Nos últimos meses os preços dos bens de consumo essenciais têm sofrido constantes alterações, a maioria no sentido crescente. Em Setembro, conforme os cálculos da ADECO, um adulto saudável em São Vicente precisava de 20.606 escudos para o consumo essencial em 30 dias. A realidade é dramática para quem aufere um salário mínimo de 13 mil escudos.
Numa ronda junto de alguns operadores no ramo de produtos de consumo essenciais, na Cidade da Praia, A NAÇÃO pôde constatar que os preços andam em constante alteração, estando alguns produtos a baixar o valor no mercado, mas a maioria ainda permanece no sentido crescente. São os casos do arroz, farinha, leite, frango, feijões e enlatados.
De acordo com um importador, há dois meses um saco de açúcar custava 3600 escudos. O valor passou agora a 4 mil escudos. Na mesma linha, um saco de arroz, de 25 kg, que custava 1700 escudos, está agora a ser vendido por 2100,00. A farinha de trigo seguiu o mesmo caminho, passando um saco de 25 kg de 1425 escudos, para 1750.
Enlatados como grãos e outros alimentos aumentaram o valor, diz a nossa fonte, por causa do aumento, no mercado internacional, do preço das embalagens, transportes, etc.
No que diz respeito ao leite, da última vez que compraram estava a cerca de 0.66 euros, ou seja, 72 escudos. Neste momento o valor subiu para 0,76 euros, quase 83 escudos, isto, da marca mais barata, que costumava custar, em Cabo Verde, à volta de 70 escudos/litro. O leite Mimosa, por exemplo, que costumava custar entre 95 e 100 escudos, está neste momento a ser vendido por 110 escudos.
A margarina para culinária aumentou em cerca de 40%, assim como outras manteigas. Por outro lado, diz, os óleos e azeites baixaram ligeiramente em relação aos preços praticados nos últimos meses.
Realmente, num minimercado, A NAÇÃO constatou que, no caso do óleo, que chegou a ultrapassar os 350 escudos nos últimos meses, o valor já se encontra em 255 escudos.
Já no caso do frango, a carne mais acessível às famílias, o valor por kg está nos 350 escudos, quando costumava custar entre 195 e 220 escudos, um aumento considerável para o bolso nacional.
As leguminosas, como feijões secos, também estão mais encarecidas, chegando a ultrapassar os 200 escudos por embalagem.
Para além da subida de preços, as nossas fontes relatam a falta de muitas mercadorias no mercado internacional para aquisição. É o caso, por exemplo, da batata pré-frita, leite condensado, farinha, entre outros.
Para além dos produtos importados, os produtos nacionais, como verduras, legumes e frutas, também estão mais caros.
Nos minimercados, um kg de tomate, por exemplo, ronda os 300 escudos, quando, em algumas épocas, se encontra por 60 a 80 escudos. As verduras, de forma geral, tiveram os preços quase que triplicados.
20 mil escudos para um adulto saudável
De acordo com o Índice de Consumo Essencial (ICE) da Associação para a Defesa do Consumidor (ADECO), em Setembro, o consumo mínimo básico de um adulto saudável em um mês, em São Vicente, era de 20.606 escudos.
Tendo em conta o salário mínimo nacional, de 13 mil escudos, a ADECO aponta um défice de cerca de 7 mil escudos do salário mínimo para o ICE, o que significa que cerca de 37% das necessidades de consumo de uma pessoa adulta não podem ser atendidas.
“Um verdadeiro drama de sobrevivência”, sublinha a associação, tendo em conta a satisfação das necessidades básicas de um assalariado com remuneração mínima.
“Se o cenário é que este assalariado tem de sustentar outros membros da família, o drama ainda é mais severo”, atenta.
Condições mínimas
De notar que o ICE calcula o valor mínimo necessário para responder as necessidades básicas, tendo em conta variáveis como a alimentação, eletricidade, água, gás butano, comunicação e habitação.
No que toca a habitação, toma por base o valor de cinco mil escudos pata arrendamento de um T0 (quarto com banheiro), para a realidade da ilha de São Vicente.
Em outras ilhas, como Sal, Boa Vista e também na Cidade da Praia (Santiago), onde o custo de vida é manifestamente mais elevado, este valor não se aplica.
Mesmo com aumento do salário mínimo défice continuará grande
Questionada sobre o impacto que o anunciado aumento do salário mínimo nacional deve conhecer em 2023, para 14 mil escudos, conforme anunciou o Governo, a ADECO diz que qualquer esforço governamental em aumentar o valor é sempre bem-vindo, mas reconhece que o défice continuará grande, na ordem dos 6.606 escudos, caso os valores dos produtos não caírem.
“O ICE, indicador criado pela ADECO, para além de ser uma ferramenta importante de monitoramento da evolução de preços em Cabo Verde, tem uma função social de comparar o salário mínimo nacional com o ICE. O salário mínimo que agora se aumenta para 14 mil escudos irá diminuir um pouco este grande desfasamento entre o rendimento mínimo e o consumo mínimo (ICE) mas o défice continuará grande, na ordem dos 6.606 escudos”, explicou.
Claramente, defende, o país terá de fazer um esforço ainda maior no sentido de adotar um salário mínimo “mais condigno” com a condição e necessidade humana.
Preços vão permanecer elevados até final do ano
De acordo com previsões do Governo, o ano de 2022 deve terminar com um aumento médio global de quase 8%. Entretanto, o valor deve reduzir para menos de 4% no próximo ano, conforme consta da proposta de Orçamento de Estado para 2023.
“Os níveis de preços deverão permanecer elevados, acelerando de 1,9% em 2021 para 7,9% em 2022”, prevê os documentos de suporte da referida proposta.
Os produtos alimentares e as bebidas alcoólicas são referenciados como a classe de bens e serviços que mais sofreram o crescimento dos preços, representando um risco para a segurança alimentar, sobretudo para as famílias de menor rendimento.
Segue-se a habitação, a água, eletricidade, gás butano e outros combustíveis e os transportes.
O Governo reconhece, na proposta, que o poder de compra dos agentes económicos será altamente afectado, o que exige uma maior intervenção do Estado, no sentido de garantir o equilíbrio social.
Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 789, de 13 de Outubro de 2022