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Política

Liderança do PAICV: Efeitos colaterais da vaga renovadora de Janira

A eleição de Janira Hopffer Almada para presidente do PAICV logo à primeira volta, numa disputa a três, acarreta efeitos colaterais nada negligenciáveis. Desde o peso político real dos ditos “figurões” regionais e nacionais do partido ao desconforto da ministra Cristina Fontes e de Felisberto Vieira para se manterem nos respectivos cargos, há muita coisa a passar a limpo.
Olhemos para algumas delas.
Figurões e figurinhas
Muitas foram as figuras que prontificaram o seu apoio público ou nos bastidores à candidatura de Cristina Fontes Lima e saíram chamuscadas dessa eleição na qual a ministra da Saúde e também ministra adjunta do primeiro-ministro não alcançou mais do que 8% do resultado.
Desde logo, por reunir à sua volta alguns dos principais membros do Governo, sendo com José Maria Neves o elemento mais antigo do executivo, tinha-se mais ou menos como certo que Cristina era a candidata preferida de JMN. Isso não obstante JMN não ter nunca manifestado, publicamente, em quem iria votar.
Desde já, diante dos resultados de domingo, e embora JMN já tenha dito que não pretende mexer no seu elenco governamental, é de se perguntar se Fontes Lima vai continuar a ser a número 2 do Executivo, como ministra adjunta que é do primeiro-ministro, tendo a partir de agora Janira Hopffer Almada, líder do PAICV, numa situação mais, digamos, subalterna.
Embora JMN argumente que o Governo responde perante o Parlamento, não é menos certo que os governos, no sistema cabo-verdiano, são emanações de partidos. São estes que concorrem aos votos e, diante dos resultados, constituem o Parlamento e, de seguida, o Governo.
Ou seja, diante de tal evidência também, muito dificilmente os principais actores do filme de domingo passado, no que se inclui o presidente cessante do PAICV, poderão agir sem ter em conta os resultados das referidas eleições. Isto se se quiser fazer política, em Cabo Verde, de forma consequente. Caso contrário, é outra história.
Mas o baixo score de Cristina Fontes Lima deve levar também muita gente a pensar no seu poder de influenciação nos respectivos colégios eleitorais. A deputada Filomena Martins (S. Vicente) e Franklin Spencer (PCA da Enapor e presidente da Assembleia Regional do PAICV em São Vicente), assim como as ministras Sara Lopes (Sal), Leonesa Fortes (Ribeira Grande – Santo Antão) são alguns dos nomes desse rol de gente atingida pelo “raio” renovador chamado Janira Hopffer Almada. Isso só para citar rostos que já se candidataram a cargos políticos nas respectivas ilhas, mas há também nessa lista os actuais governantes Cristina Duarte (Finanças), António Correia e Silva (Ensino Superior), Jorge Tolentino (Relações Exteriores), Mário Lúcio (Cultura), Marisa Morais (Administração Interna)… No entanto, esses nunca protagonizaram candidaturas, pelo que já se esperava que o apoio seria mais moral do que outra coisa.
Por isso, numa eventual ausência do gesto que se impõe, por parte de Cristina Fontes Lima, caberá a José Maria Neves, enquanto PM, gerir o desconforto de manter na mesma equipa Janira Hopffer e Cristina Fontes Lima, que criticou abertamente os gastos da campanha da camarada vencedora. Mais uma vez, também aqui, volta a colocar-se aqui o velho problema da “consequência” em política.
Filú, já era?
Na mesma ordem de ideias há quem ache que Felisberto Vieira deve questionar ou pôr o cargo de líder da bancada parlamentar do PAICV à disposição após a derrota nas urnas para JHA. É certo que perdeu com cerca 40% dos votos. Ainda assim, não deixa de ser uma derrota, ainda por mais, face a um elemento da nova geração que, em princípio, nada tem a ver com o PAICV de Filú.
Mas ao que se sabe, Filú teve o apoio de boa parte dos deputados do seu partido, sendo também o candidato vencedor em Santiago Sul, principal região de Cabo Verde… No seu caso contudo, à vista dos seus 40%, ainda por mais à entrada de ano pré-eleitoral, a história poderá ser outra, isto é, não convinha ao PAICV estar a mudar a liderança parlamentar.
