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Santo Antão

Familiares de Autolindo indignados com viagem de Arlindo Teixeira e desacreditados na justiça

A família de Autolindo Correia Andrade, assassinado em 2015 por Arlindo Teixeira, recebeu com indignação a notícia da fuga do acusado para a França e diz-se desacreditada de que justiça ainda seja feita. Aldevino Andrade, que na altura assistiu à morte do irmão, falou com este online e apresentou a sua versão dos factos que, segundo diz, têm sido deturpados pelo advogado Amadeu Oliveira e seu constituinte.

A família questiona, antes de mais, como alguém que está em prisão domiciliária consegue sair do país sem nenhum impedimento, e diz acreditar que houve ajuda de “alguém de dentro” das instituições.

Esta terça-feira, durante uma entrevista à página Adilson Time, tanto o advogado como o defendido reforçaram que o acto que tirou a vida do jovem em 2015, na localidade de Caibros de Ribeira Grande, Santo Antão, foi em legítima defesa, versão que, aliás, também foi validada pelo Tribunal Constitucional.

Amadeu negou ainda a teoria de fuga e disse estar a defender a Constituição da República e o órgão máximo da justiça cabo-verdiana, que é o Tribunal Constitucional e que deitou por terra a condenação de Arlindo Teixeira.

Entretanto, Aldevino Andrade garante que não houve necessidade de legítima defesa, já que, segundo diz, “em nenhum momento houve agressão por parte do irmão”, desmentindo, ainda, a acusação feita por Teixeira, que diz que a vítima o teria agredido por três vezes.

“Como alguém pode agir em legítima defesa se em nenhum momento houve agressão antes de golpear o meu irmão com a faca. Estavam presentes mais de 50 pessoas, destes dois ou três testemunham a favor do Arlindo e cerca de 30 a favor do meu irmão”, avança o jovem.

Para Aldevino, se fosse uma atitude tomada em legítima defesa, o golpe não teria sido para matar. “Poderia até feri-lo, mas ele acertou para matar”, diz o irmão, que segurou a vítima nos braços após ser atingida.

Justiça deixa a desejar 

Para a família a pena foi injusta desde o primeiro momento quando foram decretados 11 anos de prisão para o agressor. Neste momento mostra-se ainda mais desacreditada e diz que dentro de um ou dois anos o emigrante estará de férias em Cabo Verde como se nunca nada tivesse acontecido.

“Amadeu agora fala em adulteração de provas. Como é possível alterar ou corromper as declarações de cerca de 30 pessoas e fazer com elas digam todas a mesma coisa ao juiz. Às vezes até duas pessoas não conseguem fazer isso pois sempre falham em algum detalhe agora imagina em 30”, indaga.

Outro aspecto que Aldevino realça nesta história é o facto de não ter conseguido, junto do tribunal da Ribeira Grande, uma certidão da sentença dada na altura à Arlindo Teixeira.

“Desde que Arlindo saiu da cadeia pela primeira vez eu me informei com um advogado se havia a possibilidade da família fazer alguma coisa. Ele me disse que para me ajudar precisava da certidão da sentença. Tirei férias e fui para Santo Antão propositadamente para conseguir essa certidão. Primeiro me disseram que estava na Praia, e dias depois disseram que afinal não estava na Praia e nunca mais soubemos do paradeiro do documento”, recorda, alegando que a família ficou de mãos atadas.

Aldevino diz ainda que durante o processo o advogado em causa foi várias vezes afastado, e quando isso acontecia ele se dirigia até o local do crime com os novos advogados para explicar o que ocorreu, quando não presenciou o crime, o que para ele mostra que estavam a construir uma versão favorável a Arlindo Teixeira.

A família diz não acreditar que a justiça seja feita. “O meu filho agora está debaixo da terra. Não teve justiça aqui, mas a justiça divina não falha”, disse a mãe, em reação à notícia da fuga. Já para Aldevino Andrade, a justiça de Cabo Verde tem medo de Amadeu “porque ele diz e faz o que bem entender”.

