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Cultura

Livros para ler em 2023

Ler mais livros costuma estar entre os desejos de muitas pessoas, sobretudo como meta no arranque de um novo ano. Entre os amantes da leitura, uns têm já uma lista feita e outros ainda não sabem por onde começar. Figuras públicas e menos públicas aceitaram o repto do A NAÇÃO para apresentarem três livros que leram em 2022 e que recomendam para 2023. Ao todo são 18 livros para todos os gostos e géneros literários para aumentar a sua colecção.

Jorge Carlos Fonseca – Poeta, escritor, advogado e ex-Presidente da República 1. “Safras de um triste Outono”, de Arménio Vieira (Rosa de Porcelana)

Obra poética do Prémio Camões, Arménio Vieira, que reconfirma a maturidade de um autor cimeiro da literatura cabo-verdiana. Uma poesia de cariz universalista, sofisticada na sua linguagem e nos seus processos de construção, erudita e apelativa para quem pretenda mergulhar no que à criação literária cabe trazer: a emoção, o salto imaginativo, a beleza estética, afinal de contas, os ingredientes para estarmos preparados para lidar com as vicissitudes do mundo.

2. “Pessoa. Uma biografia”, de Richard Zenith (Quetzal)

Uma obra exaustiva, penetrante e que entusiasma quem aprecia e pretende conhecer melhor a multifacetada figura do génio Pessoa. A sua escrita, a sua plúrima personalidade, os seus caminhos e desvios, as suas loucuras. Uma obra cuja leitura exige fôlego, paixão pela literatura, vontade de navegar em mundos que, por vezes, nos escapam, outras vezes, nos seduzem, mesmo que silenciosamente.

3. “Uma teoria da democracia complexa”, de Daniel Innerarity (Bertrand)

Uma abordagem necessária para compreendermos hoje o fenómeno da democracia, a sua sofisticação, os seus meandros e instrumentos. Para nos inteirarmos da sua complexidade, enquanto sistema político, regime e conjunto de crenças e instituições. Uma obra que vale a pena conhecer, sobremaneira nestes tempos de sedução e apelos a receitas autocráticas e em que uma boa parte do mundo vive sob lideranças autocráticas e ditatoriais.

Uma obra também importante para vencermos certas receitas que, mesmo entre nós, aparecem em embrulhos luminosos mas em defesa de ideário, princípios e soluções antidemocráticos, melhor, que vão de encontro ao Estado de direito (veja-se, por exemplo, o que ouvimos e lemos sobre a “guerra da Ucrânia”, eufemismo para se referir a invasão e a ocupação russas do país soberano vizinho).

Nuno Andrade Ferreira – Jornalista 1. “A Geração da Utopia” de Pepetela (Dom Quixote)

A Geração da Utopia  é um livro editado originalmente há mais de duas décadas, que tem conhecido sucessivas reedições e que me chegou às mãos no ano passado. Pepetela está na minha lista de escritores de língua portuguesa de eleição. Em A Geração da Utopia percorrem-se os caminhos da luta de libertação de Angola, desde as primeiras movimentações políticas e militares ao pós-independência. É um retrato muito próprio, com muita paixão, mas também grande sentido crítico. É um livro de sonhos, ilusões e desilusões.

2. “Silêncio” de Susan Cain (Temas e Debates, 2022)

O livro de Susan Cain foi uma boa surpresa nos últimos dias de 2022, ano em que foi reeditado pela Temas e Debates (edição original de 2012). Comprei-o por acaso (e confesso que sem nele depositar grandes esperanças), levado por uma frase na capa: “o poder dos introvertidos num mundo que não para de falar”. A verdade é que foi uma leitura muito agradável sobre a importância do silêncio e dessa coisa tão rara que é o ‘saber ouvir’, num tempo em que toda a gente tem [sempre] alguma coisa a dizer.

3. “What is Freedom?” de Toby Buckle (Oxford University Press, 2021)

Conheci Toby Buckle através do seu Political Philosophy Podcast, que está na origem do livro. What is Freedom? reúne um conjunto de entrevistas a ativistas, filósofos e historiadores, à procura das multiplas dimensões (e reinterpretações) do conceito de liberdade. Mesmo quando faz incursões na história e na memória, a obra mantém a sua enorme atualidade. Pensar a liberdade é um exercício sempre oportuno, que ganha ainda mais relevância no atual contexto global.

Kika Freyre – Psicóloga e professora universitária

1. “As cinco feridas emocionais” de Lise Bourbeau (Sextante, 2017);

Este livro é um convite maravilhoso ao autoconhecimento através da identificação com os relatos da autora. Traz as marcas que a vida desenha em nós com os seus contornos individuais e as máscaras que utilizamos, muitas vezes sem dar-nos conta, para disfarçar o quanto estas marcas nos machucaram. Traz um olhar muito interessante sobre o perdão, propondo a liberdade sobre ele, mostrando-nos o caminho de compreender e que perdoar já é um outro serviço. Recomendo demais!

2. Noite escravocrata, madrugada camponesa-Cabo Verde Séc. XV – XVIII” de António Correia e Silva ( Rosa de Porcelana, 2022);

Esta leitura veio de uma busca identitária, social, emocional do meu encontro com Cabo Verde. É uma leitura cativante, inquietante ao trazer dados tão antigos e tão actuais. As tantas faces da violência assustadoramente tão repetidas e a clarificação de que a escravidão em si não foi a maior delas, mas o abandono, a frouxidão dos laços de família, as raízes dos desajustes tão contemporâneos já lá estavam nos antepassados todos. É uma leitura viva, pulsante, intrigante. Traz a força da mulher de uma forma tão honesta na história, sem deslumbramento. Dá orgulho! Todo cabo-verdiano deveria ler este livro em algum momento da sua vida.

