Mais introspectivo, Batchart revela, no seu novo álbum – Resiliente – , um lado mais pessoal, que até então era desconhecido pelo seu público. Um trabalho desafiador que, muito além do resultado final, ensinou a gozar do processo e a ceder mais às investidas da sua equipa.
“Éum álbum muito introspectivo, voltado para a motivação das pessoas e ajudá-las a acreditar na sua jornada, porque acredito que, no tempo que estamos a viver, as palavras que estão no álbum precisam ser ouvidas”, releva Batchart, em entrevista ao A NAÇÃO.
Em Resiliente, o nosso entrevistado afasta-se do conceito do seu primeiro álbum – mais político e interventivo – , e volta-se à ideia do autoconhecimento e crescimento pessoal.
“Acredito que não podemos conhecer o nosso valor enquanto sociedade se não nos conhecermos e conhecer o nosso valor enquanto pessoas”, explica, admitindo que, por isso, este álbum poderia anteceder Wikileaks, na medida que nos ensina o nosso valor enquanto pessoa, para depois falar do nosso papel na sociedade.
Entretanto, reconhece, essa era a ordem necessária para as coisas acontecerem. “Talvez, na altura, eu não tivesse maturidade para escrever o que escrevi agora. Ao ouvir Resiliente, consegues perceber que é um álbum de alguém que está amadurecido, que levou algumas pancadas da vida e que está a conseguir tirar tudo para fora, em formato
de arte”, revela.
Ao escutar este álbum, diz, é perceptível o quanto muita coisa está mudada. Por isso, confessa, teve algum receio, “o que é normal”. “Não foi um receio de não ser validado, mas de ser estranhado, por ser um trabalho diferente e muito pessoal”, explica.
Apreciar o processo e aprender com ele
Tratando-se de um trabalho para o qual foi preciso uma transformação, o rapper diz que um dos maiores aprendizados foi saber tirar partido do processo de produção, em detrimento do resultado final.
“Se no primeiro o objectivo era ter um resultado final, neste, eu senti que tirei mais vantagem do processo, que é tão importante quanto, ou mais importante, do que o resultado final. Isto é algo que este álbum me ensinou”, garante.
Outro aprendizado foi aprender a ceder e a confiar na sua equipa. “É bom trabalhar com pessoas que nos desafiam. E eu consegui me rodear dessas pessoas, que não se limitam àquilo que eu gosto, mas que me tiram do meu lugar e me apresentam a coisas que eu nem sabia que gostava”, explica.
Batchart, que já foi referenciado antes como alguém que tem muito claro aquilo que quer do seu trabalho e até difícil de fazer mudar de ideias, admite que aprendeu a ceder e a confiar.
“Não é fácil quando já tens todo um trabalho projectado. É algo que nasce na minha mente e, como tal, está num plano ideal. Enquanto não colocar para fora é a melhor ideia que já tiveste, a melhor letra. Entretanto, quando sai para fora começam a aparecer diferenças em relação a aquilo que foi idealizado e isso pode ser frustrante”, admite.
Por isso, concluí, “é bom que as coisas fiquem do nosso gosto, mas não necessariamente precisam ficar do nosso gosto”.
Resiliente traz o dedo de vários produtores, a saber, Golbeats, Marvin Beats, Beats Diterra, Bouzin Beats e D. Blinde. Uma variedade que “adiciona”, diz o rapper, revelando ter uma equipa que já o conhece e que sabe como vai reagir a cada incentivo quando estão a gravar.
Álbum mais ouvido nas plataformas digitais
Uma semana após o lançamento, Resiliente foi parar no primeiro lugar nas preferências dos cabo-verdianos nas plataformas digitais, segundo o ranking da Apple Music.
O álbum inteiro estava igualmente no top 100 das músicas mais consumidas, com cerca de oito faixas nos primeiros dez lugares.
Apesar de serem números e de considerar que o melhor feedback é o recebido diretamente das pessoas, o rapper não esconde a sua satisfação com a conquista.
“Não tem preço quando encontro alguém na rua, que nunca vi na vida, e essa pessoa vem me abordar, me diz que ouviu a minha música e o que ela significou na sua vida”, diz o artista.
Campanha de memes desencadeado pelo próprio artista
Nos meses que antecederam ao anúncio do novo álbum, as redes sociais receberam uma enchente de memes (piadas e trocadilhos) direccionados ao artista e ao seu último álbum, lançado em 2012.
O que parecia ser uma cobrança e pressão por parte dos fãs de Batchart, foi afinal uma jogada de marketing, despoletada pelo próprio artista, para trazer o seu nome de novo às mídias sociais e “antenar” o seu público para o trabalho que estava prestes a colocar no mercado.
“Foi muito interessante perceber como os memes têm o poder de engajar. Toda a gente ri de um meme, então era fácil seguir esse caminho para o engajamento”, revelou.
Os cinco primeiros, confessou, foram feitos por ele, e depois espalhados pelos amigos. Em pouco tempo se multiplicaram para as centenas.
Uma forma criativa de comunicar que colocou o seu nome no centro das atenções e que, garante, está a ter resultado agora, com as pessoas a perceber o significado de todas aquelas imagens.
Resiliente, a capacidade de dar a volta por cima
O termo que define o álbum fala da capacidade humana de dar a volta por cima perante as adversidades e foi baseado, segundo Batchart, no conceito de Resiliência utilizado na construção civil, que define, por exemplo, a resistência do ferro exposto a brisa do mar, até oxidar.
“Esse termo foi importado para as ciências sociais e começou a ser utilizado na capacidade que o ser humano tem de dar a volta por cima e resistir a adversidades”, explicou, admitindo que esta é uma capacidade de todo e qualquer ser humano.
O rapper está, por agora, concentrado na divulgação do seu álbum, através da mídia e das plataformas digitais. A apresentação em shows, como é natural, é ainda indefinido. Lançou, esta terça-feira, o primeiro vídeoclipe, da faixa Ghetto Super Star (ft Biz Z). Mais adiante, pretende disponibilizar também o CD físico.
Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 750, de 13 de Janeiro de 2022