Ainda assim, embora responda perante os seus pares que o elegeram para liderar o grupo parlamentar, Filú e JHA terão que se ver “olhos nos olhos”, nalgum momento deste roteiro, para decidir o que fazer daqui até às próximas eleições legislativas, em 2016.
Uns renascem, outros sucumbem
Walter Évora (Boa Vista) e João do Carmo (São Vicente), apoiantes desde a primeira hora de Janira, renascem com estas eleições após uma travessia no deserto por causa de clivagens internas. Do Carmo, que brigou com JMN quando ainda estava à frente da Comissão Política Regional em São Vicente, por isso a vitória da sua candidata reactiva-lhe a ambição de voltar a ser alguém no PAICV, sendo certo que tudo depende dos ventos de 2016.
Um outro caso é o de Walter Évora que viu o seu sonho de ir para o Parlamento virar fumaça com o regresso de Aristides Lima a essa casa após o falhanço na corrida à Presidência da República em 2011. Cansou-se, foi-se embora e pode regressar de novo, agora sob a liderança de JHA.
Mas há outros que saem tostados dessas eleições. Além dos apoiantes de Cristina, há quem esteve com Filú e que agora têm de se fazer contas à vida. Júlio Correia, Joanilda Alves ou Sidónio Monteiro, deputado pela emigração mas originário do Fogo, terão de analisar a derrota do seu candidato Filú na ilha natal e perceber se não é também uma mensagem que os militantes que lhes envia no sentido de que é hora de se renovar os rostos tambarinas por lá.
Os deputados Alexandre Novais (São Vicente) e Carlos Delgado (Santo Antão), também fervorosos apoiantes de Filú, devem fazer as mesmas contas à vida. Um outro caso não menos notório é o de Aristides Lima, apoiante ainda que discreto, de Filú.
Carlos Delgado, presidente da Comissão Política do PAICV na ilha das montanhas, salva-se ainda pela vitória do seu candidato no Porto Novo, seu principal colégio eleitoral, e na Ribeira Grande, mas do Paul recebeu um recado claro de que precisa fazer mais trabalho naquele concelho.
Presidenciais de difícil gestão
Tirando a conquista do Governo, talvez o dossier eleições presidenciais para 2016 seja o mais difícil para Janira Hopffer Almada gerir após o Congresso do PAICV. O pai da agora presidente do PAICV, David Hopffer Almada, já tentou a cadeira do Palácio do Platô, por duas vezes, mas há também Aristides Lima e outros que se prontificam, pelo que a margem de erro é muito curta.
A saída airosa certamente seria colocar, uma vez mais, as bases a pronunciarem-se sobre o apoio do partido às presidenciais. Deste modo, a família Hopffer Almada evitaria a ideia de estar a promover uma espécie de “dinastia” dentro do PAICV e em Cabo Verde. No entanto, é muito pouco provável David, o pai, fique tranquilo caso não seja candidato à Presidência da República. Aliás, a eleição de JHA para ldierar o PAICV já é vista como um “pacote familiar”, filha e pai, ao mesmo tempo.
Congresso
O Congresso do PAICV, em Janeiro próximo, exigirá muita habilidade política aos principais protagonistas do partido neste momento e, principalmente, a JHA. Impõe-se desde já negociar uma espécie a “paz de camaradas”, ainda que seja podre, por forma a evitar males maiores até 2016. O primeiro teste passa, precisamente, por saber o que fazer com Felisberto Vieira e Cristina Fontes Lima, tendo em conta o que cada um vale no PAICV. Este é desde já o primeiro desafio de Janira Hopffer Almada, líder inconteste do PAICV pós-José Maria Neves.
História
Janira Hopffer Almada já tem garantido o seu lugar na História de Cabo Verde. Tornou-se domingo passado, 14 de Dezembro, na primeira mulher a conquistar a liderança de um partido em Cabo Verde pela via do voto. Jovem e mulher, num país de jovens onde as mulheres, cada vez mais, procuram dar as cartas na sociedade e na política, resta saber que lugar a História reserva a esta cabo-verdiana de 36 anos, advogada de profissão, doravante.
 
 
 
 

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