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Opinião

Dos conflitos comerciais: diálogo e concertação para uma efetiva cooperação e progresso precisa-se!

 

Por: Francisco Mendes*

Quando John Allen assevera que “as relações EUA/China, tendem a ser a mais consequencial” ou Christine Lagarde cita Mark Twain, reiterando que “a história nunca se repete, mas muitas vezes rima”,  fico a meditar sobre os conflitos comerciais atuais, o seu impacto global nas economias mais frágeis. Escusado é dizer que as relações entre as grandes economias se fazem pela via da competição, mas, se fosse em ambiente saudável, com base no diálogo sincero, melhor seria. China e EUA tem tido uma constante ‘rivalidade cooperativa’. Com efeito, o comércio anual entre eles totaliza meio trilião de dólares, e mais de 350 mil estudantes chineses e 3 milhões de turistas estão nos EUA a cada ano. Gregori Volokhine reitera que “se uma guerra comercial se pode resolver pela negociação, a debilitação económica é um problema muito mais profundo”, que pelas razões sobejamente conhecidas deve ser evitada por ambos.

Em Outubro findo, do lado da China, as exportações cresceram 15,6%, enquanto as importações aumentaram 21,4%, comparativamente ao mesmo período do ano transato, significando uma evidente retoma de crescimento, após queda em Setembro, que poderá arrastar a média anual do PIB para valor inferior do que o ano passado. Nos EUA o crescimento tem sido estável, avalizando mais empregos, mas deverá sofrer com a subida de preços, resultado da guerra comercial em curso. E se a Reserva Federal (FED) elevar os juros em Dezembro próximo, famílias e empresas serão sobremaneira afetadas à escala global.

Aludir “que nas 5 décadas que antecederam a 1ª Guerra Mundial (no dia 11.11.18, completaram-se 100 anos), houve avanços tecnológicos extraordinários – barcos a vapor, locomoção, eletrificação, telecomunicações, que definiram o mundo m0derno – bens, capital e as pessoas passaram a circularem relativamente livres. No período compreendido entre 1870 até a 1ª grande guerra, houve aumentos expressivos nas exportações, até que Alemanha e Reino Unido decidiram medir as forças. É pensando naqueles anos de má-memória, que a Organização Mundial do Comércio (OMC), insta os líderes mundiais a evitarem levar o conflito comercial ao extremo. O FMI calcula os danos em perda de 8.5 milhões de empregos ao gigante Asiático e cerca de 330.000 postos de trabalho aos EUA, com os sectores dos têxteis e agricultura, mas não só, a serem atingidos profundamente.  Isso poderá significar uma contração de 0.2-0.7% do PIB, perfeitamente suportável pelos dois colossos, mas indesejável.

Notando que a China é um grande consumidor de produtos agrícolas e os EUA distinto importador dos têxteis, ficam no ar as seguintes questões: porque não convergem em direção a mais-comércio? Será que os interesses de longo-prazo deixaram de ser convergentes? Como interpretar o optimismo de Matt Bevin, Governador de Kentucky, quando afirma que os empresários que acompanharam-no para atender a Exposição Internacional de Importação da China/Shanghai 2018, “não estarem a procura de vitórias de curto-prazo, mas sim sucessos de longo-prazo”? Assinalar que a China detém cerca de 1.4 mil milhões de habitantes, dos quais quase 500 milhões pertencentes à classe média, sendo um mercado de oportunidades cobiçado por todos. Notar também que apesar das fricções atuais, 180 empresas americanas, estiveram entre 5 a 10/11, ao lado dos mais de 3500 outras de 172 países e regiões, incluindo Cabo Verde, num certame onde os acordos de bens e serviços valeram 58 mil milhões de dólares. Referir que o Presidente Xi reiterou que o seu país importará 2.5 triliões este ano, prevendo atingir os 40 triliões nos 15 anos vindouros, sendo ¼ no subsector dos serviços. Os EUA, em sentido contrário, adotou uma política protecionista, dificultando investimentos em sectores que considera vital e com a imposição recente de tarifas criou obstáculos à exportação de mercadorias de cerca de 80% de firmas (muito delas americanas), registadas na província de Guangdong, que é considerada a ‘fábrica do mundo’.

O Investimento Direto Estrangeiro (IDE) possibilitou à China ganhos gigantescos ao longo das últimas 3 décadas. A aquisição de títulos de tesouro dos EUA, por Pequim, permitiu alavancar a tal relação consequencial de Allen. Entretanto, 0s EUA impuseram em julho p.p., tarifas de 10 % sobre aproximadamente 250 mil milhões de dólares em produtos, com a possibilidade de as mesmas incrementarem para 25%, em Janeiro próximo. A China, reagiu impondo direitos sobre o equivalente a 60 mil milhões de dólares em mercadorias, mas, tem ao mesmo tempo, reduzido o teto tarifário sobre 1500 produtos, fazendo cair a sua tarifa-média para 7.8%, abaixo do padrão-global, continuando com a sua política de reforma e abertura, iniciada em 1978 e acelerada, em 2001, com a adesão à OMC.

A comunidade empresarial está esperançosa, na eventualidade, de, nos próximos dias, os Presidentes Xi Jinping e Donald Trump sentarem-se à mesa e emitirem sinal positivo aos mercados. Contudo, peritos referem que o mais provável é acordarem um quadro de diálogo, sem grandes compromissos relevantes de longo-prazo, análogo ao que conseguiu Jean-Claude Juncker, na sua deslocação há pouco tempo a Washington. Aludir que China tem gradualmente, reformado o sector financeiro, um dos mais desejados, já toleram controlo acionista por firmas estrangeiras no ramo automobilístico e, em 2019 tenciona abrir os seguros à concorrência externa. Pequim tem estado a remover os subsídios aos sectores exportadores, bem assim, implementado um ambicioso programa de proteção de Propriedade Intelectual. Com a adesão à OMC, em 2001, as reformas foram titânicas e permitiram ganhos de elevado-vulto ao país. Disso as autoridades são conscientes. É neste sentido que propuseram ao mundo a Iniciativa One Belt, One Road (diga-se um Cinturão e Uma Rota (memorando firmado com mais de 130 países)) e planeiam investir fortemente na inovação, para obter engenhos que os parceiros desenvolvidos recusam transacionar. Não é de admirar que o tio Sam deixou de ser o campeão do laissez-faire. Isso tudo faz parte da história, a tal que muitas vezes rima, mas não se deve repetir. Por isso, há que salvaguardar o Sistema Multilateral do Comércio (diga-se o multilateralismo) que tem a OMC como cognome, pois, existe uma necessidade manifesta de diálogo. Diálogo esse em curso entre a China e a U.E., mas que terá validade-maior – se contar com todas as vozes!

Por último, recordar que em 2001, iniciou-se a Rodada de Doha, que não tem tido progresso, tornando a OMC numa organização quase inoperante. A dita Agenda para o Desenvolvimento, que arquitetava uma participação efetiva dos declarados “pobres do sul” foi colocada de parte faz anos. Talvez fosse momento de revisitá-la, de modo a se criar uma ampla frente de diálogo e cooperação mutuamente vantajosa.

* Economista

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