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Estado de coisas ou coisas do Estado: “A responsabilidade do Estado em tempo de crise social e económica (II)

Por: César Garcia

(2) Aumento de salários para trabalhadores/funcionários com salários mais baixos, “generalização” de subsídios/pensão social, outros apoios sociais não especificado.

Em 2015 entrou em vigor a chamada “reforma de tributação de rendimentos”, particularmente para empresas como para trabalhadores.

Reforma de tributação de rendimentos de 2015

A dita “reforma”, pelas suas consequências, sobretudo no agravamento de fosso entre os que ganham mais e os que ganham menos, constituiu uma das reformas mais “beras” levadas a cabo por um partido no poder que se diz de “esquerda”, embora sob batuta quer do partido na oposição, na altura, que se identifica por ideologia de “direita conservadora”, mas sobretudo por quem estava a tomar conta da administração fiscal, ou seja, o Ministro das Finanças, proponente, que tudo levava a crer que defendia a equidade da tributação, indo de encontro à “capacidade contributiva” prevista na CR.

Essa “reforma” fez tudo o contrário: diminuiu drasticamente a taxa de tributação para rendimento de trabalho mais elevado, agravou a taxa sobre rendimentos da classe média, introduziu um mecanismo diferenciado e injusto para devolução dos chamados “gastos sociais”,   prejudicando sobremaneira aqueles com rendimentos inferiores, introduziu a tributação por “taxas liberatórias” sobre rendimentos de trabalhos dependentes e, ao mesmo tempo, agravando a situação para quem pretendesse apresentar declarações de rendimentos, impediu assim o reconhecimento da “solidariedade e os encargos familiares” através da declaração por agregado familiar, enfim…

Para qualquer “leigo” em matéria fiscal, basta aumentar o salário para haver a recuperação e/ou reposição do poder de compra. Para esse não se vê o peso de taxa de tributação sobre o valor real do rendimento, pois, quanto maior o rendimento maior é o imposto retirado desse rendimento, e casos há em que aumenta o salário e fica-se com menor rendimento disponível.

Por conseguinte, trabalhar o  aumento do poder de compra ou do rendimento disponível via redução de taxa de imposto é a solução ideal para a manutenção e/ou reforço do rendimento disponível.

Redução da Taxa de Imposto para salários mais elevados

Porém, o que se vê é a redução da taxa de imposto para aqueles com salários mais elevados, e que ainda são compensados com um conjunto de subsídios, outros até duvidosos, que fogem descaradamente à tributação, designadamente, despesas de representação pessoal, quando há despesas de representação do gabinete; subsídio de comunicação, quando recebem gratuitamente impulsos de comunicação ilimitados; renda de casa, mesmo tendo suas casas próprias… (soube que os Titulares de Cargos Públicos quando viajam são pagos a totalidade dos gastos com estadias – alojamento, alimentação, transportes, bafas, e ainda recebem 100% de ajudas de custo. A ser verdade é uma imoralidade que ultrapassa todos os limites de um Estado de Direito).

Mas também a redução de taxa de imposto deve ser acompanhada da revisão dos “escalões” de rendimentos de remunerações, quer pela redistribuição equitativa dos “escalões”, quer  pelo reforço de tributação dos rendimentos mais elevados, permitindo assim a “equidade vertical”, quer ainda o aumento de número de “escalões” de rendimentos, reforçando a diminuição de tributação de classes média-baixa e baixa, e agravamento de tributação sobre rendimentos mais elevados, inclusive com possibilidade de sobretaxa (variando entre 2% a 5%) a partir de determinado montante de salários mais elevados.

“Reposição de gastos sociais”

Mesmo assim há que ter em conta a “reposição” de “gastos sociais” para categorias de rendimentos de classe média-baixa e baixa, “gastos sociais” esses com educação (É caricato falar de ensino gratuito, e isso até esta não se verifica. É por demais enganoso quando políticos com responsabilidades falam de “educação gratuita”, muito embora a existência de lei suporte. Isso sim constitui um exagerado “discurso populista” que deve ser sancionado por quem é responsável pela fiscalização da gestão pública. Pode até ser que haja “educação gratuita”, mas isso beneficia particularmente os dirigentes que usam viaturas do Estado, influenciam os Delegados Escolares, os distribuidores de vagas e bolsas de estudo, meios de comunicação, etc., tudo facilitado pelos cargos que exercem.