3. “Você aguenta ser feliz?” de Arthur Guerra e Nizan Guanaes (Sextante, 2022);

Este é um diálogo de pensamentos e palavras, perspectivas e indagações entre o Psiquiatra Arthur e seu Cliente Nizan. Uma leitura que sacode a gente, que traz para o nosso estilo de vida grande responsabilidade para com a nossa saúde e o processo de adoecer. É aquele livro que a cada capítulo a gente pensa: esse foi escrito para mim, tamanha inevitabilidade das identificações. Não é um livro sobre doença, é sobre saúde, caminhada, vida, maratona. No meio da nossa vida corrida, é um convite a correr de sapatilhas, ao nosso favor, com o olhar questionado sobre se aguentamos ser felizes.

Eurídice Monteiro – Escritora e secretária do Estado do Ensino Superior

1. “Ao encontro de Espinosa” de António Damásio;

Neurologista e neurocientista, o português António Damásio tem se dedicado à ciência do cérebro, estudando os processos cerebrais subjacentes às emoções, aos sentimentos e à consciência. Neste livro, resgata a personagem histórica e ideias de Espinosa para mostrar novos progressos na neurociência. A velha dicotomia entre emoção e razão, com António Damásio, ganham novas leituras.

2.“Orgulho e Preconceito” de Jane Austen;

Romance emblemático da afamada escritora britânica. É um clássico da literatura universal, reeditado em várias línguas e alvo de adaptações para a sétima arte. Trata-se de uma narrativa de confrontos sociais e de sociabilidades distintas, onde o orgulho social e o desprezo social se confrontam. Um retrato social sobre atitudes humanas e a representação social. Foi escrito quando a autora ainda tinha 21 anos de idade.

3.“A Promised Land” de Obama;

O antigo presidente norte-americano conta, em primeira pessoa, a improvável caminhada dele, primeiramente em busca das suas origens e depois à liderança mundial. O rigor nos factos e datas, as emoções e racionalidade, a minúcia e a astúcia, a sagacidade e a bondade, fazem de Obama, além de um político hábil, um cultor das palavras. De um simples aspirante, ele se tornou uma figura do nosso tempo, que o mundo não se olvidará.

Kévin Tavares – Formado em Relações Internacionais e Diplomacia

1. “Raízes Brancas” de Bernardine Evaristo (Elsinore, 2021);

É um livro que aborda o acontecimento que culminou no maior genocídio na história da humanidade: a escravização dos povos africanos. porém, este romance tece as suas tramas no sentido inverso da realidade, ou seja, neste trabalho ficcionado, o preto africano é o senhor, enquanto que o branco escravo é o europeu. Este é um livro que vai deixar uma sensação de vazio no leitor após a última página, apesar das atrocidades com que vamos nos deparar durante a sua leitura.

2. “Vidas Seguintes” de Abdulrazak Gurnah (Cavalo de Ferro, 2022);

Esta obra do Nobel da literatura 2021 está entre as minhas melhores leituras de 2022 por ser um livro que retrata a colonização alemã naquela parte de África que durante o período colonial ficou conhecida como África Oriental Alemã. é um livro de história só que ficcionado. Só os predestinados nasceram com a mestria do Abdulrazak Gurnah.

3. “O Alegre Canto da Perdiz” de Paulina Chiziane (Caminho, 2008);

Este livro aborda a questão da raça, das sequelas deixadas pelo colonialismo, a subjugação dos africanos, a desumanização, entre tantos outros males que ainda nós enquanto africanos herdamos dos 500 anos de colonização. Chiziane é uma escritora que romanceia as suas histórias de forma poética e eu gosto.

Daniel Medina – Poeta, escritor e professor universitário

1. “O Homem de Constantinopla” de José Rodrigues dos Santos (Gradiva);

É um livro que mistura ficção com história, espionagem, intrigas, etc. Permite aos leitores conhecer a história das histórias, portanto aprendemos imensas coisas com ele. A sua capacidade narrativa cativa muito e nos transporta para outras culturas. Esta obra ajuda-nos a perceber intrigas palacianas com mistura de aspectos relacionais dos seres humanos.

2. “Noite de Vento” de António Aurélio Gonçalves;

Assim como um bom filme, um bom livro cativa mais na segunda leitura. Foi muito bom reler, em 2022, o livro “Noites de Vento” de António Aurélio Gonçalves que faz um retrato da sociedade mindelense de uma forma extraordinária. Permite perceber os rudimentos da sociedade mindelense em aspectos sociais e políticos com uma capacidade narrativa conseguida, em Cabo Verde por poucos.

3. “A Cegueira” de José Saramago (Porto Editora);

Nesta obra, José Saramago com a sua perspicácia habitual direciona-nos para uma análise da sociedade em que ele vai mostrar-nos com muita lucidez como nós entramos pelo caminho, pelos trilhos da cegueira em termos de ideologias, de relações sociais e muitas vezes até mesmo em termos psíquicos. Ele demonstra que ‘nós estamos de olhos abertos mas que estamos a fazer outras coisas por questão de alienação’.

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 801, de 05 de Janeiro de 2022

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