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Opinião

Regionalização – Constatações e contradições do debate (III)(Conclusão)

Por: Ricardino Neves 
 

8. Custos da regionalização

Um dos argumentos esgrimidos para se negar a Regionalização foi a tese dos custos “elevados “que essa reforma representa(rá). Para isso muito terá contribuído a “hesitação” inicial com que essa questão foi abordada .

O MPD aparentemente “desconhecia”(?!) esse dado. Começou por afirmar de que o custo era suportável, depois avançou com uma quantificação inicial em percentagem do PIB , acabou por se fixar num valor rondando os quatrocentos mil contos.

Se isso poderia ser suficiente para quem quisesse discutir o assunto de boa fé, esse valor passou a ser questionado pelos oponentes à Regionalização por “supostamente” não contemplar todos os custos.

O evidente foi “esquecido” deliberadamente. É que tudo custa. Não há nada de graça. Mais ,qualquer custo tem que ser comparado com os benefícios que lhe estão associados.

Essa estratégia de contestar a ideia da REGIONALIZAÇÃO pela tese do seu custo tem expressão máxima no preâmbulo da proposta do PAICV de que , face ao custo da mesma, a Regionalização só se poderá fazer, com prévia Reforma do Estado para sua redução.

A ideia do custo acaba por “obscurecer” o debate e suportar as teses que defenderam, entre outras soluções, a junção Município-Região para parte das Ilhas ,a redução do número de deputados da Assembleia Nacional , o agrupamento de Ilhas, mas “ignoraram”  o custo actual do Centralismo para esse País.

Dados  recentes espelham alguns custos que o Estado central se permite perante a indiferença generalizada :

-Um milhão de contos para remodelação da Assembleia Nacional

-Setecentos mil contos em estudos de consultoria para a TACV,”metidos” na gaveta

-Seiscentos mil contos para deslocações e estadias no OE 2019

-Quatrocentos mil contos para reestruturação da Comunicação Social do Estado

-Sete milhões de euros (setecentos e setenta e dois mil contos) para compra de carros eléctricos para futura frota do Governo

Para não falar dos custos de irrealizável quantificação que o Centralismo impõe a todos os cabo-verdianos como a desertificação do território com o despovoamento de parte das Ilhas , a ausência e (ou) deficientes serviços na periferia ,os problemas da concentração urbana na Praia como a segurança, saúde, habitação ,saneamento básico com gastos elevados sem contudo se  obter resultados satisfatórios, etc.

9. A questão do “tamanho” da região

Outro aspecto que dominou o debate da Regionalização foi a questão do espaço geográfico  que deveria delimitar a Região .

Sendo Cabo Verde geograficamente um arquipélago bem que se poderia esperar que a  dimensão natural seria a ILHA .

Se tal entendimento natural mereceu reticências da parte de alguns que apontaram a  pequenez do País, de registar o facto das propostas do MPD e do PAICV consagrarem o “tamanho “, ao atribuírem  a Santiago uma divisão em duas Regiões.

Para uns a extensão física da ILHA justifica tal divisão, para outros a razão de tal divisão será por ter grande número de municípios.

Em relação à divisão de Santiago em duas Regiões poucas foram as vozes que se levantarem contra este tratamento “diferente “. Coincidência ou não, essas vozes quase sempre foram de “não naturais e de não residentes” em Santiago.

Pouca gente nascida e (ou) vivendo em Santiago  assumiu posição (corajosa??!!!) de defender a condição “unitária “ da Ilha de Santiago e o sentido “globalizante” que a Regionalização subentende.

Mas se o tamanho como critério não “apoquentou” grande parte dos intervenientes no que a Ilha de Santiago diz respeito, foi evidente que esse critério “mexeu” com a sensibilidade de figuras gradas da nossa praça, para os quais , havia Ilhas muito pequenas para serem Regiões.

Ignoram a ideia fundamental de que a solução deve ser a mesma para todos as Ilhas, tendo sòmente que ser ajustada à medida de cada uma.

