PUB

Opinião

Santa Catarina de Santiago: Do Centralismo de 5 ruas ao Policentrismo Territorial

 

Por: Armindo Freitas*

1. Considerações preliminares

Santa Catarina ocupa a parte Central e Litoral Oeste de Santiago, fazendo fronteira com 5 Municípios e é o maior da ilha com 207km2, (22% da superfície de Santiago), integrando 51 localidades. Em termos populacionais, o município posiciona-se no 2º lugar (43.297hab), representando 15.8% da população da ilha e o 3º a nível do país (8%). A cidade de Assomada, praticamente única área urbana do concelho, perfila-se como maior centro urbano da “região” Norte e o 2º da Ilha.

Tem registado uma tendência de vertiginosa concentração demográfica na cidade de Assomada (evolução do peso da população urbana de 8,2%, em 1990, 14,1% em 2000 e 27,8% em 2010) em detrimento da erosão demográfica do espaço rural.

Uma das suas principais características tem a ver com desarticulação e desequilíbrio de desenvolvimento entre as áreas rurais e urbanas. Isto porque as transformações territoriais têm ocorrido sem uma visão pública de conjunto, apenas subordinadas à pressão sociodemográfica e às lógicas do mercado e, nunca apoiadas pelo planeamento municipal.

Como se não bastasse, enquanto o centro (5 ruas) é o palco de mais de 95% de execução do orçamento municipal, as periferias continuam de mãos estendidas às migalhas do poder público local. A título de exemplo, em 2018, executaram-se os quase 800 mil contos do orçamento efetivo da Câmara (incluindo despesas de funcionamento). Deste montante foram executados menos de 10 mil contos em investimentos rurais e, para 2019, prevêem-se os tristes 1000 contos para agricultura, pesca e criação de gado.

2. Policentrismo territorial como modelo viável para Santa Catarina

Santa Catarina, para além das cerca de 40 localidades, todas com vocações especificas de interesse para exploração e potencialização, encerra 6 centralidades de realce para o seu desenvolvimento, a saber: Rincão, Chã de tanque, Telhal de Engenhos, Ribeirão Manuel, Cruz Grande e Ribeira da Barca.

Temos defendido noutras paragens que o desenvolvimento efetivo e sustentável do município deverá passar pela (re)organização e integração do povoamento rural numa estratégia global de desenvolvimento do território municipal a par do desenvolvimento de projetos integrados de (re)qualificação do espaço urbano.

Em Santa Catarina verificam-se acentuados desequilíbrios de desenvolvimento entre o meio rural e o meio urbano. Por um lado, o único centro urbano (Cidade de Assomada) é caracterizado pela concentração das infraestruturas, equipamentos e serviços; por outro, as localidades rurais são marcadas pelo défice dessas mais-valias territoriais. Situação que tem desencadeado fortes movimentos migratórios para a Cidade de Assomada, com repercussões negativas tanto para a Cidade como para o meio rural: expansão urbana descontrolada e despovoamento e abandono do campo com reflexos negativos na produção agropecuária e na paisagem rural. Por isso, as estratégias e políticas públicas de ordenamento e desenvolvimento do município, a adotar, devem promover o desenvolvimento dos aglomerados rurais, aproveitando das suas vocações e potencialidades, de modo a reter as suas populações e, consequentemente, reduzir a pressão demográfica sobre a Cidade de Assomada.

As políticas territoriais devem conduzir a um desenvolvimento coeso e harmonioso, reduzindo os acentuados desequilíbrios de desenvolvimento entre as diferentes localidades que compõem o território municipal. É necessário definir pequenas centralidades no meio rural, com equipamentos coletivos que garantam a prestação de serviços básicos de apoio à população nas áreas de educação, saúde, administrativas, sociais e na infraestruturação que dinamizem a diversificação de atividades e que valorizem e estimulem investimentos no espaço rural, contrariando a tendência crescente de marginalização dos espaços rurais. O que tem falhado redondamente, na última década, em termos de políticas públicas locais, hipotecando o desenvolvimento do município.

Neste quadro propusemos o policentrismo (rede de centros de níveis diferentes, mas interligados) como sistema territorial meritório e determinante para inverter a tendência de concentração exponencial da população em Assomada e de erosão demográfica e definhamento do espaço rural. Hoje, o policentrismo é apresentado como uma das respostas possíveis para a resolução dos desequilíbrios regionais mais perenes. O policentrismo, apesar de não reunir unanimidade, tem fundamentado grande parte das atuais políticas de ordenamento e de desenvolvimento do território no espaço europeu. Entendemos que este sistema territorial irá dar atenção às relações de proximidade estabelecidas entre as áreas urbanas e os territórios periféricos, de natureza rural.

É preciso mudar de visão e agenda, reorganizar e integrar os espaços rurais numa estratégia global de desenvolvimento municipal, assentes na infraestruturação do povoamento do espaço rural, no reforço de equipamentos coletivos como referências dos aglomerados rurais, no incremento da mobilidade rural e na exploração dos recursos humanos, históricos, culturais, patrimoniais e naturais das áreas rurais.

Esta (re)organização do território deve passar pela criação, reforço e consolidação de pequenas centralidades especializadas de acordo com as suas vocações, complementares entre si, ao envolvente e ao centro urbano já consolidado (Assomada).

O sistema urbano viável deve favorecer a descontinuidade urbana (com a criação de outros centros) intercalada pelas áreas rurais, onde se combinam as dinâmicas de dispersão (não no sentido de casas isoladas, mas sim no reforço de outras centralidades) e de aglomerações, onde o rural e o urbano se fundem. As novas centralidades funcionarão como nós do sistema policêntrico, que irão articular as áreas rurais na dinâmica do desenvolvimento do município, e reforçarão a continuidade territorial dos processos económicos e sociais.

O (re)ordenamento do território municipal deverá favorecer o aproveitamento otimizado dos recursos territoriais disponíveis nas lógicas dos princípios da sustentabilidade, procurando, sempre que possível, as sinergias rurais e urbanas positivas.

Trata-se de uma nova geometria territorial de uma estrutura funcional que responda as necessidades das populações, que determina o reencontro unitário entre a comunidade rural e urbana e que promove a renovação produtiva agropecuária, industrial e turística, geradora de dinâmicas de desenvolvimento do município.

Daí, urge o repensar e a mudança de visão, de paradigma e de agenda de transformação, colocando enfâse nas potencializes singulares dos principais núcleos do novo sistema territorial: Rincão, Chã de tanque, Telhal de Engenhos, Ribeirão Manuel, Cruz Grande e Ribeira da Barca.

Na simulação de um sistema territorial para o município, os aglomerados supra referidos, pelas suas demografias, pelos seus recursos naturais (solo, subsolo, flora, fauna, as águas subterrâneas e superficiais, o mar, etc.) e pelas suas localizações face à rede viária existente se posicionam como possíveis centralidades a reforçar: centros de prestação de serviços básicos à população rural, de novos investimentos e geradores de novas dinâmicas de desenvolvimento local.

*Mestre em Gestão do Território

PUB

PUB

PUB

To Top