Completa hoje, 13 Outubro, oito anos da morte de José Lopes Cabral, mais conhecido por Zezito Denti d’Oru. Depois de todo esse tempo, Adelino Semedo (Ady), tido como principal testemunha desse homicídio perpetrado, alegadamente, por elementos da PJ, foi ouvido pelo FBI, nos Estados Unidos da América (EUA). Os familiares da vítima clamam justiça e uma indemnização para os filhos de Zezito. Já o Ministério Público informa, por seu lado, que “brevemente” haverá um despacho sobre o caso.
Adelino Lopes (Ady), única testemunha da morte violenta de Zezito Denti D’Oru, em Outubro de 2014, por agentes da Polícia Judiciária, na Cidadela, revelou ao A NAÇÃO que, no passado mês de Fevereiro, foi ouvido por agentes do FBI (Federal Bureau of Investigation) dos EUA, no âmbito do processo relacionado com o homicídio violento de Zezito Denti D’Oru, que corre os seus trâmites há oito anos na Procuradoria Geral da República (PGR), em Cabo Verde.
“Os agentes do FBI vieram ouvir-me na minha casa nos EUA, a mando do procurador Ary Varela, que, na altura, coordenava as investigações desse processo. Os agentes do FBI quiseram saber tudo o que aconteceu naquela noite. E, depois de recolherem as minhas declarações, garantiram que iriam encaminhar o meu depoimento para esse procurador que estava com o processo”.
Este, que é tido como principal testemunha do caso, avança ainda que, mais tarde, ficou a saber que o seu depoimento tinha sido enviado a Cabo Verde. Ady diz, no entanto, que desde aquela altura nunca mais foi contactado por nenhuma autoridade judicial cabo-verdiana.
“Fico com a sensação que o Governo e as demais autoridades cabo-verdianas querem fechar os olhos em relação ao caso da morte de Zezito”, realçou ao A NAÇÃO.
Ary, que estava na viatura onde Zezito Denti D’Oru foi baleado, promete continuar a lutar para que esse homicídio não seja esquecido. “Este caso não pode cair no esquecimento. Queremos que a justiça seja feita caso contrário avançaremos com um processo contra o Estado de Cabo Verde”, avisa.
Familiares clamam justiça
Já Edna Cabral (irmã da vítima) mostra-se pouco optimista em relação à justiça. “Já se passaram oito anos e ainda as autoridades não resolveram o caso do assassinato do meu irmão. E, da forma que estão a agir, tudo indica que não querem fazer justiça. E como a família de Zezito vive no estrageiro torna-se mais complicado lutar para que esse caso não caia no esquecimento. Mormente em África onde há muita corrupção”, desabafa.
Edna Cabral avança ainda que o advogado está a cuidar do caso em Cabo Verde. “Queremos que os responsáveis pelo assassinato do meu irmão sejam responsabilizados e que paguem indemnização para os três filhos dois dos quais menores”, reivindica.
Por seu lado, Carla da Veiga, mãe da filha de Zezito Denti D’Ouro, residente na Holanda, confessa que o sentimento é de tristeza e revolta por causa da sensação de injustiça. “já se passaram oito anos e ainda nem sequer há um arguido constituído. As provas que mataram um inocente de forma bárbara estão claras e sobre a mesa. Assim como quem são os principais responsáveis pelo assassinato de Zezito”, acusa.
Conforme Carla, se as autoridades cabo-verdianas tivessem alguma suspeita contra Zezito em relação à morte da mãe inspectora deveriam prendê-lo e investigar e não o matar, tendo em conta que ele estava desarmado e nem sequer apresentou resistência, segundo quem testemunhou o ocorrido.
Carla conta ainda que na altura da ocorrência a sua filha, que era muito ligada ao pai, tinha apenas quatro anos. “Praticamente as nossas vidas ficaram destruídas. A minha filha cresceu a perguntar pelo pai e fiquei sem saber como explicá-la o que realmente aconteceu. Ela já tem 12 anos, e tem a fotografia do pai espalhada pelo quarto. E pede que a justiça seja feita” desabafa.
