Por: Carlos Carvalho
(No rescaldo das autárquicas)
Um amigo me perguntou o que achava das recentes autárquicas. Se não faria nem um comentário sobre as mesmas. Respondi que as autárquicas já eram. O futuro é que conta. E…elas (as legislativas) já estão à porta.
Na verdade, havia decidido não abordar publicamente as autárquicas recém-passadas, porque achava não justificar. Os analistas de serviço que o fizessem.
Porém, depois de ouvir que a ilustre Ministra da Educação, Família e Trabalho pedira demissão e de ter ouvido vários comentários sobre os motivos do … tardio … pedido de demissão da Ministra, resolvi trazer esta, minha, superficial reflexão. É que, dentre os comentários, ouvi a absurdidade de que ela foi acusada de infestar gente da oposição no seu Ministério o que contribuiu, ou em parte … ou grandemente, para a derrota do meu amigo Óscar e de outros agora ex-autarcas do Partido no poder.
Esta estapafúrdia desculpa é, certo, para animar a malta! Não pode ser para “boi dormir”, pois, agora não é hora de os “boys dormirem”. Há muita coisa em jogo, já no início do próximo ano.
Ninguém, nenhum razoável ser pensante, neste nosso Cabo Verde aceita esta desculpa como minimamente credível.
Em tempos, escrevi um artigo que intitulei “(Des)Partidarização”. No artigo, escrevi que UCS, ao contrário do que nos prometera, intxi aparelhu di stadu, ti pó, di guentis di si cor política…
E era … e é … verdade. E, conclui que isso era mais do que normal. UCS não fez mais do que repetir, quiçá erradamente, o que se fez/faz nesta nossa tapadinha.
E fez bem porque quem ganha as eleições deve colocar em todos os lugares “sensíveis”, até de pequenas diretorias, pessoas que não o trairão, para não ter desculpas como as que agora se apresenta, como libelo, à demissionária Ministra.
A ser verdade do que acusam Maritza Rosabal, seria interessante saber quem são (nomes) dos “traidores” e as funções que desempenham no Ministério e que lhes permitiu influenciar a derrota do MpD nas autárquicas.
Perder?? Sim!! É normal.
O meu primo, Zé Filomeno, já havia dito k oras k nu perdi…nu ka mesti labi-labi na txon. Perdeu, é o líder ou quem perdeu assumir frontalmente a derrota. Não buscar gato(s) escondido(s) com rabo de fora.
Agora, perder a capital … e perder quase todo o Santiago…é obra!!
Perder quase toda a ilha do Fogo…é obra!!
Pior, é que tudo aconteceu depois de UCS ter carregado os autarcas todos (ganhadores e perdedores) para uma quase chitada nas autárquicas anteriores!!
Não acredito, ninguém acredita que foi a “naifité” da Sra. Ministra que levou ao recente “descalabro” do MpD.
O que aconteceu nas autárquicas?
Era expectável o que aconteceu, ou seja, a derrota dolorosa do Partido no poder?
Sim! Era expectável!
Porquê?
O título, a meu ver, explica o que aconteceu.
Explico.
A liderança e o líder
Em tempos, escrevi um artigo intitulado “Demissão”. Acredito que o 1° Ministro não tenha lido o artigo. Porém, estou certo de que alguém, algum assessor do Premier, ou um Ministro qualquer terá lido e comentado com ele o conteúdo. Ou ainda, um assessor de imprensa terá lido ao PM o artigo…se sabe bem sua função.
Nesse artigo, resumidamente e no que interessa para esta análise, dissera que o UCS não tinha co….. para demitir ninguém de seu governo, por mais fraco que fosse o desempenho de uns e outros.
Mas, não fui o único a fazer essa constatação. Pessoas, próximas ao Partido no poder, chegaram à mesma conclusão e o disseram publicamente.
Para mim, o actual Partido no poder não tem líder … tem liderança. E…tudo leva a crer que não tê-lo-á tão breve. Não se vislumbra, no horizonte, nenhum líder carismático. Aliás, Carlos Veiga foi o único líder que o MpD teve.
Na verdade, esse é o mal dos Partidos do arco do poder, na actualidade. Nem um, nem outro tem líder. Têm lideranças.
No Dicionário de Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa, de 2001, líder, significa: “Pessoa que pela sua personalidade (bold meu) exerce influência sobre o comportamento dos outros, conduzindo-os na acção e representando-os nas suas pretensões e opiniões”.
