Por: Carlos Carvalho
Fui aos Dicionários clássicos buscar o significado de Chico-espertismo e de Chico-esperto e foi assim que, depois de alguma pesquisa, encontrei na Infopédia a seguinte definição: “Tendência para procurar o benefício ou a vantagem pessoal, mesmo em prejuízo de alguém” .
Já o “Priberam” nos diz: “ Que ou quem se acha muito esperto ou mais esperto do que os outros”. Diz ainda que é = Sabichão e dá como forma « Depreciativa »: “ Que ou quem age de modo oportunista e, por vezes, desonesto, desrespeitando regras em proveito próprio” (2008-2013, https://dicionario.priberam.org/chico-esperto [consultado em 18-06-2019].)
Como manda a ciência, os dicionários consultados deram alguns exemplos do chico-espertismo e, consequentemente, do seu “portador”, o chico-esperto. Porém, os exemplos apresentados não conformam o que pretendo aqui abordar. Na verdade, por exemplo, o chico-esperto pode nem agir com desonestidade … nem desrespeitando regras.
“Chico-espertismo”
Não sendo fácil encontrar o Chico-esperto e o Chico-espertismo que procurava nos dicionários, decidi, conhecendo bem muitos “Chicos-espertos”, eu mesmo trazer minhas definições para as duas expressões. Comecemos pelo “Chico-espertismo”.
O “Chico-espertismo” é um fenómeno verificável em qualquer sociedade. Claro, nuns mais que noutros. É uma espécie de “esperteza baixa”, isto é, facilmente detectável, pois, esperteza não fundamentada numa intelectualidade buscada, conquistada com esforço intelectual. Em português também se usa esperteza-saloia como sinónimo de “Chico-Espertismo”.
É, regra geral, uma esperteza baseada em indicadores pouco recomendáveis: bajulação, serviçalismo, “sin-senhorismo”, “gentilismo” e outros. Mas, essencialmente nestes.
No dicionário de Cândido de Figueiredo, bajular é sinónimo de lisonjear servilmente; adular. Já serviçal … todos sabem!
“Sin-senhorismo”?, não encontrei nos dicionários. É provável que seja um neologismo. Mas todos também sabem o que significa.
Gentilismo, aqui, não é bem o que em português correcto significa, ou seja, não significa “o mesmo que gentilidade”; dos “povos gentios”. Aqui, o utilizo como alguém que é “muito gentil” mas depreciativamente, isto é, é gentil mas para tirar proveito próprio.
Normalmente, o Chico-espertismo é característico dos que não muito dotados, intelectualmente, têm em mente uma certeza: devem/têm que triunfar rápido, sem muito esforço. De preferência, nem esforço físico, nem mental. E isso tudo à base essencialmente de muito “sin-senhorismo”.
E … o Chico-esperto?
Bom, claro está, que o Chico-esperto é o sujeito que incorpora o Chico-espertismo. É o sujeito que, sem se saber como, já se deu bem na vida. Já está “la di riba”, ou melhor, “riba la”.
Para isso, usa os seus dotes de bajulador, de excelente serviçal; mas usa essencialmente o dote de “sin-senhorisman”, palavra que certo também não existe.
Normalmente, o Chico…Esperto pouco lê, pouco pensa, mas gosta de discutir. Gosta de usar e abusar do que ouve e aprende através de um “mentor” que “habilmente” escolhe. Normalmente, ele fala bem, é bem-falante, “é ten boa labia”. Segue o que o “mentor” diz…quase que religiosamente!
Na verdade, quase que idolatra seu mentor. Segue-o como um cão-fiel segue seu dono. Sabe que, só dessa forma, consegue atingir seu objectivo, ser alguém na vida…sem grande esforço. Aliás, o único grande esforço é mesmo seguir fielmente seu mentor.
O “Chico”, regra geral jovem, desde os tempos de medíocre estudante-universitário, traça seu destino. Já sabe o que quer e como vai atingir seus objectivos.
Como “esperto”, que é, usa da esperteza para detectar o caminho seguro para o imediato sucesso.
Como e o que faz “Chico-esperto” para atingir seus objectivos?
Normalmente, “Chico” decide enveredar-se pela política, a via mais rápida. Decide ser “político”. Assim, escolhe “espertamente” o Partido e sua âncora, seu mentor. A esperteza lhe permite analisar habilmente que Partido escolher. Afinal, tem o dom da esperteza.
