Por: Natércia Reis Gaspar*
Hoje tenho a bênção de vos falar a partir da Ilha de Santiago, em Cabo Verde, uma antiga colónia portuguesa cuja independência consegue a 5 de julho de 1975.
Um processo que por cá não deixou os traumas que deixou noutras ex-colónias.
É uma bênção porque viver de perto o dia a dia deste povo é uma lição de vida, de simplicidade, de genuinidade de alegria!
Para esta gente é preciso muito pouco para serem felizes.
Pouco planeiam as suas vidas, vivem à base do acontece e se acontece acolhem com alegria.
As suas vidas deslizam, com maior ou menor dificuldade, como os seus corpos que em cada movimento parece que respondem a uma nota musical.
Sim, os seus corpos têm musicalidade tal como o mar, a natureza, a cultura, enfim as suas vidas!
Não é tudo fácil! Diria não é nada fácil! Em Santiago a terra é árida e inospita, não há muita água. Não chove há 2 anos por cá. Já imaginaram estarmos 2 anos sem chuva nos Açores.
Por cá, praticamente tudo é importado, o que encarece o custo de vida num país cujo salário mínimo é de 150,00€.
Faz-nos pensar como conseguem viver, pois o custo de vida é praticamente igual ao nosso. Mas o facto é que conseguem com muito trabalho. É frequente ver nas ruas as mulheres a venderem fruta, peixe, milho, biscoitos, etc. para comporem o orçamento familiar.
Mas, o sorriso, o brilho dos olhos, a boa disposição o afeto não desaparecem e contagiam!
Está efetivamente a ser uma experiência fantástica, mas também me interpela. Põe-me em confronto com o pior que temos na nossa suposta civilização. Sim, porque ser civilizado não é de certeza viver para o trabalho, com stress para ganhar o dinheiro para conseguir dinheiro e ceder ao apelo constante ao consumismo e não estar presente na vida dos filhos, da família.
Ser civilizado não é seguramente morar uma vida inteira no mesmo sítio sem dizer bom dia ou perguntar como vão?
Ou criar uma redoma à nossa volta para nos proteger, não deixamos as nossa crianças brincar na terra, sujarem-se e cada vez mais a nossa imunidade está fragilizada expondo-nos a outras tantas doenças.
Sim vou partir daqui a questionar de que vale tudo o que temos, alegadamente num país desenvolvido, mas, no que toca às almas humanas, perdemos algures no tempo os afectos e o cuidado pelos outros…
*Jornalista da Rádio 105 FM – Açores (Portugal), de visita a Cabo Verde