O antropólogo cabo-verdiano, Alcides Lopes, recebeu uma menção honrosa do júri da revista portuguesa “Finisterra”. Em colaboração com a também antropóloga de Portugal, Júlia Carolino, estudaram, de forma etnográfica, o Kola San Jon de Cova da Moura, Lisboa, e o direito à cidade, em um bairro, muitas vezes excluído e marginalizado.
A distinção pelo ensaio científico, por uma revista de geografia surpreende os autores do artigo. Alcides Lopes, doutor em antropologia, vê esta distinção como um conceito “especial e diverso”, o do espaço como relação que proporciona a cidadania.
Por sua vez, Júlia Carolino, co-autora do ensaio, recebeu com surpresa e gratidão, a distinção, e destaca o papel lúdico da manifestação cultural como forma de apropriação da cidade por aqueles que com ela se relacionam.
Direito à cidade
O ensaio dos dois antropólogos incide sobre o bairro Cova da Moura, Lisboa, e a inscrição da prática performativa do Kola San Jon no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial, em 2013. O conceito de direito à cidade é amplamente trabalho, no sentido de mostrar a resistência e afirmação através da prática.
Cova da Moura mantém até hoje, segundo lê-se no ensaio, uma condição liminar de bairro precário, em situação fundiária, urbanística e habitacional irregular e excluído de Lisboa. A prática do Kola San Jon, que surge em meio a atos de coação no bairro, resistiu e tornou-se num manifestação de afirmação e de conquista da cidade.
“O Kola San Jon em Cova da Moura é uma prática de resistência numa cidade que ameaça tornar-se cada vez mais dual, desigual e excludente. No caso do kola é fortíssimo observar como tal reivindicação emana da própria força emergente da ‘brincadeira’ que interpela e desafia os presentes, estabelecendo uma dinâmica igualitária”, constata Júlia Carolino.
O Kola San Jon não se sucumbiu à exclusão do bairro e procurou, ainda, superar preconceitos sócio-raciais, através da sinergia cultural. A ligação do bairro e dos seus habitantes com a metrópole lisboeta, como descreve Alcides Lopes, é íntima e múltipla, mas o direito à cidade ainda “não é absoluto”.
O Ensaio “Formas Resilientes da Tradição na Diáspora Africana em Lisboa: Kola San Jon e o direito à cidade” é fruto de uma pesquisa etnográfica realizada entre 2011 e 2018 nas festividades de Kola San Jon em Cova da Moura.
Alcides Lopes, inclusive, possui uma tese de doutoramento sobre o assunto, disponível no repositório Científico da Universidade Federal de Pernambuco.
Documentos disponíveis aqui:
https://revistas.rcaap.pt/finisterra/article/download/19629/15481
https://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/38014