Por isso, Carla assegura que mantém a esperança na justiça. “Queremos que os responsáveis sejam condenados e que paguem as devidas indemnizações aos filhos pelos danos causados’’, sublinha.
MP informa que “brevemente” será encerrada a instrução do caso Zezito Denti d’Oru
O Ministério Público vai “brevemente” emitir o despacho de “encerramento da instrução” do caso do homicídio de José Lopes Cabral, vulgo Zezito Denti d’Oru, emigrante na Holanda, abatido por agentes da Polícia Judiciária, na Praia, faz agora oito anos.
Foi de forma lacónica que a Procuradoria Geral da República respondeu às perguntas do A NAÇÃO, enviadas por email, relativas ao estado em que se encontra o caso “Zezito Denti d’Oru”, ocorrido na noite de 13 de Outubro de 2014, na Cidadela. Uma operação executada por agentes da PJ, capitaneados então por Paulo Rocha, director-nacional-adjunto dessa corporação e desde 2016 ministro da Administração Interna.
Tirando a referida revelação, as nossas perguntas ficaram sem resposta, por parte do Procurador Geral da República, Luís José Landim, com o argumento de que “brevemente será emitido o despacho de encerramento da instrução relativamente ao referido processo, pelo que, tornando-se público, poderá ser consultado nos termos da lei processual penal”.
De referir que no início deste ano, em Fevereiro, o MP resolveu perseguir e enquadrar judicialmente este jornal, bem como o site Santiago Magazine e os seus jornalistas, por terem publicado partes do processo, que considerou estarem ao abrigo do segredo de justiça.
Depois da celeuma provocada, este caso voltou ao silêncio, completando-se agora oito anos da operação e circunstâncias que ditaram a morte de Zezito Denti d’Oru, por agentes da Polícia Judiciária, em condições consideradas anómalas e violadoras da lei.
Aliás, no seu questionário enviado ao Ministério Público, A NAÇÃO tentou saber se os agentes implicados já foram constituídos arguidos no âmbito desse processo, ou se outras testemunhas foram ou não ouvidas. À semelhança, por exemplo, daquilo que foi feito, nos EUA, pelo FBI.
Um incómodo para Paulo Rocha
Desta vez, no seu contacto com A NAÇÃO, Ady não se pronunciou sobre os factos, mas na edição 751 deste Jornal, de 20 de Janeiro, ou seja, antes de ser ouvido pelo FBI, tinha relatado como é que esse crime de homicídio ocorreu no dia 13 de Outubro de 2014, no bairro de Cidadela, na cidade da Praia.
Na altura, não só fez uma crónica daquilo que se passou naquela noite, na Cidadela e que culminou no “assassinato” de Zezito Denti D’Oru, por agentes da PJ, como reafirmava que a operação foi comandada pelo então director nacional adjunto dessa corporação, Paulo Rocha, que “estava no local do crime”.
Ady também tinha afirmado, na ocasião, que depois de terem executado Zezito Denti D’Oru, ele foi conduzido à sede da PJ onde encontrou um ambiente de festa, de regozijo geral. “Estavam todos a comemorar, entre risos e abraços, na presença de Carlos Reis e Paulo Rocha”, respectivamente, diretor nacional e diretor nacional da PJ.
Perguntado, mais uma vez, no passado mês de Janeiro, se Paulo Rocha esteve no local do crime, Ady foi perentório: “Claro que ele estava lá!”
Disse ainda que sabia o nome de alguns elementos da PJ que estiveram na operação e que podia reconhecer os outros. Citou os nomes de Natalino, Carlos Almada, César, como integrantes da equipa que efectuou os disparos, entre outros. “Fiz questão de fixá-los para poder ficar precavido em caso de outras acções do tipo”, confesso, já que, à semelhança de Zezito, chegou a temer pela sua vida.
Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 789, de 13 de Outubro de 2022