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Opinião

Praça do Palmarejo (I)

Por: Cipriano Fernandes

Começou a vedação da Praça do Palmarejo.

Apesar da feroz oposição dos moradores deste bairro, o Presidente da CMP não arrepiou caminho.

Eu tenho acompanhado toda esta movimentação e, pese embora a grande simpatia que sinto pelos cidadãos que se opõem ao fim da Praça tal como está definida no Plano de Desenvolvimento Urbanístico (PDU) do bairro, temo que seja extremamente difícil impedir o fim dessa praça. Mas sinto-me na obrigação de apresentar, neste documento e no próximo, factos técnicos incontestáveis que ajudarão os cabo-verdianos a compreender como e porquê chegámos a este ponto e quais as alternativas de vitória que ainda restam aos moradores do Palmarejo.

Na sessão parlamentar de Fevereiro a bancada da maioria na Assembleia Nacional forçou a aprovação de uma autorização legislativa (AL) que permitiu aos governantes do país (tanto a nível central como local), por um período de 90 dias, fazer um by-pass à Lei das Bases do Ordenamento do Território, amputando-a de duas obrigatoriedades: A da elaboração do PDU e a de o Plano Detalhado (PD) ser aprovado pelo Governo.

A Ministra que responde pelo Ordenamento do Território apresentou e defendeu tal AL afirmando ter tido, nesse empreendimento, o apoio das Ordens dos Engenheiros e dos Arquitectos e que, inclusivamente esta última a terá ajudado a gizar tais propostas!

No entanto, em nenhum momento tais propostas foram socializadas pela actual Direcção da Ordem dos Arquitectos (OAC) no seio da classe, por ser óbvio que de maneira nenhuma a esmagadora maioria dos membros da OAC as subscreveria!

São três os Planos Municipais de Ordenamento do Território que, por lei, os responsáveis autárquicos são OBRIGADOS a elaborar: O Plano Director Municipal (PDM), o PDU e o PD.

O primeiro e o mais importante é o PDM. É nele que as edilidades exercem a sua prerrogativa maior, que é a de atribuir os usos que bem entendem aos terrenos, independentemente que quem seja o dono e das expectativas de rendimento que este possa, legitimamente, ter. E, por poder condicionar esse potencial de rendimento de terrenos alheios, a elaboração do PDM deve ser um processo aberto, com as propostas de uso do solo publicamente explicadas numa abordagem win-win em que os legítimos interesses donos dos terrenos devem ser, o mais possível, favoravelmente acautelados e promovidos.

Mas por terem de cobrir a totalidade da superfície do concelho em causa, as cartas do PDM têm uma escala muito pequena (1:25.000), incompatível com a apresentação adequada dos parâmetros de ocupação e uso do solo.

A apresentação transparente desses parâmetros cabe aos outros planos hierarquicamente inferiores, mas de escala maior, feitos pela Câmara Municipal (que os propõe, mas sem poder para os aprovar) e as Assembleias Municipais (que os aprova). As responsabilidades e competências desses dois órgãos da governação municipal neste particular estão plasmadas no Artigo 23º do RNOTPU (Regulamento Nacional do Ordenamento do Território e do Planeamento Urbanístico (nomeadamente, e sobretudo, os requisitos da consulta pública).

A título de exemplo:

Se o PDM define uma zona urbanizável de 300 hectares, há um limite máximo de habitantes que a Câmara deve permitir habitar aí.

Este limite máximo obrigatório EXIGE automaticamente a previsão e a respectiva distribuição equilibrada de EQUIPAMENTOS (escolas primárias e secundárias, centros de saúde, esquadras de polícia, igrejas, placas desportivas e centros culturais, praças e zonas de estacionamento, etc.), sendo por isso absolutamente indispensável a elaboração do PDU para se poder conferir não somente o n.º mínimo obrigatório desses equipamentos de forma a garantir a boa qualidade de vida da população que se pretende cobrir, como também a tal distribuição geográfica sensata dos mesmos, dentro da urbanização.

Ora, acredito que fica claro a todos os cabo-verdianos que isentar os autarcas da responsabilidade de acautelar estas duas coisas, acabou por legalizar desde Fevereiro passado, em todo o país, o loteamento irresponsável tendo, nesta altura, muito provavelmente, acontecido já um verdadeiro assalto ao território, para produção de lotes para venda.

Portanto, o PDU (normalmente à escala 1:1000) não é mais do que a ampliação de uma zona aedificandi definida no PDM. Deve ser entendido como uma espécie de lupa sobre essas zonas onde o PDM permite que haja construções (zonas habitacionais, parques industriais, etc.). E é uma lupa poderosa, pois amplia o detalhamento dessas áreas até 25 vezes.

O PD (normalmente à escala 1:500), por sua vez, é a ampliação de determinadas regiões do PDU. É outra lupa que duplica o nível de detalhamento de partes do PDU e, pela sua escala, é capaz de mostrar apenas quarteirão a quarteirão de um PDU. Resulta claro que ao eliminar o PDU ninguém pode, com honestidade, falar de PD, pois este só existe se existir aquele.

O mais grave, e o que acabou por viabilizar a aventura da praça do Palmarejo, é o facto de essa autorização legislativa (AL) ter passado a aprovação de PD’s (ainda por cima sem que existam PDU’s) do Governo para a exclusiva responsabilidade das Câmaras Municipais.

É este detalhe que torna “legal” a aventura da mudança de uso desse espaço, pois a AL acabou por colocar nas mãos do Presidente da CMP e do seu vereador o poder para decidirem, absolutamente sozinhos, o futuro desse espaço.

Felizmente, a AL não conseguiu mexer no RNOTPU. Este continua válido e em vigor e EXIGE não somente a elaboração como a consulta pública do PD que a CMP tem de apresentar e que a Assembleia Municipal deve aprovar, ANTES DE SE PODER INICIAR QUALQUER OBRA. Os moradores do Palmarejo devem, com base no RNOTPU, intentar rapidamente um embargo à obra completamente ilegal que ora se pretende iniciar. Até porque a AL já caducou desde Junho…

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