Momentos que antecederam a agressão

Segundo conta Aldevino Andrade, no dia do crime ele e o irmão estavam juntos a trabalhar. No final da tarde, o jovem saiu para passear com o filho, que completava um ano de vida. Na volta, prossegue, o mesmo teria começado a sentir tremores e entregado a criança ao primo, que por sua vez o levou para a casa da avó.

O jovem teria arremeçado, sem motivo aparente, uma pedra em direção a um grupo de pessoas entre as quais estava Arlindo Teixeira. Apesar de não atingir ninguém, originou uma discussão entre o agressor e a vítima. Como o barulho, teriam se juntado cerda de 50 pessoas no local, segundo conta o irmão.

Após a discussão, a vítima teria ainda pedido desculpas ao posterior agressor, que reagiu mal, o ameaçando de morte, segundo conta o irmão.

“Nesse momento o meu irmão se exaltou mais, foi em direção a uns blocos, levantou um dos blocos e bateu no chão. Tentei segurá-lo e levá-lo para casa, mas ele não quis. Dirigiu-se em direção ao Arlindo e ao chegar perto levou a facada”, descreve.

Arlindo Teixeira, por sua vez, alega que o jovem teria quebrado o seu braço, facto também desmentido pela família. “Toda a gente sabe que é mentira porque eles não tiveram nenhum contacto para isso acontecer, quanto menos para fraturar o joelho, como também alegou”, declara.

Ao tribunal, continua a nossa fonte, o agressor teria dito que a arma branca utilizada no crime teria servido para cortar cana momentos antes. Entretanto, o jovem refuta esta ideia, alegando que o agressor só foi buscar a faca em casa depois de iniciar a discussão com o irmão.

“No julgamento, ele diz que estava a cortar cana com a faca, mas é mentira. Minutos antes, ele entrou numa loja e pediu uma faca para cortar cana. A funcionária disse que no momento não tinha. Ele saiu e eu fiquei na loja. Já na rua, o meu pai, que estava com a sua faca, cortou-lhe a cana. Foi depois que a discussão começou que ele entrou em sua casa para apanhar a faca utilizada para matar o meu irmão”, detalha.

Histórico

O caso remonta a 31 de julho de 2015, quando o jovem Autolindo Correia Andrade foi morto, a facada, por Arlindo Teixeria, emigrante na França e que se encontrava de férias em Cabo Verde.

Arlindo Teixeira foi preso, acusado de assassinato. Em 2016 foi condenado a 11 anos de cadeia, continuando em prisão preventiva a aguardar o desfecho do recurso ao Tribunal Constitucional e a 26 de Abril de 2018, após dois anos, oito meses e 26 dias em prisão preventiva, o Tribunal Constitucional ordenou sua soltura, por considerar que agiu em legítima defesa.

Numa nova apreciação o Supremo Tribunal de Justiça reduz a pena de 11 para nove anos. Um acórdão posterior do Tribunal Constitucional revoga a condenação e manda repetir o julgamento porque este decorreu sem assistência do público e do advogado de defesa Amadeu Oliveira.

O Supremo Tribunal repete o julgamento, mas mantém a pena de nove anos, que só pode ser executada depois da decisão do Tribunal Constitucional sobre o pedido de amparo.

Enquanto isso, Arlindo Teixeira é colocado em prisão domiciliar, a partir de 16 de Junho, uma decisão que o advogado considera fraudulenta.

No passado final de semana Arlindo Teixeira e o advogado saíram de Cabo Verde num voo da TAP com destino a Portugal, de onde seguiram viagem depois para a França, país de residência do imigrante.

Amadeu Oliveira garantiu que regressa a Cabo Verde o mais breve possível, mas o constituinte deve permanecer na França para “cuidar da saúde” e só depois regressar para “responder” perante o tribunal.

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