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Política

Casa para Todos: Governo cabo-verdiano alerta para inviabilidade de programa com financiamento português

O primeiro-ministro cabo-verdiano afirmou hoje que é “evidente” a inviabilidade do programa “Casas para Todos”, lançado pelo Governo anterior com financiamento português, e alerta para a pressão que representará sobre a tesouraria do país dentro de dois anos.

A posição foi assumida por Ulisses Correia e Silva, em entrevista à agência Lusa, na cidade da Praia, na véspera do anual debate sobre o estado da Nação, que se realiza quarta-feira na Assembleia Nacional, criticando o programa implementado pelo último Governo (2001/2016) do Partido Africano para a Independência de Cabo Verde (PAICV).

Segundo o primeiro-ministro cabo-verdiano, face à inviabilidade do programa, que custou 179 milhões de euros, o Governo de Cabo Verde pediu a Portugal para “renegociar ou perdoar” a parcela de 70 milhões de euros, utilizada para construir casas para famílias de baixo rendimento.

“Para fazer com que, depois, o impacto do pagamento no serviço dívida, a partir de 2021, não esteja a pressionar sobre a tesouraria cabo-verdiana, porque não vão entrar os correspondentes recursos. São casas que estão distribuídas com valores residuais e ainda por cima em renda. Quer dizer, não há uma correspondência de recuperação pela venda”, alertou Ulisses Correia e Silva.

O tema já foi abordado entre os dois governos, na cimeira bilateral realizada em abril último, em Lisboa, e a proposta cabo-verdiana seguiu, entretanto, para o Ministério das Finanças português.

“As duas hipóteses [reestruturação ou perdão da componente de 70 milhões de euros] estão em aberto, conforme os mecanismos disponíveis para o Governo português”, salientou Ulisses Correia e Silva, reconhecendo a disponibilidade já demonstrada pelo executivo de António Costa.

Esse pedido envolve a componente do financiamento da construção das denominadas casas Classe A. “São famílias que não têm condições de se financiarem junto do sistema bancário, nem têm poupanças para comprarem casas de 28.000 euros (…) Isso quer dizer que a inviabilidade [do programa] é evidente”, sublinhou o primeiro-ministro e líder do Movimento para a Democracia (MpD), no poder desde 2016.

O programa, lançado em 2010 pelo Governo do PAICV, previa a construção de 6.010 habitações, com o objetivo de reduzir o défice habitacional, mas registou vários problemas, e, além da dívida da linha de crédito, acumulou dívidas em indemnizações e juros de mora às empresas construtoras.

Uma auditoria feita pelo atual Governo apontou falhas na concessão e nas projeções financeiras do referido programa.

As críticas de Ulisses Correia e Silva alargam-se ao programa de construção de 17 barragens, lançado também pelo anterior Governo e envolvendo igualmente financiamento e empresas portuguesas. Desse total avançaram sete, que se ressentem da seca que o país vive desde 2017, enquanto três apresentam problemas técnicos e vão ser alvo de investigação por parte de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, que iniciou funções na semana passada.

“O que correu mal foi a intensidade. Fazer de uma forma intensiva a construção de barragens, num país em que tendencialmente chove pouco e para ter água é preciso haver chuva”, afirmou Ulisses Correia e Silva, criticando a opção anterior, de concentrar o investimento para mobilização de água nas barragens.

Acrescentou que além da seca, há problemas nos estudos da construção destas barragens, afirmando que algumas foram edificadas em zonas sem capacidade de retenção, apesar dos alertas da população aquando das obras.

“Houve problemas técnicos e depois os problemas políticos associados que levaram a essas situações. E nós estamos a falar de mais de 50 milhões de euros de investimentos em barragens”, acusou Ulisses Correia e Silva.

Para o governante, o programa de barragens deveria ter sido experimental: “Há responsabilidades políticas, isso há, seguramente. Porque todo o investimento que foi feito demonstra, hoje, que os resultados não são correspondentes ao volume de investimentos e estamos a falar de dívida externa. Quase toda a parte do capital suportado pelos contribuintes cabo-verdianos e uma parte de bonificação da taxa de juro que é suportada pelos contribuintes portugueses”.

Pelo menos três destas barragens têm “problemas técnicos”, de funcionamento, sem resolução à vista. “As outras têm problemas porque não chove e fica com um investimento aí, sem utilidade prática”, lamentou.

Questionado pela Lusa sobre o programa de obras públicas, o primeiro-ministro defendeu que Cabo Verde “não precisa de elefantes brancos para depois inaugurar”.

“Prefiro grandes obras privadas, investimento privado que cria emprego, que cria rendimento, que cria sustentabilidade”, afirmou Ulisses Correia e Silva, acrescentando que a infraestruturação vai continuar, mas com parcerias público-privadas e “não através de endividamento público”.

Prometeu ainda que a obra do futuro Terminal de Cruzeiros na ilha de São Vicente vai para concurso público “no início do próximo ano”, e que o novo porto na ilha do Maio também avançará em breve.

A prioridade, concluiu, passa por “desencravar localidades” e não por “obras faraónicas” e de “utilidade duvidosa”.

Lusa

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