Por: Carlos Carvalho
Introtito
O “original” deste artigo foi escrito quando o caso HOTEL KARAMBOA, na ilha da Boa Vista, estava a fervilhar.
Porque muita água passou pelas nossas ribeiras e continuamos convivendo di nos manera com o mundialmente famoso COVID-19, diria até que já nos habituamos a ele; ele já quase que não nos mete medo, pelo menos é o que nos deixa entender nossos órgãos de comunicação social, este que vos apresento, claro, retrata esta nossa nova realidade.
O artigo que alguns tiveram a oportunidade de ler incidia sobre os erros graves cometidos por responsáveis e altos dirigentes deste nosso querido país, nos casos KARAMBOA, na Boa Vista, na Praia e no Mindelo, no lidar com o CORONA.
Um familiar a quem normalmente dou a ler para corrigir o que escrevo, lendo a 1ª versão do artigo, comentou: “isto está violento, mas é assim mesmo”, alguém tem que ousar dizer umas verdades.
Porém, após alguma reflexão, decidi não publicar o artigo, na altura, a ver se acontecia alguma coisa. Mas não aconteceu nada, pelos vistos nem vai acontecer.
Mas, quando ontem (sábado, 24/07) ouvi um comentador num programa da RCV, normalmente de excelente qualidade, dizer praticamente o que havia escrito, pensei que, afinal, não fora eu o único a constatar a tremenda falha cometida, pelo que decidi partilhar esta reflexão.
Reaproveito, neste, grande parte do artigo original.
Essência
Demito-me!
Que tempo verbal difícil de conjugar.
Que palavra difícil para os governantes africanos!
Já se passaram semanas e semanas à espera para ver se alguma coisa aconteceria. Se ouviria a conjugação do verbo DEMITIR … em qualquer dos tempos: passado, presente ou futuro.
Mas, não!!
Ninguém se dignou usar o verbo em causa.
Factos
Aquando do acontecido no Karamboa-Boa Vista, com a catástrofe que se avizinhava, vimos todos o nosso PM – UCS – entrar com ar grave, afinal, seu ar habitual, para uma conferência de Imprensa, sem direito à resposta dele, pensei:
– Bom, cabeças vão/iriam rolar. Vai haver demissão, amanhã, depois de amanhã… Mais tardar, nos próximos tempos.
O Premier entrou e saiu com ar de Chefe zangado, zangado mesmo, deixando dois de seus generais entregues às mãos da Imprensa.
Sim, confesso ter pensado … cabeças irão rolar.
Mas, nada!! Rigorosamente nada!! Enganei-me redondamente.
Ninguém, dias… tempos depois, teve a hombridade de vir dizer ao povo:
– Cabo-verdianas e cabo-verdianos, venho pedir desculpas pelo grave/gravíssimo erro que cometi/cometemos e que levou toda uma ilha quase à catástrofe. Por este erro grave e porque sou o responsável máximo pela situação, acabo de apresentar a Sua Excia. o Sr. 1° Ministro ou ao Sr. Ministro a minha demissão.
Este acto, NOBRE, deveria ser seguido de uma catadupa de outros. É que, normalmente, cai o Ministro, por “solidariedade/cumplicidade” na falha grave na condução de qualquer processo, tipo “KARAMBOA”, saindo de cabeça … ou erguida … ou baixa, colaboradores directos deveriam, igualmente, seguir o procedimento, pedir demissão, ou, no mínimo, pôr o cargo à disposição.
Mas, não!! Nem os Ministros se demitiram, nem seus “cabos-chefes” dignaram demitir-se. Nem ninguém pôs cargo à disposição!
Pior!! O Sr. 1° Ministro não se dignou demitir os principais responsáveis por tamanha incompetência em gerir uma situação que se sabia de antemão muito delicada. Estamos perante uma pandemia e Sua Excia. o Sr. Presidente fez uso da prerrogativa que a Constituição lhe dá, atribuindo ao Governo poderes excepcionais para gerir este período complicadíssimo que a Nação cabo-verdiana vive. E estes poderes implicam poder gerir situações complicadíssimas como a vivida no “KARAMBOA”.
Dias depois, um conhecido comentador de nossa praça, comentando o caso em apreço, disse mais ou menos isto: “O Governo foi leviano” … “o Governo auto-suicidou”.
Eu não chegaria a tanto! Mas, que o Governo não andou longe, não andou!!
É que já havia acontecido os casos de S. Vicente e da Praia. Nos dois casos, falhas grosseiras aconteceram, o que levou até o Ministro da Saúde a mandar abrir um inquérito sobre o que terá acontecido no primeiro caso. Desses inquéritos que, no fim, regra geral, não dão em nada, com os “prevaricadores”, normalmente, a saírem todos sempre ilesos.
Para além dos casos de S. Vicente, da Praia, para piorar, apareceu, tempos depois, o caso Trindade.
Foi pior a emenda que o soneto!!
Apesar dos inúmeros argumentos, pa kulpa morri solteru, assistimos a um atribuir mútuo de culpas, erros graves foram cometidos. Erros por demais evidentes!!
Passado
Porém, situações graves do género, não são/não foram/nem serão novas, infelizmente!!
Num passado recente, uma ponte caiu na mesma ilha, onde se deu o acto 1, do teatro pandémico – COVID-19, nas nossas ilhas. O Ministro não só não se demitiu, nem demitiu ninguém de seu entourage.
Claro, o Ministro em causa não foi demitido pelo Premier da altura.
Igualmente, várias barragens em vez de guardarem água, desperdiçaram milhões! O Ministro responsável não se demitiu … não foi demitido … nem ninguém foi demitido.
