Por: Geraldino Correia
As tecnologias não fogem do nosso quotidiano, e com as medidas que estão sendo tomadas pelas autoridades, vem-se massificando ainda mais o seu uso no nosso dia-a-dia. É que estando distante conforme se recomenda atualmente, a tecnologia facilita imenso no colmatar da necessidade que temos em comunicar e partilhar.
Hoje em dia até os chamados mais velhos já utilizam com maior frequência a tecnologia e as redes sociais, absorvendo a sua pertinência, imagine-se agora a juventude que nasceu e se criou com ela.
E mais ainda, quando no último trimestre do ano letivo após o decreto do confinamento obrigatório por causa da Covid-19, o Ministério da Educação decidiu proceder com as aulas remotas, para manter os alunos em contacto com os conteúdos, através da televisão, rádio e outros meios de comunicação.
Como será o ano lectivo que aí vem?
A situação da Educação em Cabo Verde inspira cuidados. Sabendo que a situação da Covid-19 dificilmente terá solução tão cedo, como será o ano letivo que aí vem? Que intervenções farão as escolas, delegações e o Ministério da Educação? Que responsabilidades têm as famílias? Que competências e desafios se vão colocar para os profissionais, principalmente os professores? Como se poderá lidar com a questão do distanciamento, sabendo que os jovens procuram identificar-se com os grupos e é assim que costumam estar? Como se poderá proceder à higienização das mãos nas escolas? Haverá álcool gel, água e sabão disponível para todos? E o uso de máscaras pelos alunos e professores? Como se prevê ser o modelo de ensino? Qual o número de alunos por sala? Quais as estratégias pedagógicas que serão adotadas?
O Ministério da Educação, na pessoa da Senhora Ministra vem dando alguns palpites através do parlamento e da comunicação social, que o número de alunos por turma vai ser reduzido (pelo menos para a metade), que os horários serão flexíveis, e que se irá continuar a investir no programa “Estudar e Aprender em Casa”, que se considera ter sido uma aposta vitoriosa, mas desta vez com a montagem de uma Televisão Educativa e capacitação dos docentes para as teleaulas, adotando um modelo de ensino híbrido.
Situação do país: possibilidades e questões
Tudo isto levanta um conjunto de possibilidades e questões, algumas já apontadas acima e outras que vão surgir ao longo do processo de implementação.
Por isso, esta reflexão vem no sentido de oferecer um conjunto de subsídios viáveis principalmente no que tange ao maior preparo e mais informações sobre o modelo de ensino a ser adotado.
As evidências da transformação do mundo a nível tecnológico são visíveis em vários aspetos e são inegáveis. Pode começar a ver-se nas novas formas de trabalho, recreação, comunicação e até em termos académicos sofreram transformações significativas.
Em termos académicos, até já podemos verificar que a Educação à distância não é novidade e é possível, mas a verdade é que no momento que estamos a atravessar, todo o mundo se viu obrigado a ensaiar. Porque a educação presencial deixou de ser possível de uma forma abrupta e sem precedentes, deixando lugar apenas ao modelo à distância, e isso muito graças à transformação tecnológica que já decorria.
No nosso país, sabemos que a maioria dos estudantes, pais, professores, escolas primárias, secundárias e universidades que não tinham muito convívio ou hábito de explorar as ferramentas tecnológicas viram-se de repente na necessidade de ajustar as aprendizagens aos conhecimentos tecnológicos que possuíam para poderem acompanhar a mudança repentina. Mas muita gente não o fez: ou porque não sabia, ou porque não podia fazê-lo, por falta de conhecimento ou por impossibilidade de usar as TIC.
Desigualdade social no seio de alunos e professores
Aí se afigura um dos problemas fulcrais: a desigualdade social, tanto no seio dos alunos como entre os professores. Pressupõe-se que ela exista principalmente no Ensino Básico e no Secundário, onde os problemas são mais graves.
Muitos alunos não possuem condições adequadas em casa para fixarem um ambiente de estudo, um ambiente que lhes permita concentrarem-se, realizar tarefas, pois precisam de orientações dos pais ou encarregados de educação que às vezes não possuem as habilitações necessárias para o acompanhamento, depois são os fatores técnicos: o sinal de TV que não chega a todos as localidades, o problema da internet que é fraca e os dispositivos eletrónicos que nem sempre são os mais adequados, sem dizer que faltam também orientações adequadas para o uso dos aparelhos.
Tanto os alunos como os próprios professores que têm conhecimentos muito reduzidos e falta de formação adequada no que tange à utilização das tecnologias no processo ensino aprendizagem ou no próprio ensino a distância. Que solução então? Como colmatar tudo isto para o ano seguinte, já que o ensino vai ter uma parte à distância?
Comecemos pelos professores, leia-se guerreiros desta nova guerra. Numa investigação bem recente que analisa a utilização das Tecnologias de Informação e Comunicação pelos professores do Ensino Secundário, foi possível obter o seguinte resultado: dos inquiridos, 67% dos professores têm alguma formação ligada às tecnologias e 37% não a tem.
