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Economia

Victor Fidalgo defende que a taxa turística seja mais bem aplicada em 2023

O economista e consultor turístico Victor Fidalgo prognostica boas perspectivas para o sector em 2023, especialmente no produto Sol & Mar, Sal e Boa Vista. Adverte, contudo, para a imperiosa necessidade de se qualificar as ofertas para que os turistas possam sair dos hotéis, conhecer Cabo Verde e consumir. Igualmente, alerta para o velho problema dos transportes internos, e apela a um melhor uso da taxa turística.

“Vai ser um bom ano porque o fluxo vai aumentar de certeza, não só no Sal, mas também na Boa Vista”, estas são as perspectivas de Victor Fidalgo, economista e consultor turístico, para o sector em 2023, em Cabo Verde.

Conforme refere, especialmente na Boa Vista, o ritmo de crescimento deve aumentar se “a TUI conseguir retomar a construção do seu hotel (TUI Magic Life) que vai ter cerca de 1300 a 1400 camas”.

A Boa Vista, que como defende, tem um “problema”, é que, enquanto no Sal já está “mais ou menos organizado” em termos das infraestruturas de ofertas complementares, que já existem e estão a funcionar, a ilha das dunas ainda não conseguiu isso.

“Portanto, há que repensar a qualidade que se quer oferecer, do que se deve oferecer para incitar o turista a consumir. Porque o turista também não vai pagar para andar à toa, só vai sair e consumir se houver uma oferta, o que na Boa Vista é muito pouco. Não podemos pretender que o turista saia, assim, para fazer o quê? Ver o quê? Vai ver as obras na Praça ou vai ver aí o bairro da Boa Esperança?”, questiona.

Sol & mar por “excelência”

Instado se iremos continuar nesta concentração do produto sol & mar, que representa mais de 90% do turismo no país, o nosso interlocutor, garante que, para já não há outra saída e questiona o que é que temos mais para oferecer?

“Acha que os turistas, as centenas de milhares de turistas que vêm da Europa, o que os traz aqui é sol e praia, se quisessem nem viriam, ficariam lá e iriam para a Noruega, Islândia e Suécia, etc. Os que vêm para o Sul, para as Caraíbas, vão até para o Oceano Indico e vêm para as Canárias mas, particularmente, Cabo Verde, que tem melhor clima que as Canárias nessa época do ano, é sol e praia que eles querem! E nós não temos outra coisa para oferecer, não”.

Contudo, defende que é preciso melhorar o ambiente envolvente afecto aos hotéis para que, além de sol e praia, o turista possa fazer um passeio num lugar “adequado e interessante”, à tarde, etc. “Devemos criar esses pontos de interesse, de relevância, para complementar a oferta básica. Mas o nosso turismo, queiramos ou não, é sol e praia e vai ser sol e praia, independente de desenvolvermos outros segmentos, que serão não alternativos, mas complementares”, argumenta.

Conforme perspectiva Sal, Boa Vista e, talvez, “num futuro próximo”, São Vicente, é que vão ser os destinos turísticos, “por excelência”, de Cabo Verde onde há sol e praia, em oferta.

Até porque, como observa, os transportes internos não permitem a circulação de turistas, para beneficiar outras ilhas. “Mesmo os cabo-verdianos não podem circular livremente, como querem, entre as ilhas… O problema de transporte é que não há nem para nós cabo-verdianos, e muito menos ainda para os turistas, não há!”

Taxa turística mais bem aplicada em 2023

O entrevistado ao A NAÇÃO questiona ainda o uso da taxa turística, que na sua óptica, não tem sido aplicada como devia, esperando que em 2023 o cenário mude. Até porque, como argumenta, o aumento de 50 cêntimos, além de ser pouco, não é o cerne da questão.

“Não é a questão do aumento, o problema é o que se faz com o dinheiro da taxa turística e, infelizmente, ela (taxa turística) ainda não está muito concentrada em investimentos que levam à melhoria do destino turístico. A taxa turística devia, tal como aquando da sua concepção, em 2013, servir para investir, para melhorar o destino turístico…”

Ademais, na sua óptica, as autoridades do sector deveriam focar na promoção do relançamento do destino no mercado, o que não tem acontecido.

