Por: Filinto Elisio
Esta manhã, por indecisa, ainda dormita na fronha das nuvens. O sol, ao seu primeiro rasgo, acaricia este domingo a ser orquestral. E a sua luz rasgando-lhe a seda…
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Repesco e repito o que escrevi a este dia, em 2019. Nesta toada:
A contenda foi natural e não veio grande mal ao mundo que houvesse. Antes pelo contrário, todos ganhámos um novo dia. Anti-natura ficasse tudo calado e acabrunhado, mantivéssemos nós quais “animais de capoeira”, aqueles versejados por Arménio Vieira, diante dos volteios e dos escolhos de tabelião. Saudável foi o grito de alerta, bonita (e necessária) a polémica aos mínimos sinais do preconceito. Consequente o frisson, quase tertúlia coletiva, de como o erótico na arte e sua abordagem estética recusam, pela essencialidade crítica, o obsceno e o pornográfico. A arte (mesmo a provocar, a desconcertar e a subverter) inquieta e educa. Convida e instiga ao pensamento crítico. Educa para as liberdades, educa a não sermos refratários da cena aberta e do espaço público. Enfim, foi bom este precedente de retenção do essencial, este afirmar a pulsão de Eros, na vida e na arte, nas antípodas das cintilâncias do inestético. E a vaga impressão (crentes à imanência do amor) que ganhámos todos um dia novo…
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(…)
Já é quase tempo de amor.
Colho um sol que arde no chão,
lavro a luz dentro da cana,
minha alma no seu pendão.
Madrugada camponesa.
Faz escuro (já nem tanto),
vale a pena trabalhar.
Faz escuro mas eu canto
porque a manhã vai chegar.
(…)
Excerto do poema de Amadeu Thiago de Mello, poeta brasileiro falecido, no dia 14 de janeiro, aos 95 anos. Thiago de Mello foi um resistente cultural e político durante o período da ditadura militar no Brasil. Ao seu exílio no Chile, foi grande amigo e companheiro do poeta Pablo Neruda. O excerto deste poema faz parte da epígrafe que abre o livro “Noite Escravocrata I Madrugada Camponesa” (Rosa de Porcelana Editora), do historiador e professor António Leão Correia e Silva, apresentado anteontem na cidade da Praia, no dia 13 de Janeiro, dia da Liberdade e da Democracia, a abrir a Semana da República, uma iniciativa da Presidência da República de Cabo Verde. Como anda tudo ligado, já é quase tempo de amor, Márcia.
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A Semana da República 2022, sob o signo da afirmação cultural e cívica, terá mais um grande momento de extensão no dia 22 de janeiro, com o lançamento/apresentação do livro “Manifesto a Crioulização” (Imprensa da Universidade de Coimbra), do músico e escritor Mário Lúcio Sousa, sua 13.ª obra literária. A oficiar a releitura deste livro, no Salão Beijing do Palácio da República, o linguista e professor Manuel Veiga.
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E por que a Semana da República vem restaurar a poesia em todos nós, hoje promove-se a Conferência “Por Uma Enografia da liberdade na História de Cabo Verde”, tendo como o Conferencista, António Correia e Silva, e como debatedor Charles Akibodé, ambos historiadores. Acontecerá às 16h00, no Centro Cultural do Concelho da Ribeira Grande de Santiago, Cidade Velha. Venha comigo, Mamãe Velha, venha/ Recobre a força e chegue-se ao portão. Ah, Amílcar Cabral!
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Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 751, de 20 de Janeiro de 2022