A Agência de Aviação Civil (ACC) receia perder a competência de regulação económica com a concessão da gestão dos aeroportos. Para essa agência de regulação, a opção de passar a competência de fixação de taxas aeroportuárias para a empresa concessionada, pode comportar riscos “incomensuráveis” à actividade do sector.
A Agência de Aviação Civil (AAC) considera que o Estado não deve abdicar-se da sua responsabilidade em matéria de segurança (safety e security) e de supervisão económica, no processo de concessão dos aeroportos de Cabo Verde.
Num parecer ao projecto de Lei que aprova o regime jurídico da concessão do serviço público aeroportuário de apoio à aviação civil, a AAC diz que não é contra à existência de privados nas actividades de aviação civil.
Defende, no entanto, que para o sucesso da concessão, ser construído um processo, que garanta que os regulador esteja munido de instrumentos que o permitam desempenhar com “zelo e profissionalismo”, o papel que o Estado, os operadores e a sociedade civil, esperam dele. “Não pode haver um regulador de excelência, quando este não esteja na posse de informações e competências que lhe permitam exercer o seu poder”.
A AAC considera que “há uma pretensão” em diminuir os poderes de regulação económica dessa agência, “situação que poderá a curto/medio prazo, ter implicações negativas no mercado da aviação civil nacional, com o aumento de ineficiências no mercado (aumento de custos) e, com implicações directas na economia e na sociedade.
O parecer realça ainda que a referido projecto de Lei revoga todas as competências de fixação ou aprovação das taxas aeroportuárias pela AAC, reservando essa competência à empresa que vier a ser concessionada para gerir os aeroportos.
Esta opção, na óptica da AAC poderá comportar riscos “incomensuráveis” à actividade do sector, “com impacto directo praticados na indústria e, logo, na circulação de bens e mercadorias, no crescimento do turismo e na economia”.
“Atribuir a um privado a prerrogativa de fixar e aprovar as suas próprias taxas poderá representar aumentos exagerados nos preços, com perda de competitividade do sector e do país, com reflexos ao nível do trafego e do turismo”, realça a AAC que diz entender que o secesso de na transferência de um serviço de “vital importância” para a economia, das mãos do Estado para um privado, “só pode ser garantido com o fortalecimento dos poderes do regulador, particularmente nas questões de tarifárias e de qualidade do serviço”.
Modelos de concessão
A AAC lembra que a ICAO é “taxativa” e afirma que, nos processos de concessão aeroportuária, “a escolha do modelo deve ter em consideração a realidade de cada país, de cada mercado e o ambiente à volta do aeroporto. Os modelos de concessão giram em torno do “Single till” ou “Dual till”, mas A NAÇÃO sabe que ainda não há uma definição clara sobre esse aspecto.
No “Single till”, a receita de todas as actividades aeroportuárias entram no cálculo das taxas reguladas, podendo haver subsidiação cruzada entre os aeroportos. Já no “Dual till”, só entra no cálculo das taxas reguladas a receita comercial do negócio aviação.
Contudo, a AAC desaconselha a adopção do modelo de regulação económica “Dual till” no próprio diploma, por considerar que é um assunto que deverá ser remetido para o contrato de concessão, por forma a evitar o condicionamento de negociações futuras. Alerta ainda que o modelo de “Dual till” significa que “não haverá possibilidade de subsidiação cruzada entre os negócios aeronáuticos e os negócios não aeronáuticos”.
Outros alertas
O antigo presidente do Conselho de Administração da ASA, Mário Paixão, também lançou um alerta, na rede social Facebook, considerando que o Governo está a “fazer tudo ao contrário”, no que tange à decisão de alterar o diploma que regula a concessão dos aeroportos.
Segundo Mário Paixão, em Dezembro de 2018 o director-geral e CEO da IATA (Associação Internacional de Transporte Aéreo, que congrega mais de 280 transportadoras em todo o mundo), chamou a atenção dos Estados para os cuidados a ter com a privatização dos aeroportos, seja por concessão, seja por venda de activos, e reforçou as críticas da IATA ao modo como as concessões são feitas no mundo.
As críticas, conforme a mesma fonte, são sustentadas por um estudo conduzido pela consultora McKinskey, cujas conclusões revelaram que as privatizações encareceram os serviços aos consumidores, elevaram custos às companhias aéreas e não trouxeram ganhos de eficiência substanciais.
Conforme o antigo PCA da ASA, até à data, as decisões estratégicas que nortearam a gestão da FIR Oceânica do Sal e dos aeroportos, sob a alçada da ASA, propiciaram um salto qualitativo sem precedentes na construção de um sistema de aviação civil dinâmico e sustentável, viabilizando ainda uma rede aeroportuária capaz de catalisar o turismo e o negócio aéreo.
“No processo de separação que agora se engendra, o Vice-Primeiro Ministro afirmou, de forma confusa, que a FIR é uma “CASH COW” (Vaca Leiteira) e que o Filet Mignon ficará no Estado, enquanto a vaca magra “Rede de Aeroportos deficitários” vai para o privado. Dá para entender”, relata Mário Paixão que considera que tais afirmações são “desajustadas”.
“Os benefícios resultantes da FIR Oceânica do Sal foram e continuam a ser importantíssimos para a segurança da navegação aérea no corredor Europa-América do Sul e, desde logo, para Cabo Verde, tanto mais que dela resultam receitas que possibilitam a sustentabilidade da ASA, o desenvolvimento de outras infra-estruturas aeroportuárias e de navegação aérea e o apoio ao funcionamento de outras entidades nacionais como a Guarda Costeira, o Instituto de Meteorologia e Geofísica e a Agência da Aviação Civil”, esclarece.
De referir que o Governo já fez saber que pretende concessionar o sector aeroportuário pelo período de 50 anos. Um dos interessados no negócio é a francesa Avinci, actualmente gestora do aeroporto de Lisboa (Portugal).
DA
*artigo publicado na edição 616 do jornal impresso A NAÇÃO
Concessão dos aeroportos: ACC considera que há “pretensão” em diminuir os poderes da regulação
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