Por: Paulo Freire Monteiro
Parte I
A CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) foi criada a 17 de julho de 1996, após a cimeira de Chefes de Estado e de Governo que marcou a criação da mesma, com os respetivos países presentes – Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe – , tendo ficado em aberto a possibilidade de novas adesões. Assim, em 2002, Timor-Leste passou a ser o oitavo país a fazer parte da comunidade. Do mesmo modo, e uma vez preenchidos todos os requisitos formais exigidos, no ano 2014, a Guiné Equatorial tornou-se o nono membro dessa Comunidade, apesar de algumas críticas severas feitas, então, em relação ao regime jurídico-político existente naquele País.
Importa realçar que o projeto político ou ambição defendida pelos Estados-membros está assente sobre alguns pilares, como a língua portuguesa e a ligação histórica, social e cultural que ligam os povos da referida comunidade, não sendo a descontinuidade geográfica um fator impeditivo da união de 230 milhões de pessoas, espalhadas por quatro continentes.
Posto isto, desde a sua criação, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) tem vindo a desenvolver alguns objetivos generalizados, através de diretivas concretas em vários setores, a saber: a segurança, a educação, a saúde, o ambiente, a segurança alimentar.
No entanto, a questão da mobilidade no espaço da CPLP é considerada a mais complexa, tendo em conta alguns fatores, nomeadamente a problemática da soberania dos Estados, uma questão intangível.
O nosso País, neste momento, está a presidir à CPLP, tendo já realizado algumas cimeiras, tanto interna como externamente, visitas oficiais ao mais alto nível, e assinado acordos. Todavia, como escreveu um deputado da Nação, na sua página da rede social, “Do rol de decisões e intenções, não se vislumbrou ainda nada fora do habitual, isto é, que é importante manter relações, tranquilidade, amizade, música, cooperação e boa vontade.”
Portanto, em qualquer comunidade de Estados ou de uma União séria, como é o caso da União Europeia, os ensejos ou intenções, bem como as ambições políticas não devem ficar somente no papel (acordos), antes a sua efetivação, dia-a-dia, tornar-se uma realidade. Quando iremos, pois, falar de livre circulação, na sua tripla vertente: circulação de pessoas; de bens e serviços; e de capitais?
A mobilidade numa comunidade de Estados pressupõe um processo paulatino, exigente e rigoroso, que começa pela vertente cultural e termina pelo fator segurança, colocando a soberania dos Estados no centro de todos os debates.
Por que realçar a soberania dos Estados? Tudo começa por aí, na minha modesta opinião. Os cidadãos cabo-verdianos não terão muitas dificuldades para viajarem com destino a Angola, Moçambique, Brasil, Timor-Leste, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Guiné Equatorial, mas quando se fala em obter um visto para Portugal, que é um Estado-membro da CPLP e da União Europeia, fazendo ainda parte dos Estados que ratificaram o Tratado de Schengen (tratado esse que estabelece uma área com uma política comum de abertura de fronteiras, ou seja, não há necessidades de apresentação de vistos e passaportes para cruzar as fronteiras entre os países membros), então as orientações para a emissão de um visto estão bem definidas, conforme os regulamentos ou diretivas comunitárias da UE, pelo que a situação é complexa, quando se fala da atuação do CCV, entidade dirigida pelos responsáveis portugueses, mas atuando em conformidade com o Direito Europeu.
O intuito dos Cabo-verdianos face à mobilidade na CPLP
Muito se tem falado sobre a isenção de visto dos Europeus para visitarem Cabo Verde que recentemente entrou em vigor, o que mereceu severas críticas endereçadas quer aos nossos políticos quer à entidade competente para a emissão de visto europeu em Cabo Verde.
Numa reportagem publicada em maio de 2018, o jornal Diário de Notícias dava evidência ao facto de boa parte dos cabo-verdianos e da oposição política criticarem a isenção de vistos aos europeus, quando não há nenhuma reciprocidade por parte da UE. O jornal frisava, aliás, que uma sondagem divulgada no final de abril revelava que mais de metade (55%) da amostra considerava que o Governo não devia isentar o pagamento de vistos aos europeus, contra 31% que concordava com a medida. Sobre os aspetos positivos, 24% achava que vai impulsionar o crescimento do turismo, 19% entendia que vai gerar mais emprego e oportunidades de negócio e 16% considerava que o país será mais conhecido como destino turístico e que vai impulsionar o desenvolvimento local e o crescimento económico. Em relação às consequências negativas, prossegue o DN, 33% entendia que a medida vai aumentar a taxa de criminalidade, 23% acreditava que vai disparar as ameaças de terrorismo, 20% disse que vai estimular o crescimento da prostituição e o consumo de drogas e 16% considerava que o Governo vai perder receitas. A referida mobilidade na CPLP pretendida pelos políticos, que se cinge, por enquanto, a meras ações teóricas, provavelmente está longe de acontecer, e será que efetivamente se irá concretizar?
Numa entrevista proferida pelo Presidente da Câmara de Comércio de Sotavento, no dia 15 do corrente mês, em cuja epígrafe se pode ler “Câmara de Comércio de Sotavento desaconselha empresários cabo-verdianos a fazer negócios em Portugal”, enquanto a questão de obtenção de visto não for resolvida definitivamente, pelo que a organização não fará nenhuma missão empresarial a Portugal e desaconselha os empresários Cabo-Verdianos a fazerem negócios naquele País Europeu.
(Continua)