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Economia

Falência da Thomas Cook: Hegemonia da TUI pode perigar turismo em Cabo Verde

Com a falência e saída da Thomas Cook, que era o segundo maior tour operator do destino Cabo Verde, o turismo nacional, ou, pelo menos aquilo que, até agora, é a maior fatia do turismo das ilhas, o all inclusive, está praticamente nas mãos da TUI.

O risco, dizem os especialistas, é o mesmo que o perigo de qualquer monopólio. Urge assim diversificar o mercado emissor, os operadores e trazer mais marcas para o país. Caso contrário, continuaremos expostos aos riscos…

Diversificar. Diversificar. Diversificar. Esta tem sido a palavra de ordem de vários especialistas económicos e do sector turístico nacional, nos últimos anos. Uma palavra que nunca fez tanto sentido como agora.

É que a falência da Thomas Cook (TC) Reino Unido, que, juntamente com a TUI, era considerada um dos grandes operadores do turismo nacional, veio por a nu as fragilidades e os perigos do monopólio turístico no país.

Mais do que eventuais danos causados, convém aprender com os erros e evitar novos riscos. “O risco relacionado com o nosso mercado é que agora ficamos dependentes de um único grande operador que aumenta o seu poder de barganha e de impor condições sobre como opera, e se acontecer alguma coisa com esse operador? A situação que está acontecer com a Thomas Cook é um alerta para a dinâmica e precaridade do turismo na modalidade all-inclusive que representa 90% do atual mercado. Por isso, é fundamental diversificar o turismo no país facilitando a entrada de novos operadores, pequenos investidores que em conjunto com as plataformas online e as transportadoras low cost podem contribuir significativamente para a diversidade do nosso destino, o equilíbrio do mercado e a sustentabilidade do país”,
defendeu Amílcar Monteiro, consultor em políticas públicas e investimento, em entrevista ao A NAÇÃO.

Monteiro defende ainda que o país só tem a ganhar se os pacotes passarem a ser vendidos a partir de Cabo Verde, ou seja, que a despesa por turista seja feita junto aos hotéis e comércio local.

“Neste momento, o INE indica que do volume de negócios gerado pelo turismo, apenas 16% é realizado internamente. São evidências que expõem a massiva realidade da operação em modo enclave, ou end-to-end, perante a necessária sustentabilidade do destino”, alertou.

Em 2014, esse volume de negócios era de 25%. O que mostra claramente que tem vindo a diminuir, sendo que a tendência da TUI é incluir tudo no pacote: viagem, hotel, alimentação, entretenimento e excursões.

“O resto é marginal”, adverte Monteiro, consideradndo que o que esta a acontecer é que o turismo fora do eixoSal e Boa Vi sta vem aumentado e diversificando para as restantes ilhas e os dados, diz, são cruéis.

“Enquanto o turista não all-inclusive gasta em média 15 contos por dia, o turista do all-inclusive gasta 2000 mil escudos”.

Mas, como explica, o turismo all-inclusive é tão massivo que, “a média dos gastos, por turista, a nível global, em Cabo Verde já é quatro contos, porque é uma massa de gente”. Os dados constam do último inquérito do INE, sobre o consumo no turismo interno.

TUI fortalece monopólio

Aliás, a TUI, inclusive, recentemente, anunciou a construção de mais dois hotéis em Cabo Verde, um no Sal, orçado em 49,5 milhões de euros, com 614 camas, e outro na Boa Vista – o TUI Magic Life, orçado em 78,4 milhões de euros, com 575 quartos.
Dados que deixam transparecer o aumento em força da sua presença em Cabo Verde e, naturalmente do fortalecimento do seu monopólio.

Além do anúncio destes dois hotéis este Verão, a empresa anunciou também no passado dia 17 de Setembro, que a TUI Airways vai passar a voar com aviões Boeing 767-300ER de Manchester, no Reino Unido, para as ilhas da Boa Vista e do Sal, a partir do próximo Inverno IATA (2019-2020). Conforme noticiou o site Newsavia, os B767 vai substituir os B757 que actualmente voam para as duas ilhas e que transportam turistas para os resorts do Grupo TUI, os resorts RIU. Ao todo são três na Boa Vista e dois no Sal.

Com o aumento da capacidade destes boeings, haverá assim uma maior oferta por parte deste operadorturístico, que, ao que A NAÇÃO apurou, conta com 33% das camas do país. Isto dos 70% de camas que estão nas mãos de três grandes grupos, sendo que o TRG-Meliã detém cerca de 26% das camas e o Grupo Oásis cerca
de 10,9%.

Ou seja, na prática, com o anúncio de mais dois hotéis e o aumento da capacidade dos boeings, a TUI vai reforçar ainda mais o seu monopólio, enquanto grande operador.

Também o especialista e consultor turístico, Victor Fidalgo, se mostra mais apreensivo com a dependência de Cabo Verde em relação a um grande operador, do que propriamente com os actuais impactos da falência da Thomas Cook.

“O impacto quantitativo não é muito grande e pode ser monitorado, mas, do ponto de vista psicológico é muito negativo, porque, em termos de imagem, ficamos dependentes de um único grande operador”, lamenta.

Esse especialista chama por isso a atenção das autoridades e apela ao Governo que tome as medidas que se impõe.
“Esta situação de monopólio afugenta investidores, porque será o operador único a ditar os preços dos pacotes. Assim, os investidores preferem investir em destinos onde há concorrência entre os operadores. Portanto, vendo o futuro, a situação é muito má. Seria o momento de reunir o Conselho Nacional do Turismo para debater a situação”, advertindo, contudo, que, naturalmente, não se pode impedir a TUI de
investir no país, mas chama mais uma vez a atenção para a necessidade de se “diversificar” o destino, marcas e procurar novas fontes emissoras.

Victor Fidalgo vai mais longe e alerta que, actualmente, em Cabo Verde, o “turismo acontece, não é monitorizado”, apelando ao Governo que aposte em mais mecanismos de diálogo com os reais players do mercado.

Recorde-se que a Thomas Cook abriu falência na passada segunda-feira,23, depois de não ter conseguido receber novas injeções de liquidez que lhe permitissem a manutenção das operações.

A falência daquela que foi a empresa que inventou os pacotes de viagens, afectou cerca de 600 mil turistas a nível mundial, mas Cabo Verde não estava na lista de resgate.
Aliás, em Fevereiro passado, a companhia já tinha anunciado a interrupção dos pacotes de Verão entre Maio eOutubro e A NAÇÃO sabe que havia já compromissos de Inverno com alguns hotéis no país, especialmente no Sal.

A falência da Thomas Cook afecta 22.000 funcionários, dos quais 9.000 estão no Reino Unido. Porém, segundo apuramos, a própria TUI já se estaria a posicionar para contratar alguns trabalhadores da Thomas Cook que, inclusive, era o operador parceiro do empreendimento News Horizons, que está em construção na ilha do Sal, mas não era acionista do hotel.

A NAÇÃO tentou ouvir operadores na ilha do Sal, que se escusaram, para já, a prestar quaisquer declarações.

Gisela Coelho

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