O Provedor de Justiça mostrou-se hoje disponível em apoiar a Associação Sindical dos Jornalistas de Cabo Verde (Ajoc) em matérias que a lei lhe confere, na questão do artigo 113 do Código do Processo Penal (CPP).
José Carlos Delgado mostrou essa disponibilidade em declarações à imprensa, na Cidade da Praia, no final de um encontro que teve com a direcção da AJOC na sequência dos recentes casos de constituição de arguidos a jornalistas e aos órgãos de comunicação social em que laboram.
“Puseram a questão do célebre artigo 113 e eu disse que não posso intervir em processos que estejam em juízo e que a lei é clara para todos (…). Quanto à questão da inconstitucionalidade do artigo 113, há dois caminhos que se pode seguir e estou a falar de matérias que a lei me confere”, disse à imprensa no final.
Conforme indicou, o primeiro caminho seria enviar um pedido à Provedoria da Justiça para accionar o Tribunal Constitucional ou solicitar ao Provedor da Justiça que faça uma recomendação à Assembleia Nacional no sentido da alteração do artigo 113, sendo que um, ou outro pedido, conforme advogou, deve ser “devidamente fundamentado”.
“Deve-se aprofundar mesmo esta questão, de modo a que quando chegar à Provedoria da Justiça, termos já a facilitação em matéria de fundamentação da questão. São matérias que não são simples de tratar e são matérias controversas. Há toda a disponibilidade da Provedoria da Justiça, vamos aguardar o pedido da AJOC, seja num sentido, seja no outro, e analisaremos internamente essa questão e, após isso, tomaremos uma decisão num sentido ou noutro”, explicou.
Caminho a seguir?
Por sua vez, a vice-presidente da Ajoc, Gisela Coelho, mostrou-se “satisfeita” com a abertura do Provedor de Justiça em apoiar a associação “dentro daquilo que são os direitos e as limitações da própria função dele”, assegurando que o próximo passo será decidir qual o caminho a seguir, ou seja, pedir a inconstitucionalidade do artigo 113, ou avançar com um pedido de recomendação à Assembleia Nacional para a alteração legislativa.
Gisela Coelho está ciente de que o caminho a seguir terá de ser “muito bem” ponderado, e optar pelo de “maior sucesso”, e por aquele que, no fundo, trará aquilo que a AJOC espera, para que “nunca mais SE venha a repetir esse episódio, em relação ao artigo 113, que é uma limitação clara do exercício da liberdade de imprensa”.
“É a primeira vez que acontece uma situação destas, e esperemos que seja a última, que não se venha a replicar (…). Agora vamos decidir em sede de direcção da AJOC e devidamente assessorados pelos juristas, e avançar. Sendo certo que não podemos ir com pressa, embora a classe jornalística tenha pressa. Temos de ver o melhor equilíbrio para trazer aquilo que queremos no fim, que é a alteração do artigo 113, ou a sua inconstitucionalidade”, frisou.
Recorde-se que o CPP, no seu artigo 112, nº 2, diz que os órgãos de comunicação social não estão sujeitos ao segredo de justiça em relação aos processos que não tenham sido chamados, a qualquer título, a intervir, mas o artigo 113º alínea a), do mesmo Código de Processo Penal diz que “é proibida, sob cominação de desobediência qualificada, salvo outra incriminação estabelecida em lei especial, a divulgação ou publicitação, ainda que parcial ou por resumo, por qualquer meio, de actos ou peças processuais quando cobertas pelo segredo de justiça”.
Foi com base nesse artigo 113 que a Procuradoria Geral da República constituiu arguidos dois jornalistas, e dois órgãos de comunicação social, Hermínio Silves do Santiago Magazine e Daniel Almeida do A NAÇÃO, alegando que publicaram partes de um processo que se encontra sob segredo de justiça.
A medida tem sido muito criticada pela sociedade civil, havendo, naturalmente, muitas vozes contra, por parte de constitucionalistas e juristas, e outras a favor.
C/Inforpress