Líder é aquele que congrega…não desagrega! É aquele que mobiliza, cativa, encanta, com sua presença e com seus argumentos, com seu discurso aglutinador.
Ora, a mim me parece que UCS não tem esses atributos. Para mim e para muitos, ele não cativa, não tem uma oratória fácil, cativante, parece ter medo do povo, ta parsi senpri aspradu…so bu fla… ai…é buuua.
As autárquicas
O que aconteceu nas autárquicas foi o manifestar de um descontentamento com a governação e liderança do nosso Premier. UCS foi o único Premier que, em quatro anos, não ousou correr com um único Ministro, apesar de vários terem desempenho fracote…a roçar o medíocre. Quem saiu, foi porque, cansadu ou xatiadu, rizolvi capri.
O meu amigo Óscar pagou por UCS e pelos colegas do Partido, leia-se, Governo.
É claro que Óscar Santos (OS) também teve sua quota parte de culpa. E não foi pouca. Várias de suas actuações, roçando ao “desumano”, não podiam não ter consequências. Nem é preciso descodificar. O povo, aquele que consideramos povinho, não esquece…não perdoa! Dá…sempre… o troco na hora certa.
E…foi o que aconteceu. E Dú pagou…caaaaaro.
Nem a desculpa de excesso de confiança pode justificar a derrota de OS. É que ninguém, sério, nesta nossa Praia, pode negar que Óscar fez um bom trabalho. A Praia efectivamente mudou…está uma outra cidade…que orgulha os praienses.
Mas, um bom trabalho não chega. O nosso povo gosta de afectos…de mimos…de proximidade, apesar da pandemia que obriga a distanciamento.
E Santos nunca deu afectos…não distribuiu mimos…abraços…beijos. Só na hora da campanha. Claro, isso não chega.
Eu que o conheço, de perto e de há muito, sei que é sua maneira de ser.
Dú não é homem de transmitir simpatia…não consegue cativar.
Ele é como o seu Chefe do Partido que também não dá afectos. Não transmite simpatia. Não cativa. Não tem co….. de líder.
Minhas análises de eleições anteriores me levaram a concluir que dos Pr(s) de Câmaras que, com um único mandato, não foram reeleitos, não foi porque tiveram um mau desempenho. Foi, normalmente, uma grande dose de arrogância que os conduziu à derrota. Não duvido ter sido também o caso do Óscar.
Para confirmar o que disse anteriormente, que Óscar pagou por UCS e seus Ministros, vejam quantas Câmaras perdeu o Partido no poder. Os autarcas que perderam … pagaram pelo fraco desempenho do governo…pela arrogância do Partido…e, claro, perderam também por eles próprios, pelas suas incompetências. E…nem a desculpa da COVID vale. Ele(a) até pode ter ajudado!!
Correia e Silva perdeu em toda a linha para a Janira. Ela que batalhou quase sozinha com todo o Governo do UCS…e todos os deputados do MpD. Diz-se que se batalhou até contra alguns “barões” de seu próprio Partido que, não ajudando, na surdina, “preparavam sua cama”, sua morte política, caso não saísse bem neste primeiro embate no ciclo eleitoral, ora começado.
Mas, ela saiu vitoriosa. Ganhou de forma clara ao UCS e toda a máquina MpD!!
Temo, caro UCS, que esta derrota nas autárquicas não seja um mau prelúdio.
É verdade que o resultado das autárquicas não determina as legislativas. São duas eleições bem diferentes. Porém, as legislativas já estão à porta…e … Ulisses, obrigatoriamente, tens que correr contra o tempo…que joga, agora, a teu desfavor.
Houvesses sido um verdadeiro líder, duvido que estarias, hoje, assim em tão maus lençóis.
Tenho dito.
PS: Caro amigo Pery, eis a análise que me pediste. Claro que não foi tão aprofundada como desejaria, pois, não há espaço para ir a alguns detalhes do que penso ter acontecido no dia 26 de outubro, p.p. Faltou abordar pontos extremamente importantes que seguramente terão igualmente pesado na decisão do povo. Só a estória dos terrenos e a suposta corrupção com suas vendas deram já vários artigos. E…tem os TACV, ou o que restou dela, cavalo de batalha do MpD nas legislativas anteriores. Todos estes pontos da governação começaram a ser julgados nas autárquicas. Seguramente, serão escalpelizados até a exaustão nas legislativas. Mas, como sei que retomaremos a discussão quando encontrarmos na nossa tapadinha…
Publicado na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 694, de 17 de Dezembro de 2020