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Economia

 Marcos Rodrigues: “Cabo Verde deve assumir a ligação entre as ilhas e abandonar os transportes internacionais”

O Estado de Cabo Verde deve assumir e focar exclusivamente nos transportes aéreos internos, através de uma companhia pública nacional, com capacidade, e abandonar definitivamente os transportes internacionais, defende o presidente da Câmara de Comércio de Sotavento. O negócio, por enquanto, não é viável para operadores privados”.

A Câmara de Comércio de Sotavento (CCS) vê com “alguma preocupação” a situação dos transportes aéreos, pelos problemas ainda por resolver no que toca à conectividade entre as ilhas.

Em entrevista ao A NAÇÃO, Marcos Rodrigues traça um quadro “preocupante” do que se tem assistido nos últimos dias, com interrupções nas ligações aéreas entre as ilhas, e defende que “é preciso investir seriamente” e encontrar uma solução definitiva para o problema.

 “Há mais de 15 anos que eu defendo para Cabo Verde um modelo de transportes aéreos internos, que seja um serviço assegurado pelo Governo, e que consiga ligar todas as ilhas, sem exceção”, defende Rodrigues, para quem o Estado deve fazer um investimento sério neste sector e “abandonar definitivamente” os transportes internacionais.

Para o presidente da CCS, assegurar a ligação entre as ilhas é “um exercício muito complicado e complexo”, que os operadores privados, por enquanto, não têm condições suficientes de assegurar, a não ser através dos subsídios que os governos dão, para poderem fazer esse trabalho.

 “Por enquanto não é viável. E é por isso que eu continuo a dizer que deveria ser um serviço garantido pelo Estado cabo-verdiano. Uma companhia aérea pública, mas com capacidade. Em vez de investirmos em duas companhias aéreas, uma interna e outra externa, abandonarmos a externa e fixarmos só e apenas na questão interna, colocar os recursos nas questões internas e motivar as grandes companhias internacionais a fazerem Cabo Verde na operação internacional”, explicou, indicando que, para isso, é necessário criar incentivos e taxas aeroportuárias mais apelativas e convidativas.

Equilíbrio custo/lucro

Na sua perspectiva, depois de os transportes aéreos internacionais e a demanda do turismo aumentar substancialmente, haveria, sim, condições do Governo vender a companhia nacional de transportes aéreos inter-ilhas a um operador privado, já enquanto uma empresa sustentável. “Nessa altura teríamos resolvido o problema do breakeven (equilíbrio entre lucro e custos operacionais) da companhia e dos resultados positivos da companhia interna”, prevê.

Enquanto defensor do sector privado, Rodrigues atenta que, neste negócio, ou o Governo está disposto a dar-lhe todas as condições necessárias para poder fazer aquilo que o país precisa, ou então o operador privado “terá que fazer uma coisa que qualquer indivíduo que tenha negócios tem que fazer”, que é maximizar as suas operações e tentar encontrar resultados dentro das operações que têm.

 “De outra forma será impossível. Por isso é que defendo que, temporariamente, o Estado de Cabo Verde deveria assumir a operação interna, com mais aparelhos, intensificar essa operação de ligações inter-ilhas e deixar a operação externa. Teríamos a distribuição interna assegurada, o Estado poderia sair e vender a companhia com resultados positivos”, reforça.

Fazer os investimentos certos

Reconhecendo que o país é pobre e tem limitações a nível de investimentos, Marcos Rodrigues diz que, não tendo recursos suficientes, é preciso geri-los com eficiência, colocá-los nos sítios certos e encontrar soluções viáveis para esses investimentos.

“Fazer investimentos que têm retorno, que asseguram também o desenvolvimento. Porque há investimentos que não tem retorno a curto prazo, mas poderão ter resultados a médio e longo prazo”, precisa.

Neste sentido, defende uma análise criteriosa das prioridades, sendo certo que, conforme diz, não se pode investir em todas as frentes nem responder a todos os problemas e reclamações.

Ambiente de negócio minado pela falta de conectividade

No seio dos associados da Câmara de Comércio de Sotavento, diz Marcos Rodrigues, há muita manifestação de preocupação em relação à questão dos transportes aéreos, que não envolve só o transporte de pessoas, mas também de alguma mercadoria, que encontra problemas graves para poder chegar ao destino.

Conforme disse, não há segurança em viajar de uma ilha para outra, pois não há garantia de ligações.

“Se eu quiser amanhã viajar para uma ilha qualquer terei dificuldade em encontrar o lugar disponível. O que quer dizer que não há realmente, por enquanto, a segurança de que podemos viajar entre as ilhas com a operação aérea garantida», indica.

Essa preocupação, conforme disse, tem sido manifestada pelos empresários associados da CCS,que precisam dos transportes para andar de um lado para outro, precisam visitar os clientes, e o transporte aéreo é que mais é utilizado nessas circunstâncias, por uma questão de gestão do tempo.

 “Isso impacta fortemente o desenvolvimento. Não termos a segurança dos transportes aéreos internos, a circulação de pessoas e de bens está comprometida logo a partida. E com essa situação, não é possível gerar riqueza a nível nacional, porque há incertezas”, sublinha.

Transportes internacionais: Concorrência, precisa-se

No que respeita às ligações internacionais, Marcos Rodrigues considera que Cabo Verde está melhor servido, pelo menos no que se refere à conectividade. O problema aqui é outro: o custo dessa conectividade.

 “Há realmente uma segurança de sair e de entrar, o problema está nos preços, o que é preciso também – e acho que está a ser feito alguma coisa – é atrair as companhias low cost para Cabo Verde, até para dinamizar a questão do turismo”, avançou.

O porta-voz dos empresários de Sotavento sublinha que os low cost trazem muita gente para os chamados fins de semana prolongados, que podem vir passar três, quatro dias em Cabo Verde e que deixam aqui bastante dinheiro.

Por isso, defende, Cabo Verde deve procurar alguma aproximação junto dessas companhias, fazê-los sentir que há oportunidades e que existe aqui um mercado promissor do ponto de vista turístico.

Isto porque, no seu entender, se essas companhias começarem a entrar em Cabo Verde, obrigam que a companhia que maioritariamente faz operação no país, que é a TAP, mexa nos seus preços.

 “Foi sempre assim. A TAP sempre que encontrou concorrência baixou os preços. Quando não tem concorrência é um monopólio e o monopólio produz os preços que nós conhecemos”, lembrou.

A solução para o problema dos preços passa por, segundo disse, criar um mix de entrada de outros operadores, com base em políticas de atratividade e que englobam as taxas aeroportuárias, impostos e um modelo que sirva para o desenvolvimento de Cabo Verde.

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 787, de 29 de Setembro de 2022

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