Vai-se aproximando de colegas “Chico-espertos” como ele. Começa a participar nas diferentes “tertúlias partidárias”; depois, em reuniões. Faz-se de intelectual, emite opiniões que ouvira de seu mentor; quando mais “sabido”, rabisca alguns artigos ou vai “postando”, ridícula palavra!!, um ou outro post, claro, sempre criticando o Partido adverso; na maioria das vezes sem saber bem porque critica…mas, como tem que marcar ponto/presença, ser reparado pelos barões e cimentar sua posição de futuro quadro, vai elogiando o Partido que escolheu para ser de seu coração…talvez, melhor de seu futuro bolso…portanto, segurança de seu destino.
De repente, o Chico vê-se efectivamente na “política”, “é ta bira “pulitiku””.
Começa por ingressar nos “Jotas”. Já dentro dos “jotas” segue marcando pontos. Aos poucos, vai cimentando sua posição. Começa a dar nas vistas, é tido em devida conta pelo seu “seguidismo agudo”, pela sua “fieldade” ao Partido.
Com sorte à mistura, o Chico, dja k sé diploma na mon (lá “malmente” conseguiu acabar o curso), sob protecção de seu mentor, vem já assessor…“Joven ten k dadu oportunidadi”.
Ainda sem dar provas de nada, tecnicamente medíocre, já é assessor. “É ben k diploma i é fiel a Partido”! O seu CV, ainda nulo, é compensado pelo facto de ser “bajulador” e “seguidor cego”. Isso chega para as suas pretensões.
“Chico” vê sua hora chegar. Aproximam-se as próximas eleições. E como há que se dar lugar aos mais novos, “Chico”, empenhado e já com alguma prova no seio dos seus comparsas do Partido, consegue entrar nas listas para as autárquicas. Entra, “de peito” nas campanhas e lá consegue sua primeira vitória … entra como deputado municipal, suplente na autarquia. Para começar, já não é mau.
Segue, marcando pontos, sempre critico em relação a tudo e a todos; e vai subindo os degraus da nomenclatura partidária. Prepara-se para seu próximo voo, assaltar a Direcção da JOTA. Pacientemente vai abrindo caminho. Mais ousadamente vai procurando também o assalto à administração governamental.
Por ora, ser algum “directorinho” duma escola qualquer ou coisa que valha, já não é mau. Na verdade, o que ele quer é ser Sr. Deputado Nacional, mas com olhos também num CA duma empresa qualquer. Sua última pretensão, o que almeja mesmo, ser Ministro, sem ter feito nada na vida, reserva-o, pachorrentamente, para mais tarde. Sabe que um dia … sendo sempre fiel ao seu mentor e sempre muito bajulador; muita dedicação ao Partido que escolheu; com alguma dose de sorte … lá chegará … com certeza!!
Mas onde encontrar o “Chico-esperto”??
Não! Não é difícil encontrar o Chico-Esperto. É simples! Mas se tiver alguma dificuldade, veja nos Partidos de nossa praça. Procura nas Câmaras. Bom, aqui/lá estão à cabazada! Veja na nossa Assembleia, lá estão muitos. Depois, procura nos CA das empresas. Se for perspicaz, consegue encontrar até no Governo. Lá está ele.
Os “Chicos”, afinal, estão em todo o lado. Basta “djobi dretu”.
Lá está ele, o “Chico”, o “esperto”…subindo na vida…sem esforço…sem ter dado prova de nada…sem nunca ter feito nada de concreto…de sério…de útil…na vida. Bastou ser “Chico-esperto” e usar o “Chico-espertismo”.
Quem quiser compreender esta reflexão, recomendo a famosa música “Djan Brancu dja”, se não me falha a memória no disco com o mesmo nome, dos Bulimundo, dos anos oitenta, soberbamente interpretada pelo incomparável Zeca di Nha Reinalda. Afinal, você conhece o “Chico”, nos os conhecemos. São tantos e … estão em todo o lado.
O busílis disto tudo é que são eles que nos dirigirão … amanhã! São eles a tomar conta destas ilhas desprovidas de quase tudo … amanhã! Aliás, já começaram, há muito, a nos dirigir!Infelizmente!!
Tenho dito… com tristeza!