Gibraltar é a “pedra” no caminho da harmonia dos 27, que será testada no Conselho Europeu deste domingo, 27, caso Espanha vote contra o Acordo do “Brexit” e a Declaração Política da futura relação entre União Europeia (UE) e Reino Unido.
Com Theresa May debaixo de fogo em Londres, esperava-se que o Conselho Europeu extraordinário deste domingo fosse um sinal de esperança para a saída ordenada do Reino Unido da UE, com os chefes de Estado e de Governo dos 27 a ratificarem, sem hesitações, o rascunho do Acordo de Saída e a Declaração Política da futura relação entre as partes, fechados, inesperadamente, num tempo “recorde” de oito dias.
A harmonia dos 27, inabalável durante os 21 meses de negociações, foi, contudo, posta à prova na semana passada, com o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, a garantir, reiteradamente, que vai votar contra o Acordo do”‘Brexit” se o texto, elaborado em parceria pela equipa de negociadores da Comissão Europeia, liderada por Michel Barnier, e pelos negociadores britânicos, não for alterado até à Cimeira para incluir uma mênção ao Estatuto de Gibraltar.
O desencontro entre Espanha e Bruxelas iniciou-se na segunda-feira, 19, com o ministro dos Negócios Estrangeiros espanhol, Josep Borrell, a exigir “clarificações” sobre o já polémico artigo 184 do Acordo de Saída, prosseguiu com o Executivo Comunitário a defender, diariamente, que as negociações continuam e a questão de Gibraltar “não está fechada”, e atingiu o auge com uma acusação de traição.
Na quinta-feira, perante o congresso espanhol, o secretário de Estado para a UE, Luis Marco Aguiriano, denunciou que o rascunho do Acordo de Saída tinha sido alterado “às escondidas e de forma traiçoeira”, sem conhecimento de Espanha, e esclareceu que a modificação do artigo 184 estabelece que, no futuro, os assuntos relacionados com Gibraltar serão abordados, exclusivamente, entre Londres e Bruxelas.
Para Madrid, é fundamental que qualquer assunto sobre o território ultramarino britânico, que é reivindicado pelas autoridades espanholas, seja sempre negociado entre Espanha e o Reino Unido e que qualquer Acordo sobre esta questão tenha o visto prévio espanhol.
As acusações de Espanha não se esgotam no Acordo de Saída, já que, também, a Declaração Política da relação futura entre as partes, apresentada na quinta-feira, é omissa em relação a Gibraltar.
O Governo espanhol sustenta que aquele texto continha um parágrafo que fazia referência ao pequeno enclave, que, alegadamente, terá desaparecido, a pedido de Theresa May.
Um bloqueio espanhol, no entanto, não pode impedir os Estados-membros de endossarem o Acordo, uma vez que é necessária apenas uma maioria qualificada para o fazer.
A polémica sobre Gibraltar ofuscou o sucesso alcançado pelas equipas de negociadores, que conseguiram completar as 36 páginas da Declaração Política a tempo de ser endossada pelos líderes europeus na Cimeira Extraordinária, convocada pelo presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, em 15 de Novembro.
O documento, que acompanhará as 585 páginas do Acordo de Saída, fixa os parâmetros para “uma parceria ambiciosa, ampla, profunda e flexível”, na qual está prevista uma área de comércio livre, e entrará em vigor em 30 de março, um dia depois da saída do Reino Unido do bloco comunitário.
Na Declaração Política, Londres e os 27 concordaram desenvolver uma parceria económica “ambiciosa, vasta e equilibrada”, que compreenda uma zona de comércio livre, sustentada por cláusulas que garantam condições equitativas para “uma concorrência aberta e leal”, e na qual não existam “tarifas, taxas ou restrições quantitativas”.