Felizmente, nos dois casos, se não me falha a memória, ninguém morreu! “Só” se perderam milhões e milhões que iremos TODOS pagar, se não nos perdoarem nossas dividas.
No “caso KARAMBOA”, por sorte, ninguém morreu.
No caso S. Vicente, igualmente por sorte, a coisa não descambou.
Nos casos da Praia e Trindade, viu-se / vê-se no que acabou por dar. As coisas parece que saíram do controlo.
Como pudemos todos constatar, nesse “gravoso” dia da Conferência de Imprensa do Premier, foi vergonhoso ver dois Ministros a patipatirem, tentando justificar o injustificável, ao ponto de um complicar conta simples de somar e subtracção. Se de 1 chegamos a 45 é porque somou-se 44. Tabuada simples de nosso tempo de mininessa.
Quando vi todo aquele cenário, que todos vimos, com a presença do Sr. 1° Ministro, pensei:
– Bom, o PM já obrigou alguém a se demitir e a ordem de pedir demissão estava pesando nas contas dos principais responsáveis.
Estava certo de que os seus dois Ministros ou já estavam demitidos ou já os havia aconselhado a se demitirem, pa ka fika mal, el, PM, assumir o sempre incomodo ónus de os demitir.
Mas, UCS não consegue demitir ninguém. Só sai quem quer. Como quase nunca ninguém quer!!!
É que, já várias vezes, pessoas próximas ao Partido do Governo sugeriram ao Premier UCS a substituição de alguns Ministros por fraco desempenho. Eu diria muito fraco desempenho!! Mas, nosso Premier fez/faz orelhas moucas. Demitir um Ministro?? Nem pensar!
Aliás, não é só UCS. Os nossos Premiers, cremos, têm medo de demitir seus Ministros. Não se entende porquê, sendo a coisa mais normal na governação de um país. Até parece que ab initio há acordos de não demissão!! Por mais fraco que seja o desempenho dum Ministro…ele não é demitido. Fica, fica … até que acontece alguma coisa diferente para ele mudar de posição no Governo. Agora, sair mesmo…por reconhecida incompetência…NUNCA!!!
Vejam só o último Governo da última maioria. Dava dó ver a maioria dos “Ministros”. Mas sair!!?? Ninguém saiu!! E…deu no que deu!! Uma derrota histórica!!!
Só Veiga (Carlos) teve power, para não dizer c….., para demitir efectivamente um(ns) governante(s) com quem se incompatibilizara ou entendera ter chegado a hora. Até, na maioria dos casos, nem foi por incompetência.
Imaginemos o cenário, que ninguém deseja, que da incompetência de que resultou o caso KARAMBOA, infelizmente, resultasse mortes… Quem, no fim, seria responsabilizado??!!
A desculpa principal apresentada de que a rapaziada e meninada não cumpriu a palavra dada de fazer 40ENA caseira foi conversa para boi dormir!!
Alguém acha mesmo que o cabo-verdiano, que conhecemos, vai para casa e fica… xintadu ketu… à espera de os dias passarem… ele que já passou duas dezenas de dias fitxadu (diz-se, ti na ben bon), ainda mais quando é ele que ta djuguta pa da di cumi na casa??
Meu falecido pai nos dizia sempre:
– Vocês não sabem o que é passar um dia fechado! Ele passou anos!!
A incompetência no caso da Boa Vista foi de tal forma notória que não há desculpa que se aceite. O Sr. Premier devia tão-somente, a meu ver, assumir, como “armou” assumir, a culpa por ter tido, no caso, Ministros no mínimo incompetentes e, não se demitindo eles, demiti-los. É que dos erros graves da Boa Vista, de S. Vicente (neste caso tivemos a protecção, creio, divina) e dos repetidos da Praia, da Trindade, estamos, hoje, todos a pagar.
Soma-se, mais recentemente, imaginem, a nossa porta de entrada, o Sal!!
Quanto nos vai custar erros graves de responsáveis deste nosso torrão!!.
O Super-Ministro Olavo não cansa de nos lembrar. Vamos todos ter que penar, pois, são milhões e milhões que iremos TODOS ter que pagar, por incompetência de uns X!!!
No meio de tamanha incompetência, estranhamente, o Premier resolveu só “castigar” seu Ministro da Administração Interna, “quarentando-o” por duas semanas na ilha (des)afortunada!! para, quase com certeza, ficar longe dos holofotes, da boca do mundo, dos “faces” e “quejandos”, afrontando o Chefe da Polícia local que, ao que parece, só cumpriu ordens superiores para mandar os “quarentados karamboenses” para casa.
Por acaso, pensei que o Premier iria mandar de novo o homem de sua confiança e de nossa (in)segurança interna à Dja d’Sal repetir a proeza que “conseguiu” na terra dos “cabreros”. Mas não fez.
E… fez desaparecer seu Ministro da Saúde, poupando-o de aparecer nas Conferências que seu Ministério nos brinda(va), e bem!!, todos os dias. Aliás, parece até que este foi aconselhado a “esconder-se”… tão mal o Homem comunica.
Finalizando mesmo, continuo… pacientemente… à espera do dia em que um Ministro, nesta nossa tapadinha, terá a nobreza de dizer:
Demito-me, por ter falhado no cumprimento da tarefa que o Sr. PM me incumbiu!!
Parafraseando meu amigo Daniel Medina, pensem nisso.
Tenho dito.
(Publicado no A NAÇÃO (digital), nº 675, de 06 de Agosto de 2020)