Por: José Jorge Vieira Moreira
“E dará à luz um filho e chamarás o seu nome Jesus, porque ele salvará o seu povo dos seus pecados.” Mat1:21
O Natal é uma festa de origem pagã instituída pelo imperador Constantino visando transformar o cristianismo na religião de Roma. A sua comemoração foi-se (re)fazendo ao longo do tempo, abrangendo territórios e ganhando notoriedades que o coloca como a mais proeminente celebração cristã. Efetivamente festeja-se o nascimento do menino Jesus, a Luz que “veio para o que era seu, e os seus não o receberam”, ironicamente!
A relevância do momento ganha especial brilho em dezembro de 1968, quando os astronautas da Apollo 8 contemplam da órbita lunar o planeta dos seus pés um dia antes desse dia, e em apoteose pela soberba visão recitam em uníssono os dez primeiros versos de Génesis, legitimando o intento: cotejar as realizações do menino Jesus da Bíblia (lido pelos astronautas) com o que nos é mostrado no Natal, e assinalar formas de aproveita-lo (a data) em dar a conhecer o verdadeiro propósito da pessoa de Jesus.
Objetivamos aqui, suscitar interesses e motivar o conhecimento do enigmático Ser, marca indelével do (nosso) tempo histórico e da (nossa) ética social, ainda que cientes dos sofismas da “secularização” que espraia-se horizonte a dentro.
Segue-se-nos daqui o discorrer do olhar, conforme vemos (ou conseguimos):
Ponto 1.
Notamos que a narrativa bíblica que embasa os resquícios judaico-cristã, nosso sustentáculo ético moral, é enxergada (a título ilustrativo) à lupa de Moses und Aron (obra artística que não se propugna espelhar à letra a Bíblia), a “gloriosíssima cidade de deus”, berço dos afortunados, nas penas de Agostinho de Hipona ensoberbeceu-se e envergonha-se copiosamente de si; veremos o porquê. Se o nascimento de Cristo, o Verbo, Messias acalentado pelos Hebreus situa o (nosso) tempo histórico, a Sua efémera e briosa vida cristaliza-lhe a moral (a nossa) e vitupera-nos pela (com) tamanha denúncia que vocifera, assinalando constantemente a “crucificação” (crucificamo-Lo com a nossa vã maneira de viver).
O “Cristo nazareno” da Bíblia é feito e rarefeito (na) pela mecânica do tempo. O álibi para tamanho empreendimento segue o diapasão da “riqueza das nações” de Adam Smith (curiosamente). Acredita-se que o nascimento do enigmático ser, faz-se em dezembro, bem no dia 25 (7 de janeiro para os cristãos ortodoxos e 6 de janeiro para os cristãos arménios) sem agravo, com pomposo festim, as moradias à uma anunciam o Benfazejo, luzes de aurora cintilantes declaram o que pelos dias todos falam. Miúdos e graúdos entram em modelo anamnesia. Eterniza-se a figura da árvore verde, de brilhos a gosto, e invólucros deixados pelo o de comprida barba, indumentado de pés à cabeça ao tom de vermelho e branco. Entretanto o Cristo, “Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz”, que alivia e faz descansar porque o Seu jugo é suave e o Seu fardo é leve, das penas do livro sagrado para os cristãos, é emudecido. Porque sucede?
Ponto 2.
O tempo abortou o “Cristo Messias”, a “Esperança” que não teve pouso em luxuriosa palatium, e constrói à Sua mercê, palacetes, castelos e mansões, instituindo prodigiosamente outro ex libris, o “segundo cristo”, o necessário dignitário-mor, à medida. Este, ostenta-se sem cognomes messiânicos ou salvíficos, eis que jazem no escuro tempo findo, ganhando notoriedades epítetos de nuances economicistas (Ceia de Natal, cartões, festas, arvores de Natal, luzes, guirlandas, Papai Noel, etc) tais quais “fumos” levados pela ideia construída do “Fogo”, (o Cristo da Bíblia) verdadeiras extensões do joio e do trigo da narrativa bíblica.
Digamos que de entre o “Fogo” (Cristo) e esses “fumos”, o (nosso) social construído no tempo, elegeu esses (“fumos”), entendendo ser o Legislador mor, o sapiens architectus, o que assinala a “deificação”. O “Fogo” purifica, transforma o ser em um outro ser, alimenta esperança e desenvolve a “resiliência”. O “fumo” não, daí as constantes incongruências e as abismais incertezas que conhecemos. É caso para interrogar, quem é o Homem para tamanho logro?!
Ponto 3. (nossas esperanças)
Volvidos XXI séculos após o advento do davídico, encontramo-nos em meio às perplexidades impostas pelo Covid 19, pelas desenfreadas correntes migratórias, pelo terrorismo, pelo confronto tenaz sino-americano, pelas mudanças climáticas, pela ascensão da extrema direita na arena internacional e pela conjeturada crise das democracias liberais. Contudo, acalentadas esperanças emergem nas (com as) vacinas, mas também na (com a) vitória dos democratas nas presidenciais dos EUA, e no tão aguardado Acordo do Livre Comércio para a África.