E o ensino/educação deve ser pago por quem tem condições para tal, sobretudo por aqueles que auferem melhores e maiores rendimentos na hierarquia do Estado, e nunca o contrário), incluindo transporte escolar, saúde, água/eletricidade, permitindo a esses que descontem na totalidade, e assim vincar o “Estado Social”.

Ainda, é de se incluir na “base de tributação” as remunerações em espécie e/ou em meios monetários, atribuídos a título de subsídios de diversas formas, como sejam comunicações, rendas de casa, despesas de representação pessoal, os “brindes” diversos recebidos no quadro de visita oficial e apossados, isenções aduaneiras, etc., tudo atribuídos a determinadas classes profissionais, sobretudo pelo exercícios de cargos políticos e/ou públicos, dirigentes de administração pública direta, indireta, central e local, magistrados, autoridades diversas, rendimentos esses que vêm escapando à tributação, muito embora a própria CR determinar, e como forma de moralizar a própria Sociedade.

Repensar pensão social

Quanto às “camadas vulneráveis” sujeitas ao subsídio/pensão social, pelo pouco que recebem e duma forma injuriosa, pelo aumento exponencial dos preços dos bens essenciais, seria de toda a conveniência repensar a forma de remuneração – será que o Estado não poderia assumir os impostos com a criação de um “sistema cabaz” para uma parte dessa remuneração? Quanto à água/eletricidade, quem deveria assumir os gastos? Note-se com o pouco que essas pessoas recebem em meios monetários e nem chega para sustentá-las até à próxima remuneração, e ainda suportam impostos e demais gastos sociais que deveriam ser suportados pelo Estado.

Fundo de Solidariedade Social

Estive a ouvir o debate no Par<a>lamento sobre a criação do Fundo de Solidariedade Social (FSS). Senti-me, e penso que todos os cabo-verdianos que ouviram aquele debate, em particular, se sentiram dececionados. Sabemos que é moda criar Fundos, hoje em dia, em Cabo Verde. Mas nunca se deve brincar com a “pobreza”. É certo que aos Turistas é criada a condição, paga pelo impostos, para acederem a uma prestação um serviço turístico adequado, daí se chamarem turistas. É normal cobrar uma taxa pela contraprestação de condições criadas para os turistas terem serviços que almejam de forma a fazê-los retornar. Agora fazer generalizar essa taxa para os Nacionais que deslocam em serviço, ou demais pessoas que se deslocam sem ser em serviço, inclusive doentes e acompanhantes, e que alojam em Hotéis é caricato.

Outrossim, se para os Turistas é uma taxa a cobrar para usufruírem de condições criadas para tal, já para as restantes pessoas que se deslocam, isso já jamais será uma taxa, mas outra coisa, quiçá imposto.

O presidente do PAICV ofereceu que se lhe descontasse 1.000$00 no seu salário para reverter para esse fundo. Entende-se como sendo brincadeira de mau gosto que nunca deveria acontecer. Mas também essa “proposta”, que tem no seu fundo um verdadeiro argumento para solidariedade social, bem poderia vincar-se, mas de seguinte forma: (1) Por que não todos os par<a>mentares não oferecem 10% dos seus salários para constituir esse FSS? (2) Por que não a todo o pessoal que exerce cargo público/político, a começar pelo Sr. Presidente da República? (3) Por que não abrangente a todo pessoal dirigente da administração pública? (4) E se os deputados e todo pessoal que exerce cargo político abdicar de certos subsídios, como sejam de comunicação, de representação, de renda de casa, ajudas de custos para visitarem os seus círculos nos fins de semana, entre outros, e esses verbas reverterem para esse FSS? A ver vamos, pelo espírito de solidariedade que tanto os nossos políticos falam.

Bem devia ser uma proposta que o meu amigo lance no par<a>lamento, proposta essa que caia bem a todos, e como têm a maioria seria aprovada, e jamais seria um discurso populista… Note-se que no sistema como o nosso quem tem menor poder de compra é impossível fugir aos impostos, quer sejam empresas quer sejam pessoas singulares ou físicas. I.e., qualquer rendimento desviado retorna ao mercado para consumo de bens ou serviços. E se se desviar rendimentos de tributação direta cai-se na tributação indireta. Pelo que só há desvio efetivo, ou seja fuga aos impostos quando o beneficiário tem capacidade de fazer poupança de origem duvidosa (direta nas Instituições Financeiras Local ou Externa, ou indireta, através de aquisição de bens e serviços, com manifestação de exteriorização de riquezas, sem utilizar os rendimentos declarados) …

cesargarcia19@gmail.com

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 796, de 01 de Dezembro de 2022

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