Sem meios operacionais, e sem melhoria salarial, continua a ser “muito difícil” as Forças Armadas cumprirem o que o país espera delas. O desabafo é do major-general Anildo Morais, para quem a recusa de se dotar a verba de 25 mil contos para o funcionamento da Guarda Costeira, por exemplo, “terá um impacto grande” na vida desse organismo, que tem a seu cargo a fiscalização marítima, a busca e o salvamento, entre outras “missões críticas”…
Sem os novos estatutos, que implicariam um novo Plano de Cargos Carreiras e Salários (PCCS), os militares ficam sem aumento salarial, ao contrário dos efectivos da Polícia Nacional, que terão um aumento de 20 por cento (%), contemplado no Orçamento do Estado para 2019, aprovado na semana passada, no Parlamento.
Conforme o apurado pelo A NAÇÃO, vários oficiais e sargentos sentem-se burlados pelo ministro da Defesa. Entendem que Luís Filipe Tavares não envidou, ou não conseguiu, mobilizar esforços para aprovar os novos Estatutos dos Militares, depois de várias promessas nesse sentido. Inclusive com a palavra empenhada.
Conforme nos foi dito, a proposta do novo estatuto dos militares, no sentido de melhorar a grelha salarial dos oficiais e sargentos, foi entregue, “atempadamente”, em meados deste ano, ao ministro da Defesa, com garantias deste de que o diploma seria aprovado este ano para entrar em vigor em 2019.
“Sob pressão, o ministro chegou a afirmar que o diploma seria aprovado em Novembro, em sede do Conselho de Ministros. Para o nosso espanto, este assunto nem sequer foi agendado e agora foi relegado para 2019, com o seu efeito financeiro a ser transitado para 2020”, desabafou o nosso interlocutor, lembrando que o actual PCCS das FA vigora desde 1997. “A expectativa era grande, tendo a conta os sucessivos adiamentos no sentido da aprovação dos novos estatutos no decorrer deste ano, para que pudesse entrar em vigor logo no dia 1 de Janeiro de 2019”.
Entretanto, um responsável militar garantiu ao A NAÇÃO que “não há mal-estar nos quartéis”, reconhecendo, contudo, que existe, sim, uma “certa frustração e insatisfação” no meio castrense.
Aliás, na audição parlamentar, o Chefe do Estado Maior das Forças Armadas (CEMFA) foi claro, ao afirmar que a aprovação do Estatuto dos Militares “não pode ser adiada” por muito mais tempo. O major general Anildo Morais considerou que aprovação do Estatuto do Militares “mexe, e de que maneira, com a melhoria dos militares”. Morais mostrou-se também expectante em relação à aprovação do diploma ainda no decurso deste ano.
Crescimento zero
Enfim, o alegado descaso que os sucessivos governos vem mantendo em relação às FA não contribuiu para a melhoria do orçamento dessa instituição castrense, que, há quase três décadas vem registando um crescimento zero. Consequentemente, as FA continuam a deparar-se com graves problemas de aquartelamento, mobilidade, formação de quadros e de manutenção do meios navais e aéreos, isso sem falar dos salários que estão congelados há mais de vinte anos.
Na audição parlamentar, o CEMFA lembrou que é do conhecimento público que, ao longo dos anos, a dotação orçamental atribuída às FA está “longe do ideal”. “No entanto, tem-se conseguido muito graças a uma gestão criteriosa e onde se priorizam os aspectos essenciais da instituição”.
Agastado, ou decepcionado também, o major general Anildo Morais lá deixou escapar que o orçamento das FA para 2019 “foi preparado com muita antecedência e com todos os detalhes possíveis, tendo em conta os principais focos, designadamente, a melhoria das condições de vida, trabalho e habitabilidade nos quartéis”.
Manutenção
Sobre a manutenção dos meios aéreos e navais, considerados importantes para o patrulhamento da nossa Zona Económica Exclusiva, o CEMFA disse que propôs uma verba de 25 mil contos para a rúbrica operação e manutenção dos meios da Guarda Costeira que, ao seu ver, “é uma quantia razoável”, mas, “infelizmente, após a atribuição do plafond, só foi necessário fazer um reajuste ficando abaixo dos 5 mil contos”.
“É insuficiente, essa é uma grande responsabilidade que temos”, lamentou o CEMFA, lembrado que Cabo Verde adquiriu o navio Guardião, já alguns anos, que “custou muito dinheiro ao Estado, e que é importante manter esse meio operacional”.
Segundo o CEMFA, o Guardião é um meio com uma tecnologia avançada e, internamente, “não temos técnicos especializados para realizar a sua manutenção e reparação. A manutenção desse meio naval acarreta elevados custos e foi ness e sentido que as FA propuseram uma verba de 25 mil contos para a essa rúbrica”.
Morais alerta que a recusa de dotação da verba de 25 mil contos “terá um impacto grande, porque, sem meios operacionais, será muito difícil cumprir as missões a nível da fiscalização marítima e outras missões críticas, principalmente com a busca e salvamento, que são missões da Guarda Costeira e que exigem recursos avultados”.
Orçamento 2019
O CEMFA reconheceu, entretanto, que o orçamento para 2019 permitirá melhorar as condições de aquartelamento, com a construção de mais duas casernas, uma das quais para acolher recrutas do sexo feminino no Centro de Instrução Militar “Zeca Santos”, no Morro Branco, em São Vicente.
Em relação ao fardamento, garantiu que o problema está por ora resolvido e que em relação a outros equipamentos militares serão encontradas soluções com a visita de uma delegação militar chinesa.
O novo Estatuto dos Militares, segundo o CEMFA, no dia em que for aprovado, deverá ajudar a responder às questões que se colocam em termos de valorização da carreira militar, inclusive a questão da grelha salarial.
Morais disse, na audição parlamentar, que a última informação que as FA teve sobre o assunto era que o mesmo seria apresentado em Conselho de Ministros, no dia 11 de Outubro passado, data que coincidia com o dia da Guarda Costeira. “A instituição está à espera com muita ansiedade e os militares esperam com paciência pela aprovação do novo estatuto”.
O major general Anildo realçou que tudo o que é posto à disposição das FA é utilizado de “forma criteriosa, com eficiência e eficácia, em cumprimento da nobre missão da defesa da Nação cabo-verdiana. Os militares têm a consciência do país real, não reivindicam, não exigem nada, mas é importante que se tenha em conta das reais necessidades e dos anseios da instituição militar”, esse aspecto, segundo o CEMFA, deve ser reconhecido principalmente pela classe política, já que as FA “precisam de incentivos”.
( Publicado no A Nação nº 590 de 20 a 26 de Dezembro de 2018 )
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