Por: Paulino Varela Tavares*
Este artigo foi inspirado na seguinte afirmação do Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) do Brasil, Ministro Dias Toffoli: “Precisamos demonstrar unidade e colegialidade, em que pesem as divergências naturais de um colegiado, até necessárias. As ideias se discutem para o fim de uma resolução que seja a mais adequada, a mais correta e a mais justa, próprias que são da pluralidade e da democracia”. Esta afirmação parece ser carregada de obviedade, mas, no fundo só reforça o próprio desafio do STF que, desde já, é importante lembrar que: quem amorteceu esta corte suprema foi, sem dúvida, a sua própria inabilidade de compreender o quanto (estava e) está em marcha, no Brasil, uma franca luta para atravessar a celeridade do STF. Pois, esta corte suprema, nos últimos anos, deixou de ser: o guardião da constituição, um “lar permanente” contra abuso do poder, última trincheira contra a perseguição política, instância efetiva da lei, entre outras. Por isso, a perda da confiança é evidente. Por exemplo, na recente disputa para a eleição do Presidente do Senado Federal, assistindo ao vivo pela TV, vários senadores manifestaram, claramente, o não cumprimento do liminar expedido pelo presidente do STF para o cumprimento do ordenamento do processo. Pois, de certa forma, na prática, não foi cumprido o liminar. Com isso, fica evidente e comprovado a prática de um movimento para enfraquecer o STF.
Portanto, até onde vai esse movimento? Será que os ministros do STF não deram conta ainda desse movimento? Será que a nova política vai continuar usando essa tática com modelo? Será que, alguns ministros do STF, estão de acordo com esses comportamentos (1)? Será que os ministros não percebem que o STF está perdendo a afetiva confiança? Como cidadão e professor, estou extremamente preocupado e estarrecido com o comportamento desta corte nos últimos cinco anos. Mas, ainda persiste alguma esperança. Mesmo assim, essa perda de confiança no STF não está relacionada às demandas ou aspirações ou vontade da sociedade, mas sim, pela própria incapacidade na defesa árdua da constituição e da lei. Defesa árdua da constituição significa, sem dúvida, enfrentar e extinguir qualquer tipo de interpretação subjetiva da lei para fins seletivas que, desde já, no Brasil dos últimos anos, passou a ser uma quase febre comportamental. Com isso, respeitando qualquer tipo de pluralidade e colegialidade, o STF vem cultivando pecados mortais impulsionados pelas manifestações políticas e organizações comprovadamente corporativas e seletivas, além das fincadas atuações das cortes inferiores e das direcionadas atuações das Procuradorias Federais. Estas, utilizando-se da Teoria dos Jogos Jurídicos, vem driblando e enfraquecendo a atuação do STF, onde este passou a ser um elemento vivo e central da “Teoria do Prisioneiro”, mas com atuação passiva e, por vezes, inativa. Ou seja, a sensação é que, o STF, perante as cortes inferiores, passou a ser uma corte passiva e de mera validação, deixando de lado uma atuação mais firme e ativa no estrito interpretação e cumprimento da lei já positivada. Essa inatividade significa, sem dúvida, um alto grau de passividade do STF que, para instâncias ou instituições interessadas, passou a ser um elemento vencido. Com isso, aos olhos de outras estruturas jurídicas do Estado, é um caminho fértil para semear outros entendimentos à margem da rígida leitura legal da norma já positivada. Também, aos olhos de outras estruturas jurídicas do Estado, a própria inexistência da unidade e da colegialidade no STF, é um elemento vital para a progressão das divergências calculadas pela “Teoria dos Jogos” jurídicos, levando assim, a disseminação de uma cultura seletiva no: fazer justiça, na montagem dos processos, no andamento e urgência da ações, e, por fim, na priorização dos processos de grandes repercussões. Nessa linha de raciocínio, a sensação é que, fazer justiça “que seja a mais adequada, a mais correta e a mais justa” está caindo no esquecimento da corte por causa das possíveis repercussões negativas e críticas advindas da classe média rica brasileira, das instâncias jurídicas inferiores e do chamado quarto poder. Portanto, o STF não pode ser refém dessas possíveis repercussões negativas, pois, essas são “próprias … da pluralidade e da democracia”. O STF tem que resgatar a sua função de guardião máximo da constituição brasileira, independentemente do clamor da rua e da população. Pois, uma certa ocasião, um Ministro do STF afirmou que a suprema corte tem que escutar a voz do povo. Nesse caso, é muito lamentável e estranho esse comportamento porque o povo, no Brasil, não tem voz porque o poder ou a voz da televisão e dos jornais não pertencem ao povo, mas sim, pertencem à classe rica. E mais, se o ministro quer escutar a voz da rua ou do povo, em algum momento, terá que aplicar a pena de morte na lei brasileira porque é comum escutar das pessoas, principalmente da classe rica, o desejo de aplicar esse dispositivo penal capital (aplicar para os outros e não para si mesma, ou seja, para os filhos dos outros e não para a própria família).
Para terminar, um apelo importante aos ministros do STF: é urgente que resgatem a necessidade da interpretação e aplicação correta da lei; eliminar a inclusão dos diversos artifícios, armadilhas e subjetividades nas leis para melhor atingir os objetivos seletivos; eliminar o abuso de poder na aplicação das leis de forma seletiva; regular a atuação das cortes inferiores de justiça para eliminar a seletividade dos processos; resgatar o modo positivado no julgamento dos processos, eliminando o politicamente correto e aplicar a integridade da norma; resgatar a integridade do individuo no fazer justiça; eliminar todos os tipos de contaminações e posicionamentos políticos partidários no fazer justiça; eliminar todos os tipos de artifícios, usados pelas instâncias acusadoras, para condenar alguns e libertar outros; entre outras. O STF só resgatará a sua essência se, por acaso, reconhecer que suas atuações, nos últimos, cinco anos, foram muito contaminadas por vontades que, em geral, foram direcionadas seletivamente para atingir objetivos alheios e, em muitos casos, antidemocráticos.
Esperamos que o STF reestabeleça a aplicação das normas constitucionais no Brasil.
(1)http://correiodopovo-al.com.br/index.php/noticia/2019/02/06/pautas-polemicas-vao-dominar-julgamentos-do-stf-este-ano (Acessado em 06/02/2019).
*Cabo-Verdiano, ProfessorDoutor lecionando no Brasil