Muito amarrados à tese de que as Regiões eram estruturas “supramunicipais” em vez de serem entendidas como “infra estaduais”, ou seja, defendendo a ideia de que a Região provinha dos municípios e não do Estado central ,viram assim uma sobreposição injustificada, nas Ilhas (5 em nove) em que havia um só Município .

Se o Município é o que é e a Região o que vai ser, duas estruturas diferentes no tempo e no conteúdo , onde poderá haver “sobreposição”?

O “tamanho” até que se traduz numa “vantagem comparativa” porque a pequenez representa uma maior facilidade de apreensão dos problemas e da sua resolução.

“Pequenas” Regiões terão mais possibilidade de verem os seus problemas resolvidos mais rapidamente e com mobilização de menos recursos  e ,após isso, só restará garantir a manutenção e (ou) a elevação do grau de satisfação da sua população.

Essa abordagem do “tamanho” choca contra ditados populares  correntemente aceites como  “tamanho não é documento” ou que “os homens não se medem aos palmos”.

10 . Jobs for the boys e (ou) a desigualdade de oportunidades

Outra tese muito defendida pelos detractores da Regionalização foi a de que a mesma irá gerar “jobs for the boys” .

Tal ideia reduz os “lugares” da futura Administração Regional a lógicas de favorecimento dos quadros partidários.

Ao dizer isso estes reticentes quiseram esquecer o que pretende ser a Regionalização .

Em primeiro lugar os cargos regionais são eleitos pelo que não faz sentido essa “acusação”. Cargo eleito é atribuído por decisão soberana do voto da população e portanto não é nem pode ser “dado”.

Em segundo lugar os futuros funcionários regionais  sairão pura e simplesmente dos actuais quadros da Administração Pública Central.

É que ,com grande parte das competências actualmente centralizadas atribuídas às Regiões, os quadros que se ocupavam dessas tarefas serão progressivamente transferidos da Administração Central para a Administração Regional. E eventuais recrutamentos  sê-lo-ão por concurso público , previsivelmente local.

Assim não há lugar à “entrega de lugar” a militantes partidários .Mas “admitindo “a tese  os apoiantes da Regionalização, ao  alinhar com os detractores dela, acabam por se mostrarem contrários aos interesses regionais.

Os “jobs for the boys” estão maioritariamente na Capital sendo que regionalmente esses cargos são pouco expressivos em número e importância.

Raros são os cargos de dimensão nacional nas poucas empresas públicas que não tem sede na Capital só restando para a periferia cargos como os Delegados Regionais.

Se a Regionalização for como dizem “jobs for the boys”, tal representa(rá) uma oportunidade para  as regiões passarem a usufruir dessa “possibilidade”.

Isso resulta(ria) numa maior democratização(!!!) do acesso , com oportunidades para a periferia que deixaria de ver tal “facilidade”  um exclusivo da Capital. Ou seja ,havendo jobs ,à periferia também caberia sua “parte”.

Assim , o sentido do rigor, da pureza e da perfeição da solução que muitas vozes anti- centralista adoptaram , acabou por se traduzir numa aliança com os centralistas que pretendem e vão conseguindo com que tudo fique na mesma .

Nota Final

Ao longo destes três artigos de opinião exprimi o meu ponto de vista sobre alguns aspectos da  discussão entretanto verificada sobre o tema Regionalização.

Pretendi chamar a atenção para questões que deverão merecer atenção dos defensores do fim do centralismo neste País, no futuro debate da Regionalização.

Sendo certo que o sistema centralista de governação precisa ser mudado para bem da Nação ,há que continuar essa luta para a mudança desejável e necessária.

Cito um amigo meu para traduzir o espírito que me animou em todo esse debate: quando alguém a quem bates à porta há muito tempo a entreabre, o que deves fazer é meter o pé de modo a entalar a porta, para que ele não volte a fechá-la .

Parece-me que essa primeira oportunidade foi desperdiçada. Que aproveitemos a próxima.

Caboverdeanamente! 

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