De entre essas tecnologias cerca de 88% utilizam mais processadores de textos (Word, Power-Point, etc), seguido de motores de buscas na internet (Google) e aplicativos de mensagens instantânea (Messenger, WhatsApp, etc). E também que essas ferramentas são utilizadas mais para preparação das aulas e conteúdos para os alunos.
A maioria não utiliza, nunca utilizou e não tem muito conhecimento sobre qualquer software de gestão de aprendizagem virtual, a não ser como alunos.
“As tecnologias não fogem do nosso quotidiano, e com as medidas que estão sendo tomadas pelas autoridades, vem-se massificando ainda mais o seu uso no nosso dia-a-dia. É que estando distante conforme se recomenda atualmente, a tecnologia facilita imenso no colmatar da necessidade que temos em comunicar e partilhar.
Hoje em dia até os chamados mais velhos já utilizam com maior frequência a tecnologia e as redes sociais, absorvendo a sua pertinência, imagine-se agora a juventude que nasceu e se criou com ela.
E mais ainda, quando no último trimestre do ano letivo após o decreto do confinamento obrigatório por causa da Covid-19, o Ministério da Educação decidiu proceder com as aulas remotas, para manter os alunos em contacto com os conteúdos, através da televisão, rádio e outros meios de comunicação.”
Capacitação dos professores
Nessa onda, pode-se ver que é fulcral a capacitação desses guerreiros com ferramentas adequadas, principalmente em formações práticas e aplicáveis a curto prazo, bem como de treinos contínuos.
O ministério fez e bem uma tentativa de formação com algum êxito para um bom número de professores no final do ano letivo, mas precisa-se de massificação, orientações práticas, equipas pedagógicas e técnicos de apoio por perto, massificação de treinamentos em estratégias de ensino híbrido, como o caso de utilização de metodologias ativas e ensino baseado no problema. Tudo isto para o ano que ora se inicia, já deveria estar a decorrer.
A tecnologia por si só não faz nada, ela não substitui o professor. O ensino deverá ser centrado no aluno, por isso o professor deve ter uma orientação adequada e um acompanhamento adequado para que a integração dessas tecnologias no processo de ensino aprendizagem tenha sucesso. A função do facilitador e mediador nunca esteve tão patente na tarefa do professor, mas é preciso estar perto e oferecer subsídios e apoios pedagógicos a este ponto constantemente.
Os alunos dominam muitas vezes as tecnologias, mais do que o professor (muitas vezes), mas a intenção não é aprender as tecnologias, por isso o professor deve saber como se posicionar sendo um mediador e incentivador da aprendizagem e não deixar que o objetivo de aprendizagem seja obstruído, para isso deve ter um treinamento adequado.
Muito se falava dos desafios dos professores do século XXI, aqui está o exercício a bater à porta, desafiando o professor a reinventar-se, a recompor-se, a sair da zona de conforto para dominar as tecnologias, a interagir ativamente com os seus alunos, orientando, incentivando o trabalho colaborativo, acompanhando os progressos individuais e de grupo, inspirando, estimulando, reconhecendo talentos e interesses.
A aposta na formação dos atores é para dominar as ferramentas na prática – isto não é só conhecer e ter os recursos materiais ou tecnológicos, é preciso saber usá-los para o fim a que se destina.
Iinfraestruturas tecnológicas nas escolas
É preciso investir apropriadamente nas infraestruturas tecnológicas a nível das escolas. Sabe-se que nem todos têm infraestruturas adequadas para que os professores possam ajustar as suas aulas, a não ser que os professores devam utilizar os seus próprios meios, enfim, alguma atividade prática já devia sair do papel tendo em conta o tempo que falta para o início do ano letivo anunciado. A formação que se pede, neste momento, é de teste de ferramentas e ensaios para professores antes da implementação.
Planear tudo de forma gradual, sem esquecer de adequar o programa das disciplinas ao modelo de ensino que se quer. Temos de ter o planeamento necessário e adequado, porque não surte efeito pegar o programa da aula presencial e vir repostar num ensino híbrido, os programas devem adequar-se ao modelo de ensino e adotar estratégias pedagógicas para a sua efetivação.
O país saiu do confinamento, mas as restrições continuam. O Governo anunciou um conjunto de medidas que permite principalmente evitar aglomerações de pessoas, obrigar a utilização de máscaras e as escolas não fogem à regra. Deve-se assegurar as condições sanitárias básicas e técnicas dos alunos para que tudo isso possa surtir um efeito positivo.
Espera-se que as escolas estejam em boas condições físicas, oferecendo tudo que é necessário para higienização. A assiduidade de fiscalização do cumprimento das regras, o respeito de todos e que principalmente se assegure máscaras para os alunos que não têm condições, televisores como prometido para mitigar as deficiências e colmatar as dificuldades dos professores.
É razoável a solução que se encontrou, pondo tudo no equilíbrio. Agora, o que se pode questionar é o arranjo exigível a este ponto. Os professores precisam treinar antes da implementação do novo modelo de ensino. Essa é a exigência maior do desafio que se coloca para o ano letivo 2020/21.