Por: Adilson Veiga
A grande maioria dos estados, tendo em consideração a gravidade e a facilidade de propagação do covid19, definiram medidas de confinamento e de contenção extremamente restritivas para evitar o colapso do sistema de saúde. Como consequência, enquanto perduram as medidas restritivas, uma grande fração da cadeia produtiva e de serviços sofrerá limitações e restrições de capacidade produtiva. Por isso, a atividade económica sofrerá impactos estrondosos cuja amplitude dependerá da duração das medidas de restrição e das medidas governamentais adotadas.
Após a pandemia, existe uma batalha ainda maior a ser vencida, a da retoma económica. O caso de Cabo Verde poderá ser ainda mais desastroso, tratando de uma pequena economia dependente do turismo e do exterior, pouco diversificada e de pouca pujança. Com o efeito, a agência de notação financeira Fitch desceu o ‘rating’ de Cabo Verde para B-, com perspectiva de evolução estável da economia e prevê uma recessão de 14% este ano e a subida da dívida pública para 154%. Deste modo, as medidas a serem adoptadas para fazer face à degradação do mercado de trabalho e aumento considerável de desemprego podem levar a decisões e planos que ameassem o desenvolvimento sustentável e colidir com o desafio da emergência climática.
Desenvolvimento sustentável
Trata-se de um conceito moderno que se traduz num modelo de desenvolvimento global que incorpora os aspetos de um sistema de consumo em massa no qual a preocupação com a natureza é máxima. Este modelo de crescimento prioriza o equilíbrio entre os três eixos: económico, social e ambiental. Entretanto, é extremamente relativo e temporal entre os países, dependendo do nível económico, social e cultural de cada um. Assim, equilíbrio que caracteriza o desenvolvimento sustentável é dinâmico e mutável devido aos fatores mencionados, bem como aos grandes acontecimentos, como são os casos de guerras e pandemias (ex. Covid-19).
Infelizmente, este conceito tem sido apenas uma miragem em muitos países, sendo que os eixos ambiental e social são subjugados ao económico. Após a pandemia, os tomadores de decisão terão duas escolhas: [1] – a aposta no desenvolvimento sustentável baseado em projetos de longo prazo cujos efeitos socias e ambientais são devidamente ponderados conforme a legislação ou a mais provável, [2] o desespero em criar empregos através da priorização do eixo económico com projetos de curto prazo sem a devida avaliação dos seus impactes sociais e ambientais.
Primeiro cenário
Para contrair os efeitos económicos da pandemia, os decisores poderão optar pela desregulamentação e atropelos à legislação ambiental e social. É pensar tal e qual ao homo economicus. Projetos com impactes ambientais e sociais significativos poderão ser consagrados sem a devida avaliação prévia dos efeitos sociais e ambientais, devido a pressão de criação de empregos e o melhoramento das condições económicas das famílias. Investimentos privados milionários poderão ser construídos sem contrapartidas sociais para a comunidade, dado que estes podem tornar mais cara o investimento e, por isso, reduzir a atratividade de Cabo Verde. Ainda, os Planos de Gestão de Território podem ser completamente ignorados ainda que o projeto de investimento seja incompatível, em nome de geração de empregos.
Cabo Verde possui uma legislação ambiental satisfatória e instituições e recursos humanos devidamente preparados para seguimento da qualidade ambiental e para a garantia da sustentabilidade dos projetos. No entanto, todos estes atributos poderão ser menosprezados. A falta dos critérios e exigências ambientais nos termos de referências e contratos de empreitadas das obras públicas e privadas podem tornar recorrentes. O pacote dos benefícios fiscais poderá ser reforçado para atrair investimento externo, incluindo o aumento da precariedade laboral e a redução do salário mínimo. Todos estes cenários podem provocar o aumento do subemprego e a degradação contínua de vida e do ambiente, sobretudo nas ilhas turísticas. Bairros não planeados e barracas com certeza aumentariam a falta de capacidade financeira de alugar uma casa decente pelos empregados naturais de outras ilhas.
Segundo cenário
Poderá ocorrer a tão sonhada integração total de aspectos ambientais nas políticas setoriais. Isso não significa enobrecer as questões ambientais face ao económico, mas apostar no crescimento sustentável e na reformulação das estratégias, incluindo a correção dos erros já cometidos.
Significa isto que as políticas de crescimento verde devem ser parte integrante das reformas estruturais necessárias para promover um crescimento forte, mais sustentável e inclusivo. Eles podem desbloquear novos mecanismos de crescimento.
Aumentar a produtividade, criando incentivos para maior eficiência no uso de recursos naturais, reduzindo o consumo e desperdício de energia, abrindo oportunidades para inovação e criação de valor e alocando recursos para o uso de maior valor. Isso poderá ser feito através do aumento da confiança dos investidores através de uma maior previsibilidade na maneira como os governos lidam com as principais questões ambientais. A contribuição para a consolidação fiscal mobilizando receitas por meio de impostos ecológicos e pela eliminação de subsídios prejudiciais ao meio ambiente. Essas medidas também podem ajudar a gerar ou liberar recursos para programas de combate à pobreza em áreas como abastecimento de água e saneamento ou outros investimentos em prol dos pobres.
Optar pela estratégia da contrapartida com projetos sociais promovidos pelos investidores como condição para a aprovação de projetos. Ademais, a aposta nas energias renováveis pelo governo e incentivos para que o setor privado também aposte deve ser reforçada. Os investimentos na requalificação urbana e ambiental deve ser reforçada. O licenciamento ambiental deverá ser uma condição primordial para a inauguração de empreendimentos com potencial de impacto.
As estratégias de crescimento verde também reconhecem que o foco no PIB como principal medida do progresso económico geralmente negligência a contribuição dos ativos naturais para a riqueza, a saúde e o bem-estar. Portanto, eles precisam contar com uma gama mais ampla de medidas de progresso, abrangendo a qualidade ambiental e a composição do crescimento, e como isso afeta a riqueza e o bem-estar das pessoas.
Muitos estabelecimentos nacionais estão dispostos a adquirir tecnologias e recursos humanos capazes de fazer uma gestão dos aspectos ambientais de primeiro mundo. Entretanto, ficam impossibilitados, pois as infraestruturas públicas e outros players são incapazes de dar continuidade ao processo pela criação de mecanismos de aproveitamento.
Portanto, estas medidas nada valem se não houver o investimento robusto nas infraestruturas públicas, como Estação de Tratamento de Aguais Residuais (ETAR) e Aterro Sanitário, e capitalização e empoderamento das empresas de reaproveitamento de modo a acompanhar a evolução do setor empresarial.
Por fim, o Turning Point que, neste momento, atravessamos é uma grande oportunidade de reforçar a aposta no crescimento verde. Contudo, o sonho no crescimento rápido e a pressão para a recuperação de empregos perdidos, com base em projetos de curto prazo, poderá nos induzir a más opções. A melhor opção, com certeza, é primar pelo equilíbrio entre os duas abordagens da necessidade de continuarmos a viver e de garantir a subsistência da geração vindoura. Não vale a pena sermos capitalistas exacerbados nem ambientalistas fanáticos.
Referência
1 – https://sustainabledevelopment.un.org/?menu=1300
2-http://documents.worldbank.org/
3-Jalilian, Hossein; THE IMPACT OF REGULATION ON ECONOMIC GROWTH IN DEVELOPING COUNTRIES: A CROSS-COUNTRY ANALYSIS; university of Bradford. Bradford. 2006
4- https://www.acciona.com/sustainable-development/