Espraia-se hoje esperanças no horizonte, mas as incertezas que o “novo normal” intempestivamente impõe são efetivamente colossais.
Já a esperança na salvação em Cristo Jesus, à laia do livro sagrado para os cristãos, limita-se ao círculo privado (a quem crê). No social “construído” à sorte da (nossa) “modernidade líquida”, secularizada, as esperanças são outras. Conquanto, continuamos a celebrar o nascimento de Cristo (o Salvador, a verdadeira esperança) com festim pomposo (paradoxalmente neste social) desconhecendo a essência do personagem central, da Verdade, pelo que urge (re)ler o apóstolo: “E conhecereis a verdade e a verdade vos libertará.”
Ponto 4. (notas finais)
No Natal ao invés do Cristo Redentor da Palavra, é-nos oferecido a “indústria de cristo”. A narrativa bíblica do menino Jesus, o Salvador da humanidade é deturpada (nas)pelas estórias postiças e mirabolantes que incendeiam razões menos acautelados, mas pecam pela carência de fôlego espiritual que não conseguem engendrar.
Urge conhecer (n)a verdade, a pessoa de Cristo da Bíblia; quanto mais não seja porque Nela encontramos verdadeiras respostas às mazelas que a humanidade enfrenta. Ele (Cristo) dá conforto e alegria plena; paz e segurança encontramos Nele. Na verdade, Ele é (deve ser) a nossa esperança.
Destarte, vemos que as festividades alusivas fluem através do globo. “…Para os jovens, para os de madura idade, e mesmo para os idosos, este é um período de alegria geral, de grande regozijo” Pelo que, importa aproveitar o momento para abençoar (cuidar) (d)os outros, para fazer sorrir, para fazer cantar o amor e a concórdia no mais fino e doce decibel. E, ao oferecer oferendas, como o costume, mister é fazê-los “de tal maneira que provem ser um real benefício para quem os recebe.”
Ellen G. White, adverte-nos, como achegados seu,
Irmãos e irmãs, enquanto estão a pensar em presentes uns para os outros, desejo lembrar-vos do nosso Amigo celestial, para que não passem por alto as Suas reivindicações. Não acham que Ele vai ficar satisfeito, se mostrarmos que não O esquecemos? Jesus, o Príncipe da Vida, deu tudo a fim de pôr a salvação ao nosso alcance. …Ele sofreu mesmo até à morte, para que nos pudesse dar a vida eterna.
É por meio de Cristo que recebemos todas as bênçãos. …Não deve o nosso Benfeitor celestial participar das provas da nossa gratidão e do nosso amor? Venham, irmãos e irmãs, venham com os vossos filhos, mesmo os bebés nos vossos braços, e tragam ofertas a Deus, segundo as vossas possibilidades. Cantai ao Senhor no vosso coração, e esteja nos vossos lábios o Seu louvor.
Que seja assim, como ela diz o (nosso) Natal.
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1 Imperador que governou Roma entre 306 e 337.
2 Bíblia Sagrada, Edição Corrigida e Revisada, João 1.11
3 Há exatos 50 anos, a tripulação da Apollo 8 foi a primeira a partir rumo à lua (Gnipper, 2018).
4 Ópera de Arnold Schonberg (1874-1951), um dos mais controversos e influentes compositores do século XX.
5 Agostinho (2000).
6 Conhecido universalmente como santo Agostinho, foi um dos mais importantes teólogos e filósofos nos primeiros séculos do cristianismo. Suas obras foram muito influentes no desenvolvimento do cristianismo e da filosofia ocidental.
7 Livro sagrado para os cristãos.
8 Smith (1996)
9 Filósofo e economista britânico, considerado pai da economia moderna, nascido na Escócia.
10 Data afixada pelo imperador Constantino. Nesse dia era celebrada a grande festa solar em Roma.
11 Bíblia Sagrada, Edição Corrigida e Revisada, Isaías 9.6.
12 Bíblia Sagrada, Edição Corrigida e Revisada, Mateus 11.30.
13 A partir da figura de “Cristo”, construiu-se uma verdadeira indústria.
14 O Cristo, conforme reza a Bíblia.
15 Conceito desenvolvido pelo sociólogo Zygmunt Bauman que reporta o período pós Segunda Guerra Mundial, onde as relações sociais, económicas e de produção eram frágeis, fugazes e maleáveis.
16 Bíblia Sagrada, Edição Corrigida e Revisada, João 8.32
17 White (2019, p. 457)
18 White (2019, p.459)
19 Escritora cristã norte-americana, nascida em novembro de 1827, considerada uma das mais proeminentes da literatura.
20 White (2019, p.460)
Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 747, de 23 de Dezembro de 2021