Por: Natacha Magalhães
Doravante só há um objetivo. Esperar que não haja (muitos) mais casos e, caso houver, travar a sua disseminação. Se a prioridade é salvar vidas, não será difícil se todos colaborarem. As palavras de ordem são prevenção, responsabilidade, consciência e solidariedade.
Mas num país onde há quem desafie medidas e deixa o egoísmo falar mais alto, talvez não basta pedir distanciamento social. Se para grandes males, necessário forem grandes remédios, que se tome medidas firmes. Porém, é preciso acautelar alguns aspetos. Tudo o que se vier a fazer que seja ao abrigo da lei.
Infelizmente, o que mais temíamos aconteceu. O coronavírus SARS-CoV-2 ou Covid 19 chegou a Cabo Verde. Era previsível, apenas não sabíamos quando e onde, embora as ilhas do Sal e da Boa Vista eram desde sempre as que mais riscos corriam por serem aquelas que mais turistas recebem.
Um país com fronteiras abertas, que tem no turismo uma das suas principais indústrias, que recebe maioritariamente turistas vindos dos países atualmente bastante afetados pela pandemia, dificilmente ficaria livre de ter casos.
Por serem casos importados, argumenta-se se este impasse no encerramento das fronteiras não terá ditado esse desfecho. Porém, a realidade é a que temos e é com ela que teremos que saber lidar. Três casos importados à data, uma vítima mortal e centenas de pessoas em isolamento, à espera que passem os quinze ou vinte dias, tempo limite que o vírus permanece no organismo assintomático. E até finais de março, estaremos todos em suspenso e apreensivos, fazendo fé que tudo dê certo e que casos locais não venham a surgir, para sossego de todos.
Os dias que nos separam do final de março e inícios de abril serão cruciais para termos uma noção do que teremos que enfrentar, preparando todos os cenários, esperando que tudo corra bem, mas preparando para o caso de alguma coisa escapar do controlo.
Nesse compasso de espera, a responsabilidade e a consciência individual e coletiva serão os nossos maiores aliados. A indisciplina, o descaso e a desobediência os nossos maiores inimigos. Se todos colaborarem e fizerem a sua parte e as decisões necessárias não forem adiadas podemos vencer.
É inegável que o governo, vem, desde a primeira hora, envidando todos os esforços para travar a disseminação do vírus e mitigar os efeitos já causados e travar o Covid19, medidas essas que parecem cair no agrado da maioria dos cabo-verdianos.
Por sua vez, a Oposição também dá sinais de querer ser parte da solução, mostrando responsabilidade e sentido de Estado.
Algumas instituições privadas já mostram que também querem ser parte da solução, se organizando para ajudar pessoas que perderam seus empregos ou que se encontram em situação de vulnerabilidade. Nesse particular, é de se louvar iniciativas privadas nas ilhas da Boa Vista e São Vicente, onde decorrem campanhas de angariação de géneros alimentícios e de sabão para famílias economicamente frágeis. Espera-se que muitas mais venham lhes seguir o exemplo.
Ao plano de contingência vieram se juntar outras medidas que espelham a preocupação do Executivo em assegurar que tanto a nível sanitário como no plano social e económico algumas situações sejam acauteladas e salvaguardadas.
A comunicação, aspeto fundamental em tempo de crise, melhorou muito. Há atualizações diárias sobre a evolução da situação, ainda que pouco ou nada se possa fazer para travar as fake news. Ainda nesse plano, é preciso considerar a Imprensa como parte fundamental da solução, pelo que precisam de todas as informações claras e atempadas para fazerem o seu trabalho, logo, não há que se incomodar com nenhuma pergunta nem comentários que os jornalistas sintam necessidade de fazer.
É preciso continuar a contruir e consolidar a confiança da população para engaja-las na prevenção e igualmente importante evitar ruídos e a desinformação. É de se parabenizar, ainda no plano da comunicação, o excelente trabalho que a toda a Imprensa nacional vem fazendo, adaptando os seus conteúdos e as suas programações ao contexto e a comunicação de massas feita pelas autoridades sanitárias do país. Parece que o desafio agora é assegurar que estas informações cheguem a todas as franjas da população, em todas as vilas e vilarejos do país, utilizando, para tal, os agentes sanitários.
Muito se vem fazendo, porém há ainda muita coisa essencial a ser feita, muitas delas até fáceis de serem implementadas, desde logo, assegurar que a população tenha acesso aos materiais básicos de higiene das mãos, nomeadamente álcool gel ou simplesmente o álcool, ou ainda água, pois que nada adianta ter sabão mas não ter água em quantidade suficiente para lavar as mãos; o abastecimento de água potável deve ser mais do que nunca regular; que os espaços públicos, nomeadamente instituições, sejam desinfetados – cada instituição deve adotar o seu plano interno de contingência, assegurando a proteção dos seus colaboradores – e o mesmo deve acontecer com os locais e espaços privados, cabendo também aos seus responsáveis fazer a sua parte, seja para protegerem os utentes e clientes seja os seus próprios funcionários.
Por outro lado, é crucial que a fiscalização funcione com eficácia e eficiência para evitar situações de açambarcamento e aumento de preços. Não se pode admitir que bares, esplanadas e lojas incumpram as medidas de contenção e continuem não só a funcionar para além do horário limite como ainda a não observar a medida de distanciamento.
Nesse ponto, urge também sensibilizar os comerciantes, tal como se vem fazendo com a população, em relação à campanha de higiene das mãos. E que quem não cumprir seja exemplarmente punido.
Diz-se que para grandes males, grandes remédios. Em contexto de pandemia e dada a fragilidade do nosso país, se grandes remédios forem necessários, que não se hesite. Porém é preciso que se atente para que tudo que se faça tenha coberto da lei, evitando que se incorra em ilegalidades que podem deitar por terra todo o trabalho feito pelas autoridades.
Até a data, não se pode obrigar ninguém que não esteja infetado a cumprir quarentena, muito menos obrigatória, ficando o confinamento à consciência de cada um. A quarentena só poderia existir caso fosse decretado estado de emergência, o que apenas aconteceria em sede da Assembleia Nacional.
Se é ou não cedo para se avançar com esta medida, caberá ao governo avaliar todas as possibilidades e decidir. Não é fácil, pelas implicações que essa decisão acarreta. E tudo depende agora da evolução da situação. Porém, está claro que são precisas medidas mais firmes, já que a indisciplina de vários, poderá perigar a saúde e vida de muitos. Se a boca não chegar, que a lei seja o quanto baste.
Publicado no A NAÇÃO, nº 656, de 26 de Março de 2020