabilização infundadas, onde o povo espera mais e almeja por um Cabo Verde melhor, sem fome, com saúde, educação e justiça. Em suma, um orgulho de ser natural cabo-verdiano. Trabalho, trabalho, trabalho sempre!
Abril, 2023