“A retoma, no caso de Cabo Verde, está a processar-se bastante bem, nem tanto por mérito (das autoridades, mas por necessidade que o mercado emissor tem de encontrar um outro destino mais disponível e mais perto para poder mandar os seus clientes”, explica.

Até porque, como analisa, Cabo Verde “tem pouca capacidade de receber turistas”, pois são “milhões e milhões” no mundo e nós recebemos, mesmo no auge em 2019, apenas 819 mil turistas, o que, “portanto, não é nada por aí além”.

Este aproximar das cifras de 2019, reitera deve-se ao facto de o mercado estar a reagir “positivamente”, o que, na sua óptica, a taxa turística é “mera consequência do fluxo turístico”.

Carência de infraestruturas e melhorias

“Ainda recentemente vi o pessoal com uma certa ‘basofaria’ a dizer que a taxa turística arrecadada ultrapassou o previsto. Isto quer dizer que a previsão foi mal feita, portanto são frases que não se devem dizer, porque isso até alimenta a ganância de muitos…”, lamenta.

Nesse contexto reitera a necessidade de em 2023 se aplicar bem a taxa turística, onde é prioritário em termos de fluxo. “Basta ver o que vemos na ilha do Sal, a nossa capital turística, onde se recebe o maior número de turistas, e vamos ver lá que há carência grande de melhorias e investimentos. Mesmo na Avenida dos Hotéis, temos o passeio que, há tempos, chamei atenção para isso, o passeio, as praias não são bem cuidadas, nem bem geridas e certos pontos também não estão tão bem qualificados”, exemplifica.

Quanto à Boa Vista, os problemas são diversos e devem ser mitigados em 2023. “A tal chamada praça aí no centro de Sal Rei, há anos, quer dizer é mais fácil, se calhar, construir o canal da Mancha ligando França e Inglaterra que reconstruir uma simples praça aí na Boa Vista”, critica.

“Alguma coisa está mal e não há responsabilização de ninguém, não há! O drama é que há incompetências claras e incapacidade clara em esbanjar fundos públicos mas não há consequências, não há responsabilização”, lamenta.

Falta de visão e não de quezílias políticas

Nesta ilha com grande potencial, Victor Fidalgo lamenta que continue a ser prejudicada por falta de visão e de gente capacitada. “A Boa Vista, em termos de estruturas, não tem nada, ainda não se fez nada, e nem é um problema de dizer que é a Câmara é ou não da mesma cor política do Governo. Repare, Boa Vista, de 2000 a 2020, vinte anos, foi gerida por autarcas do MpD, e só agora, em 2021, é que passou um autarca da família do PAICV”.

Portanto, prossegue, não é um problema da família política, como muitos advogam, mas tem a ver com o problema da capacidade das pessoas em fazerem as “coisas adequadas”

“Não tem nada haver com política, porque Sal teve durante todo o tempo autarquia da família do MpD e o Governo era PAICV mas desenvolveu-se. Portanto, não podemos reduzir essas coisas a problema de politiquice entre câmara do PAICV e câmara do MpD, é capacidade, visão, conhecimento das pessoas nas várias áreas em que estão, ou que devem fazer algo para melhorar o cômputo global do produto turístico cabo-verdiano, quer no caso da Boavista ou qualquer outra ilha que estivermos a analisar”, desmistifica.

Fluxo vai aumentar, mesmo assim, para a Boa Vista

No entanto, acredita que, mesmo assim, com falta de estruturas urbanas qualificadas, Boa Vista deverá receber mais voos e turistas em 2023, com a reabertura do Karamboa.

“Durante muito tempo, um grande receptor de turistas, que era ao RIU Karamboa estava em obras, e abriu em Outubro passado, e estará cheio. Os hotéis do RIU em geral, estarão cheios, sem problema nenhum, porque funcionam bem, têm um alto grau de organização profissional desde a distribuição, operador e o hoteleiro”, perspectiva.

Até porque, como finaliza, para haver Turismo não basta ter hotéis. “É toda uma cadeia que tem que estar organizada para funcionar como deve ser, por isso tenho a certeza que a partir de agora, já o fluxo para Boa Vista vai aumentar. E sei também que a TIU que é o operador ou distribuidor por excelência para Cabo Verde, que tem o seu hotel no Sal, está a trabalhar para retomar a construção do hotel que iniciou na Boavista, em 2019”.

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 801, de 05 de Janeiro de 2022

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