Por: Natacha Magalhães
Escuto atentamente três jovens em conversa, num café. Pelo teor da conversa e pelo que observo, percebo que fazem parte dos chamados millennials, essa geração nascida entre os anos 80 e 2000, quase toda ela com boas qualificações académicas (muitos possuem mestrado), que domina as novas tecnologias, fala de big data, de webinar, das web summit, da cloud, tem uma capacidade criativa q.b., anseia por um bom emprego que lhe permita algo mais do que só ganhar dinheiro e que quer ter uma vida financeiramente estável, para que não tenha que viver, sem previsão de saída, em casa dos pais. Esses millennials têm mil e uma ideias, acham que sabem tudo, porém ignoram que experiencia e savoir faire são também quesitos para se firmar numa carreira profissional. Dizia que escutava uma conversa de millennials. Uma das raparigas, desempregada, manifesta o seu desespero. Terminou o mestrado e há sete meses anda à procura de emprego. Já não sabe que porta bater, já enviou dezenas de currículos.
Quer, com alguns colegas, abrir um negocio, mas me parece perdida, pelas inúmeras questões que coloca à amiga. Não deixo de pensar que muitos desses millennials, não obstante as boas habilitações académicas, continuam à espera que muita coisa lhes caía no regaço. A outra queixa-se. Está empregada, mas não satisfeita. Não que tenha mau emprego. Até gosta do que faz, até não ganha mal. Mas falta algo. O quê? Sente que precisa de mostrar mais, fazer mais. Não lhe basta apenas ganhar dinheiro. Quer deixar uma marca e quer que a empresa deixe a sua também. Interessante raciocínio, penso eu. O rapaz corta-lhe a conversa. Concorda com a amiga. Também ele não está sendo valorizado nem aproveitado. Suas ideias até são apreciadas, mas nunca implementadas. Isso soa-me familiar. A rotina dá cabo dele. Sorrio, disfarçadamente. Outra coisa familiar. Culpam as chefias. Sim, para os dois a culpa é das chefias – só oiço dizer “meu chefe” – presas aos modelos tradicionais de gestão ultrapassados, não apenas a nível da gestão do negócio em si, mas cima de tudo de gestão dos recursos humanos. Esquecidos que dentro de anos, será essa a geração a dominar o mercado e a estar nessas organizações, uma grande maioria das atuais chefias (estou sendo simpática, não vou dizer a maioria), particularmente as da administração pública, parece encarar como ameaça quem tem conhecimento e desejo de inovar. Há aqui um paradoxo. E um discurso que precisa mudar. Temos vindo a observar o frenesi de medidas de política e de iniciativas que visam assegurar condições para que os jovens tenham acesso ao emprego, sejam inovadores e ativos. Aliás, para quem tem acompanhado as intervenções do Vice-primeiro ministro, aquilo é extremamente motivacional. Para Olavo Correia, os jovens têm a faca e o queijo na mão. O que fazer com aquilo é da responsabilidade deles.
Sim, tem em parte razão, o Vice-primeiro ministro. Queremos uma geração de profissionais competentes, capazes de serem bem-sucedidos aqui ou fora do país, de tornar o país mais competitivo e moderno. De serem mais do que meros funcionários a cumprir burocracias, muitas vezes nem isso. Mas penso que também as chefias devem ser incluídas nos discursos dos nossos governantes e instadas a adotarem uma nova e moderna visão de gestão organizacional, traduzida em resultados e impactos positivos.
Defendo até que deveria ser uma exigência. E acredito que se assim for, não seriam apenas os millennialls a ganharem, mas, uma boa parte de técnicos nascidos na chamada geração X que, sem oportunidades de mostrarem o seu potencial, caem nas malhas da desmotivação e anseiam e buscam outras oportunidades. Nem os millennials nem a geração X querem ser meros empregados subalternos que acatam ordens e ganham um salario no final do mês. As organizações, melhor, as lideranças, terão que imperativamente mudar a sua gestão. Daqui a uma década serão estes jovens a estarem no mercado. Dai que não deve haver receio nenhum por parte das chefias de acolherem millennials e com eles se entenderem, abraçando suas ideias e seu desejo de ser parte de mais do que uma mera organização de execução rotineira de atividades. Deve haver sim, adaptação de parte a parte. Uma precisa de se inovar, confiar mais, não ter medo do novo; a outra de saber ouvir, não perder paciência e aproveitar a oportunidade para desenvolver ou aprimorar competências que a formação académica não lhe deu. Mas nisso de mudar, confiar, delegar muitas vezes faz parte da natureza de cada um. Afinal, quem receia os inovadores?