Por: José Valdemiro Lopes
As políticas ditas para o “Desenvolvimento das ilhas de Cabo Verde” instaladas nestas últimas décadas, com efeitos por definição, de curto, médio e longo prazo, não vingaram e o país ficou longe de alcançar e viver em todas as nove ilhas habitadas para a maioria da população, soluções consistentes para os problemas endémicos deste arquipélago: o desemprego jovem; a pobreza; acesso á água e eletricidade; sistema agrícola inadequada á realidade climática-geográfica; economia essencialmente ancorada á informalidade; acesso desigual aos serviços de ensino e saúde. O processo de desenvolvimento, ficou, em certa medida, comprometido, com sucessivas “injeções” de recursos financeiros, ancoradas á infraestruturação, agravando a divida externa, para um nível quase insuportável, orientação política, muitas vezes desvirtualizada, como foi o caso da estrada de ligação “Calhau-Baia das Gatas”, em São Vicente, a obra, revelou-se insuficiente para impulsionar progresso, emprego e criação de valor…
Vários anos de “esperanças perdidas”, vividas de maneira geral em toda a periferia e mais acentuadamente nas chamadas ilhas “periféricas”, citamos como exemplo, ainda a ilha de Monte Cara, onde verificou-se, num único ano uma boa centena ou mais, de falências empresariais e a preocupante onda de aumento de desemprego, com retirada de empresas (e capitais estrangeiros) do Parque Industrial da zona do Lazareto… Cabo Verde subestimou também, a sua integração no mercado sub-regional africano, portanto, condição sine qua non de formação de espaços e mercados necessários, para a expansão económica deste pequeno e frágil país insular; esta oportunidade, continua a ser actualmente adiada, embora declarações de princípio e tomadas de medidas políticas, sem resultados práticos, visíveis na economia, nos transportes e no social…
Vivendo a nova realidade imposta pelo novo coronavírus, neste momento da retoma Cabo Verde tem boa oportunidade e alternativa para apostar serena e intensamente no alavancamento da sua soberania económica embora humilde, mas mais orientada e adequada á realidade sociocultural, de cada uma das nove ilhas habitadas descentralizada e orientada para o impacto positivo, no bem-estar, emprego, ensino e saúde, respeitando o meio ambiente e a biodiversidade, com o objectivo final de garantir boa qualidade de vida a todos, tanto do ponto de vista social como económico… tendo portanto sempre em conta os três factores indissociáveis: o económico, o social e o ambiental. Boa decisão nesta era de nova normalidade é repensar e instalar, desta feita “defacto”, um Cabo Verde voltado exclusivamente para o interesse comum, muito mais acima das agendas politicas partidárias egoístas, que quer queiram ou não atrasaram esta jovem nação… estamos no ano 45 pós recuperação da dignidade politica, com surgimento de um punhado de elites com vida mais que bem arranjada e a maioria dos cidadãos e famílias honradas que não viveram nem colheram ainda o fruto da promoção de Cabo Verde, para pais de Rendimento Médio… Isso mudará, mas não se sabe, quando. Estas ilhas devem entretanto assumir a responsabilidade de criar condições para mais justiça social, acreditar na sua juventude e apostar e implementar: (é minha teimosia), nas energias renováveis, (chamadas limpas), nas tecnologias de informação, comunicação, robótica, inteligência artificial e uso profissional massivo da Internet, aqui, abolindo as noções de espaço e de tempo e até de fronteiras, nos negócios e nas relações sociais e internacionais, Cabo Verde, deve convergir para a politica de diplomacia económica alicerçada numa boa estratégia geopolítica financeira, com prática de salários dignos e transformação da remessa da Diáspora em investimentos criadores de valores, mas o país, deve sobretudo, não afrouxar o eixo especifico de atração e enquadramento racional do IDE (investimento directo externo), que de maneira geral ficará mais enfraquecido devido ao Covid-19, os investidores tradicionais e parceiros de Cabo Verde, nesta nova normalidade planetária estarão mais preocupados a investirem nos seus próprios países. O novo coronavírus não excluiu ninguém e a recessão económica é global.
As duas agencias financeiras e monetárias internacionais (Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional) pressionaram países pobres e Cabo Verde seguiu e obedeceu, dando maior importância ao PIB e politicas macroeconómicas, sem se cuidar suficientemente da economia produtiva, produtora de riqueza e emprego mas sobretudo descurando, a articulação entre os parâmetros e ligações da macro e da produtiva (economia real)… Por exemplo, não basta preocupar-se exclusivamente, com o IDE (investimento directo externo), naturalmente essencial, sem se modernizar a administração pública eliminando burocracias e deve-se evitar protelar ou ignorar a criação de condições para formar e apoiar a classe empresarial. Dinâmica essencial, será criar ou activar, reforma de acesso facilitado a crédito interno ( investimento) às pequenas, médias e micro empresas, instalar uma cultura de incentivos gerais e descriminados e suportes de apoio a constituição de joint-ventures entre as empresas cabo-verdianas e empresas estrangeiras… facilitando a transferência de tecnologia e know how…
Se é indispensável proceder-se á privatização da economia, torna-se indispensável, prosseguir o esforço de “desintervenção” do Estado em muitos sectores de actividades e se a privatização não for acompanhada pelo surgimento de uma classe empresarial autóctone, capaz de orientar com dinamismo e racionalidade, o funcionamento das futuras unidades productivas, quem assegurará o controlo das economias e dos nossos recursos, sobretudo os da nossa grande área económica marinha exclusiva?
Paralelamente o esforço de integração regional africana será a garantia de criação de uma situação de oportunidade capaz de promover Cabo Verde para a posição e condição de “HUB” e porta de entrada para o mercado económico da Africa do oeste “CEDEAO”. O desemprego jovem é engrossado também, pelo facto de não se ter desenvolvido o sector secundário, ficando a boa dezena de universidades situadas quase exclusivamente, nas ilhas de Santiago e São Vicente formando jovens diplomados que no fim dos estudos, vão desembocar-se no desemprego, porque ficaram confrontados á oferta de cursos conformistas, que não respondem às demandas do mercado… A Escola da Hotelaria e Turismo é a instituição mais bem sucedida face aos objectivos de integração socioprofissional e demanda do mercado…
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Publicado na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 671, de 09 de Julho de 2020