Por: Ricardino Neves
1.Introdução
Com a inviabilização da aprovação da Lei das Regiões Administrativas ocorrida no plenário da Assembleia Nacional (AN) pairam no ar duas ideias contrárias consoante a perspectiva de se apoiar ou não a ideia da Regionalização .
Para os não apoiantes tal situação representa o “enterro” da ideia de Regionalização dada a dificuldade de se conseguir a maioria necessária de dois terços na AN. Assim sendo para esses opositores o assunto está encerrado.
Para os apoiantes da ideia da Regionalização a questão bem que se pode resumir na frase QUE FAZER?
Uma reflexão se mostraria necessária e conveniente sobre o caminho percorrido e uma análise dos aspectos positivos e negativos do processo de discussão.
Mas claramente esse não é o caminho a seguir . Os actores políticos em Cabo Verde têm-se mostrado pouco “humildes” para assumir erros e corrigir atitudes.
Assim sendo, só resta apelar para uma tradução na prática da afirmação de não se estar perante “promessas” mas sim perante “compromissos”.
Afinal , quem defende uma ideia deve lutar para que ela seja posta em prática.
2. S.Vicente e a Regionalização
Já muito se escreveu do porquê de S.Vicente ser o centro onde a ideia da Regionalização ganhou força e se espalhou pelo Cabo Verde inteiro .
Também me parece pouco aceitável a tese de que S.Vicente reclama de barriga cheia , porque dispõe de indicadores socioeconómicos melhores do que o resto do pais, a tal teoria( e porquê não dizer também prática efectiva) de que S. Vicente deve parar e “ficar à espera dos outros subirem de nível ”.
A disponibilidade e o apego das gentes de S.Vicente à Regionalização é ,nem mais nem menos, a descrença de que um Governo central venha a fazer aquilo que não pode (ou não quis) fazer em 44 anos de Independência : traçar um caminho que conduza ao efectivo desenvolvimento socioeconómico que a Ilha aspira.
Deseja um poder mais próximo das populações e que procura garantir uma melhor correspondência entre os anseios das populações e as respostas que terá desse poder.
Como se afirma no Programa do Governo ,um poder capaz de tratar “ a ILHA em todas as suas dimensões : economia, infraestruturas, ambiente,educação ,formação, saúde”.
Mais, penso que a população quer assumir esse risco, porque situação pior do que já está é muito difícil. É razoável querer impedir isso?
E se assim se acredita naturalmente se pode esperar que o Governo central que, em princípio também assim pensa , poderá avançar com uma EXPERIÊNCIA PILOTO PARA A ILHA DE S.VICENTE .
Parte-se do pressuposto de que há vontade política por parte do Governo e do Partido MPD que o suporta politicamente no sentido de , pela via da Descentralização, combater o “inegável centralismo do País ,a partir da Praia que ao longo dos anos ,tem feito crescer as assimetrias do Território caboverdeano ,nomeadamente entre a Capital do País e as demais ilhas ou regiões que compõe o arquipélago”.
Também que, nada como a prática, para comprovar qualquer ideia ou teoria .
Pretende-se que , com essa opção, S.Vicente, por mérito próprio e das suas gentes, poderá sair do patamar em que ele está, para um nível que se espera superior de desenvolvimento no qual ele passará a ter um papel activo.
3. Esboço dum possível “QUADRO INSTITUCIONAL”
A experiência PILOTO consta do programa do Governo para a legislatura.
Se inicialmente se escolheu uma abordagem dum projecto de Regionalização para todo o País que não resultou, nada mais normal do que realizar uma experiência piloto com o OBJECTIVO SINCERO de demonstrar que a ideia vale como tal e que nada como a Ilha de S.Vicente para o comprovar.
Sendo a Regionalização co-portadora das ideias de Descentralização, Democratização e Desenvolvimento, penso que a essa experiência piloto seria uma possibilidade de dar conteúdo concreto a essas ideias dentro do quadro legal existente.
Indicamos a seguir, para necessária reflexão, alguns traços dos contornos dum possível quadro institucional que possa dar corpo à ideia.
Pretende-se que, com essa opção,S.Vicente poderá sair do patamar em que ele está, por mérito próprio e das suas gentes, para um nível que se espera superior de desenvolvimento no qual ele passará a ter um papel activo.
3.1 Nomeação dum Ministro Adjunto
O Sr. Primeiro Ministro poderá designar um Ministro Adjunto do Primeiro Ministro para a Ilha de S.Vicente .
Esse Ministro terá que ter um perfil político e técnico adequado ,longe das lógicas puramente partidárias que na maior parte das vezes guiam as nomeações para cargos executivos.
Ele terá que ser capaz de mobilizar as forças vivas locais e poder dialogar para além da esfera MPD. Desejavelmente quase que diria que deverá ser um “independente” próximo do MPD.
Alguém capaz de, juntamente com os pares que escolherá, encarnar a ideia expressa no Programa do Governo a propósito da Regionalização : “Governação da Ilha, com governantes política e tecnicamente bem preparados, identificados com a Ilha, conhecedores da Ilha e engajados com o desenvolvimento da Ilha”.
Essa figura de Ministro Adjunto até que não é nenhuma novidade institucional para S.Vicente podendo encontrar eco no passado, nos Ministros Adjuntos da I República e nos Governadores Civis da II República.
Uns e outros acabaram por serem figuras pouco intervenientes, meramente (ou quase) protocolares, dado que a nomeação não foi acompanhada de efectivas atribuições e competências para a função .
3.2 Atribuições e competências do Ministro Adjunto
O Ministro Adjunto e sua equipa terão , grosso modo ,as atribuições e as competências que constam do projecto da Lei das regiões Administrativas para a Junta Regional ,com as necessárias adaptações, tudo a ser expresso no respectivo diploma orgânico.
O Ministro Adjunto terá a liberdade para designar , de preferência entre os actuais quadros técnicos superiores da Administração Pública, os demais elementos para constituir a equipa executiva para administrar a Ilha e isso, de modo a limitar as despesas adicionais desta nova estrutura administrativa .
O Ministro Adjunto e sua equipa deverá “focar a Governação da Ilha em funções económicas, com políticas integradas consonantes com a sua especificidade, vocação e especialização; planear o desenvolvimento económico e social da ilha e assumir a responsabilidade política pela sua implementação ;ordenar o território; gerir determinados serviços que hoje estão a cargo de serviços desconcentrados do Estado; aumentar a capacidade de financiamento do desenvolvimento da Ilha através de Sociedade de Desenvolvimento Regional”.
Do mesmo modo o Ministro Adjunto, em articulação com os respectivos responsáveis ministeriais, poderá promover a mobilidade de quadros actualmente afectos à Administração Central , que assim o queiram, de modo a garantir a progressiva dotação dos quadros regionais das competências técnicas necessárias ao desempenho das tarefas de desenvolvimento .
3.3 Conselho Consultivo Regional
Deverá ser criado um Conselho Consultivo Regional ,constituído por personalidades residentes na Ilha e representativos das forças vivas locais, cabendo ao Ministro Adjunto propor os membros para o integrar .
Este órgão terá funções meramente consultivas mas a sua auscultação deverá ser obrigatória para questões importantes para a ILHA como a aprovação do Plano de Desenvolvimento Económico e Social, do Plano Anual de Actividades e do Orçamento.
PS : Os textos “entre aspas” são extractos do preâmbulo da proposta de lei para a criação das Regiões Administrativas.