Cristina Duarte, ministra das Finanças de Cabo Verde, está, há cerca de 10 meses, empenhada na sua conquista do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), restando-lhe pouco ou nenhum tempo para se ocupar dos problemas do seu ministério (MFP). O caso mais evidente é o programa Casa para Todos, a depender de um simples aval seu para não morrer na praia das boas intenções.
Cabo Verde já está a perder, e, se Cristina Duarte ganhar o cargo de presidente do BAD, “é duvidoso que o país ganhe alguma coisa” – esta é a opinião, pelo menos, de vários quadros do MFP, contactados pelo A NAÇÃO, na busca de respostas para os problemas surgidos, estes dias, relativos ao programa Casa para Todos. Ninguém fala do assunto, alegadamente, porque só a ministra tem a chave do problema nas mãos.
Aliás, na apresentação de argumentos relativos ao problema surgido com a linha de crédito do Casa para Todos, o ministro Antero Veiga pratica- mente disse, na semana passada, que da parte do seu ministério – o MAHOT – tudo foi feito, faltando apenas o MFP fazer a sua parte.
De facto, dizem os entendi- dos que, se porventura Cristina Duarte ganhar o pleito em que se entra empenhada neste momento, é duvidoso que Cabo Verde venha a ganhar grande coisa com isso, em termos práticos e efectivos. Desde logo, dificilmente, ela deixará de ter que provar que é uma gestora impoluta, que não está no lugar para facilitar a vida ao seu país natal.
“Na prática”, explica um analista, “uma vez no cargo de presidente do BAD, ela terá de funcionar como o professor que tem um familiar na sala de aula; esse familiar acaba sempre por ser aquele que mais tem que provar que sabe”.
CUSTOS DA CAMPANHA
Bom, independentemente disso, há quem pergunte também quais são os custos desta campanha de Cristina Duarte para o erário público cabo-verdiano? A NAÇÃO começou por tentar saber junto do MFP se foi aberta uma conta especial, uma rubrica, por assim dizer, para tal tipo de despesas. A resposta obtida foi que não. Isto é, as inúmeras viagens ao longo destes dez meses de campanha, sempre acompanhada de pelo menos duas pessoas, vão para as “contas gerais”. E as despesas, aqui, já ultrapassam “largamente” os 10 mil contos.
Mas o “mais grave”, continuam as nossas fontes, é o “elevado custo” de oportunidade desta candidatura, de resulta- dos “mais que duvidosos”. Trocando por miúdos: o maior custo desta campanha é o abandono a que muitos dossiês ficaram votados, desde que Cristina Duarte se envolveu na “sua” conquista do BAD.
Esperava-se que na última remodelação governamental, em Setembro do ano passado, sabiamente, José Maria Neves criasse uma Secretaria de Estado das Finanças, com competências próprias, e com um ou uma responsável capaz de assumir o Ministério, durante as ausências da ministra-candidata.
Em virtude do espírito centralizador de Cristina Duarte e do peso da posição dela nas decisões de JMN, acabou a remodelação por se contentar com a promoção da diretora-geral do Tesouro a secretária das Finanças-Adjunta, Exana Almeida. Sem competências próprias e sem poder real.
Em consequência, assuntos pendentes de política económica e de reestruturação dos serviços das Finanças estão parados e muitos recuaram. Isto sem falar dos operadores vários que precisam falar com a ministra e que simplesmente não conseguem.
No MFP, Cristina Duarte é conhecida como “aquela que manda nisto tudo”, numa alusão ao líder do falido grupo Espírito Santo, em Portugal, Ricardo Espírito Santo.
José Maria Neves, como aconteceu no II Fórum Trans- formação de Cabo Verde, de Maio de 2014, prefere chamar Cristina Duarte de “dama de ferro”, numa alusão à primeira-ministra britânica, da década de 80 do século passado, Margareth Tatcher, que reformou profundamente o seu país.
Ao contrário do Reino Unido, grande parte das dificuldades por que passa o país, nos domínios das economias e finanças, deve-se à orientação de investimentos públicos determinados pela política económica de que é responsável Cristina Duarte.
À ESPERA DE CRISTINA
Como exemplo do arrastar dos pés em que o país se encontra citam-se as recentes medidas do Banco de Cabo Verde, de há cerca de três meses, deviam ter sido acompanhadas de outras complementares do Governo, que permitissem o crédito chegar às empresas. Com Cristina ausente, tais “complementos” não apareceram até hoje.
Há também o velho dossiê de restituição do IUR e de devolução do IVA que remonta a 2008, sem falar dos vários fundos que nunca foram capitalizados, como é o caso da CV Garante. E, ainda, a contestação em torno da reforma tributária. Aqui aponta-se caso do novo Código de Imposto so-bre o Rendimento de Pessoas Singulares, altamente criticado pe- los sindicatos e empresários, sem que ninguém do Executivo tivesse reagido, por exemplo, às graves críticas de Júlio Ascensão Silva, da UNTC-CS, para quem tais medidas visam, de modo particular, os trabalhadores.
Tudo isso sem falar ainda do imbróglio do programa Casa para Todos, conforme o mencionado acima. Como escreveu este jornal na edição anterior, o presidente da IFH, Paulo Soares, revelou que desde Dezembro (portan- to há quatro meses) aguarda por um aval do MFP (Cristina Duarte) para resolver o problema dos 10 por cento dos 200 milhões de euros que o Estado de Cabo Ver- de deve disponibilizar no âmbito desse programa.
Em certos meios do poder, tanto na frente interna como a externa, começa-se a respirar com algum alívio o facto de já no próximo dia 25 de Maio se saber, finalmente, quem deverá ficar à frente do BAD. É verdade que, pelos seus atributos técnicos, Cristina Duarte tem chances de fazer um bom “score”, tendo em vista o peso e o nível dos restantes sete concorrentes. O problema é saber o preço a pagar por Cabo Verde e o que virá a seguir. Aqui as incertezas são inúmeras.
Cabo Verde refém da agenda de Cristina Duarte
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