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Opinião

Olhar 15

 

Por: Natacha Magalhães

Dentro de uma semana, estaremos a acompanhar o debate parlamentar mais aguardado do ano: o estado da Nação. Sem novidades, será aquele momento em que os protagonistas da cena politicam nacional trocarão argumentos e até ofensas, ignorando ou nem se dando ao trabalho de pensar que, quase trinta anos de democracia, nós, os cidadãos, não somos os mesmos, logo, estamos acima dos debates que se fazem na casa do Povo.

1. Nesse exercício olhar a Nação, está claro que Cabo Verde vive um momento bastante complexo. Somos confrontados por uma realidade que não deixa margem para desconsiderações. Há coisas que o governo não pode controlar, como o facto de não ter chovido e de estarmos novamente sob o espectro de mais um ano de seca. Mas há outras que sim. Da economia à justiça, passando pela segurança, educação, saúde, mobilidade, o país, precisa urgentemente de mudanças (diria até de um compromisso ético e responsável de toda a máquina governativa e da Oposição de modo a acelerar a economia, conter os gastos públicos e, consequentemente, assegurar o seu crescimento e desenvolvimento. O país precisa urgentemente de crescer. O recado está dado pelo GAO, que veio a Cabo Verde dizer que o crescimento previsto para 2018, ficará “aquém desta dinâmica” e advertindo para o risco de deterioração, caso não se avance rapidamente com a reestruturação das empresas públicas e com outras reformas estruturais. Por outro lado, permanece o risco de sobre endividamento. Como conseguir isso? Uma delas passa necessariamente por emagrecer o Estado, cortar gastos exorbitantes que mais não servem do que para alimentar vaidades e interesses pessoais; tornar as instituições eficientes, com aposta nas novas tecnologias, capazes de darem respostas mais céleres às empresas e aos cidadãos.  A inovação deve ser posta ao serviço da celeridade e da modernização e nisso há toda uma juventude capaz de protagonizar a mudança.

2. Os transportes continuam sendo deficitários, não obstante os últimos acontecimentos marcados pela chegada de dois aparelhos para voos internacionais. Mas e o hub do Sal, que encareceu as viagens internacionais e fez com que os aeroportos de São Vicente e da Praia perdessem a anterior dinâmica, tem dado certo? Agora, já não é só uma questão de termos dificuldades em viajar entre as ilhas e de ser quase que impraticável ir para fora cá dentro dado aos valores praticados pela companhia monopolizadora do mercado. Sobre esta, ainda continua por esclarecer os meandros do acordo de prestação de serviços e, enquanto isso, não passa despercebido o silêncio cúmplice da reguladora do setor. Assim como os muitos silêncios que se fizeram sentir quando uma jovem perdeu a vida e cuja morte foi atribuída a problemas cardíacos, sem que uma autópsia fosse realizada. Por muito que se tente encontrar justificativas, não é aceitável que num país com o ritmo de desenvolvimento que conquistou, não tenha ainda respostas para situações de emergência e que se trate com ligeireza assuntos sérios. Há quem insista em recorrer ao passado para justificar que também na natorior governação nada foi feito. Sim, é verdade. Por resolver ficou a montagem de um sistema de respostas à situações de emergência. Porém, é preciso recordar que as vozes que se levantaram a quando da erupção do vulcão do Fogo e do naufrágio do navio Vicente.  E também lembrar que quem governa não pode viver em permanente regresso ao passado. Esse foi avaliado e tem hoje tempo para refletir sobre os erros.

3. Já houve manifestações de insatisfações protagonizas por classes profissionais. Porém, vive-se hoje um constante clima de instabilidade social traduzida em manifestações populares e em greves. A da Policia Nacional, as manifestações de Mindelo, Boa Vista e Praia e um pouco por todo o país não devem ser vistas como formas de criar caos ou beliscar a estabilidade social do país, nem analisadas sob o prisma da quantidade de pessoas. Antes, devem servir como um alerta à governação e de que é o momento de se redesenharem caminhos. Haverá sempre o argumento do tempo. O tempo do governo e o tempo dos cidadãos e dos empresários quase nunca são coincidentes, mas em face às expetativas criadas e compromissos assumidos, a paciência de muitos chegou no limite socialmente suportável. Cabe ao governo dialogar e encontrar soluções.

4. As mais recentes ocorrências mostram que o país já não é o mesmo.  Os novos contornos dos crimes, o aumento dos casos de abuso sexual de menores, o desaparecimento pessoas, principalmente de crianças, com o desfecho que teve o caso Edvanea, leva-nos crer que estamos perante fenómenos novos de criminalidade até aqui minimizados e, que demanda meras estratégias de reforço do policiamento. Agora, a demanda é outra. E as próprias apetrechar as nossas autoridades criminais. Não apenas para responder em tempo útil e oportuno, mas para dar explicações aceitáveis que não suscitem mais dúvidas na sociedade.

5. Enquanto isso, a Nação debate o SOFA. Para alguns, o assunto passa ao lado. Para muitos, são momentos de inquietação, incredulidade e indagações. Sendo o SOFA (Estatuto das Forças Armadas dos EUA em Cabo Verde) um acordo entre um país para operar forças militares em uma nação estrangeira, é ou não legítimo querer saber que operações são essas? Asseguram-nos de que não se trata de uma forma camuflada de se driblar a Constituição, legitimando a instalação de uma base militar norte-americana no país? Outras leituras (R. Chuck Mason. Status of Forces Agreement (SOFA): What Is It, and How Has It Been Utilized?, March 2012)  fazem-nos ver que os SOFAs abordam a questão sobre qual país pode exercer jurisdição criminal sobre o pessoal dos EUA.  E que o acordo mais comum resulta em jurisdição compartilhada entre o EUA e o país signatário. Assim sendo, porque abre o Estado de cabo Verde mãos da sua soberania, permitindo que militares que cometam crimes contra seus cidadãos e violem as leis nacionais sejam julgados segundo as leis norte-americanas e em solo norte-americano? Se o acordo abre essa possibilidade, porque abdica o país da sua soberania?

6. Uma coisa é certa: perante tantos acontecimentos, não será o momento de se discutir com toda a profundidade qual deve ser o papel do Estado. A pergunta crucial seria: quais as prioridades do Estado? Por mais que queiramos, já não podemos nos compadecer com a gestão do quotidiano. E por muito bem-intencionado que o governo esteja, há que mudar o rumo: reformar o Estado diminuindo os custos de funcionamento e a dívida pública, criar condições de criação de empresas e de aumento da produtividade das já existentes, densificar a economia, abrindo caminho para outras o surgimento de ouros negócios igualmente rentáveis e sustentáveis, ouvir as classes e os cidadãos e, claro, não perder de vista a nossa condição de Nação soberana. Estas são as apostas que Ulisses Correia e Silva terá que fazer. É tempo de começar a tomar decisões. Um elevado sentido de Estado esta Nação espera.

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