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Cultura

Trabalhos científicos de Teixeira de Sousa relançados pela Casa das Bandeiras

Os trabalhos científicos de Teixeira de Sousa, ora reeditados, versam “O problema alimentar em Cabo Verde” (Cadernos Caboverdeanos de Cultura e Divulgação nº 1, em 1954 pela Imprensa Nacional), “Alimentação e saúde nas ilhas de Cabo Verde” (Praia 1957) e “Bibliografia nutricional de Cabo Verde” (1966).

Os três títulos surgem agora num volume único e nesta primeira fase serão impressos 500 exemplares, segundo o presidente da fundação Casa das Bandeiras, Henrique Pires, indicando que se houver demanda esta instituição poderá mandar proceder a uma nova tiragem.

Os filhos da fome

Mais conhecido como romancista e contista, o autor de “Ilhéu de Contenda” e “Contra mar e vento”, entre outros livros de ficção, foi dos primeiros cabo-verdianos a escrever e a publicar sobre os problemas nutricionais nesta então colónia portuguesa. A maioria desses escritos foram dados à estampa no “Boletim Cabo Verde” (1949-1964) e depois compilados em volume. Num desses artigos, em 1950, Teixeira de Sousa chama precisamente a atenção das autoridades para «os verdadeiros filhos da fome», sobreviventes das crises que foram minando sucessivas gerações de cabo‑verdianos, e alertava: «Não opor um dique a tam triste realidade, é caminhar para a desvalorização física geral duma população que ainda se poderá salvar»

Além de presidente da Câmara Municipal de São Vicente, nos anos 1960, Teixeira de Sousa integrou a comissão criada, em 1959, pelo governador Silvino Silvério Marques, para preparar Cabo Verde a enfrentar a seca e a fome. Era a primeira vez, na história, que uma tal decisão era adoptada. Além de garantir trabalho aos desvalidos da seca, a comissão recomendou a adopção de medidas no campo do abastecimento alimentar e nutricional.

Fora isso, Teixeira de Sousa animou palestras e conferências sobre a importância da alimentação numa terra, na altura, a braços ainda com graves carências nutricionais como era Cabo Verde. Nessas intervenções chamava a atenção para a pobreza nutricional do milho e a necessidade de novos hábitos alimentares entre os cabo-verdianos.

Na revisitação que faz ao tema, em 1994 (revista Islena, Madeira), Teixeira de Sousa reconhece os “ganhos” da independência neste campo, sem deixar todavia de alertar, «o facto de se haver erradicado a fome catastrófica, não significa que Cabo Verde é feliz sob o ponto de vista nutricional». A seu ver, há uma outra fome, a «fome endémica», que «continua presente em todas as ilhas e à qual não se costuma atribuir grande importância».

Por conseguinte, a republicação das três monografias continua pertinente, sobretudo para o público que se interessa para o fenómeno alimentar e, mais do que isso, nutricional, um assunto caro a Cabo Verde e aos cabo-verdianos. Mais do que isso, vem dar a conhecer junto das gerações de hoje uma das facetas mais importantes de Teixeira de Sousa eclipsada pelo seu sucesso enquanto contista e romancista.

José Vicente Lopes/ Inforpress

(Leia mai no A Nação impresso, nº 627, de 05 de Setembro de 2019)

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